Paranoia e arte
RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/03/11
RIO DE JANEIRO - A paranoia é contagiosa. Em suas idas e vindas pela cidade, no fim de semana, os helicópteros do presidente Obama passaram tantas vezes por cima do meu terraço, no Leblon, com ou sem ele dentro, que, em certo momento, achei que estava sendo investigado pelo serviço secreto americano. O aparato de segurança de um presidente dos EUA não pode correr riscos.
Apesar de os aviões, helicópteros e limusines que transportaram Obama pelo Rio serem resistentes a bombas, mísseis, ataques bioquímicos e até a explosões atômicas, não ficou um telhado, janela, marquise, laje ou bueiro sem revistar em cada percurso presidencial. Imagine se, de repente, um morador de alguma cobertura na orla carioca resolvesse bradar palavrões e dar bananas para a comitiva aérea quando ela passasse sobre sua cabeça -como eles iriam se explicar?
Um quiproquó na preparação da segurança de Obama envolveu os atiradores de elite postados nos telhados para prevenir possíveis atentados. O FBI exigia que fossem americanos. Mas as autoridades brasileiras não podiam admitir que atiradores americanos fuzilassem brasileiros em território idem -esse privilégio deveria caber a atiradores brasileiros. O FBI, que não gosta de ser contrariado, cedeu.
Já quanto aos cães farejadores, eles não abriram mão: tinham de ser cães americanos. Da mesma forma, os tamborins, cuícas e reco-recos da Unidos da Tijuca foram inspecionados um a um antes da visita da primeira-dama Michelle Obama à Cidade do Samba. E uma maçã foi confiscada da bolsa de uma repórter -sabe-se lá o que conteria?
Não quer dizer que eles não confiassem em nós. É que não confiam nem em si próprios -quando Obama viaja pelos EUA, sua segurança é tão doentia quanto. E não é verdade que a tradição de eliminar governantes tenha começado com eles. Apenas fizeram dela uma arte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário