Desoneração da folha: agora vai
JOSÉ PASTORE
O Estado de S. Paulo - 01/03/2011
Sempre fui combatido por dizer que as despesas de contratação no Brasil são excessivas. Vejo agora sindicalistas, parlamentares do PT e a própria presidente engajando-se na urgente tarefa de desonerar a folha de salários. Felizmente.
Com 102,43% de despesas sobre o salário nominal, o País é um dos campeões de encargos sociais em todo o mundo. Isso tem graves consequências.
Vejam os dados recentes. No quarto trimestre de 2010, o custo médio do trabalho na indústria aumentou 4%, enquanto a produtividade diminuiu 0,46%, em relação ao mesmo período de 2009. É uma perversa combinação que se soma aos problemas do câmbio, juros, impostos e infraestrutura, afetando a competitividade das empresas e a geração de bons empregos. Apesar do bom avanço da formalidade, 50% da força de trabalho do Brasil ainda é informal, sem que muitas pequenas e microempresas consigam contratar com uma carga de 102,43% sobre o salário.
Se está clara a necessidade de desonerar, continua obscuro o modo de fazê-lo. Isso porque todas as contribuições que incidem sobre a folha de salários financiam importantes políticas públicas. É o caso dos 20% para o INSS; 8% para o FGTS; 3,1% para o Sistema S; 2,5% para a educação; 2% para o seguro acidentes; etc.
Onde mexer? O governo acena com uma redução gradual de quatro pontos porcentuais na alíquota do INSS (de 20% para 16%). Essa seria uma grande ajuda para os produtores que precisam competir e para os trabalhadores que precisam se empregar. O impacto final iria muito além dos quatro pontos porcentuais porque a alíquota do INSS incide sobre a remuneração do descanso semanal, o abono de férias, o 13.º salário e muitos outros encargos sociais. A economia final poderia chegar a uns sete ou oito pontos porcentuais. Uma enormidade!
Mas como reparar as perdas imediatas da Previdência? Alguns falam em transferir a base de arrecadação do INSS da folha de salários para o faturamento das empresas com alíquotas adequadas. Parece justo: quem fatura muito e emprega pouco pagaria mais. Quem emprega muito e fatura pouco pagaria menos.
Todavia, a tramitação dessa proposta provocaria uma grande divisão no empresariado. As empresas que são intensivas em mão de obra aplaudiriam - calçados, brinquedos, tecidos, comércio, serviços, etc. As intensivas em capital condenariam - petróleo, mineração, automóveis, aviões, etc.
A mudança de preços relativos tornaria a negociação dificílima. A própria Previdência duvida dessa estratégia, pois nos ciclos de baixa da economia a receita sobre o faturamento cairia muito mais depressa do que a que vem da folha de salários.
Como alternativa, pensa-se em desonerações setoriais. O potencial de conflito interempresarial é menor, mas sua operacionalização é mais complexa. É como criar um cambio duplo ou triplo.
O ideal seria compensar a Previdência Social (no que fosse necessário) com recursos de um imposto sobre valor adicionado federal. Isso teria um menor impacto na produção e seria um bom estímulo ao emprego formal.
Como esse imposto não existe, começam a surgir tentações perigosas como a de ressuscitar a CPMF - ideia inaceitável pelos conhecidos impactos em cascata em toda a economia.
Como se vê, a desoneração da folha seria mais viável no bojo de uma reforma tributária que tivesse por norte desonerar a produção e arrecadar mais da renda, da propriedade improdutiva e do consumo de certos bens e serviços.
Mais lógico ainda seria o equacionamento de uma reforma tributária com uma reforma previdenciária que viesse mudar as regras de concessão de aposentadorias e pensões, contribuindo assim para reduzir o déficit que decorre da enorme informalidade.
Em resumo: desonerar a folha de salários não é impossível, mas requer um conjunto de medidas bem articuladas, para não vestir um santo e desvestir outro.
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