segunda-feira, fevereiro 07, 2011

RUY CASTRO

Caça aos obesos
RUY CASTRO 
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/02/11

RIO DE JANEIRO - Woody Allen disse certa vez que foi recusado no time de xadrez de seu colégio "por problema de altura". A ideia é ridícula, e é claro que Woody inventou tal sandice para fins cômicos. Mas a ela pode-se acrescentar esta outra, nada inventada e nada cômica, recém-noticiada: sobre as candidatas a professoras da rede estadual de ensino de São Paulo, que, depois de aprovadas nos concursos, teriam sido consideradas "inaptas" no exame médico, por serem obesas (Cotidiano, 2/2).
O argumento, segundo o Estado, é o de que o candidato deve gozar "de boa saúde" e, pelos padrões da OMS, a obesidade "pode ser uma doença". Ou seja, uma professora obesa "pode" ter um enfarte ao ensinar os alunos a extrair uma raiz quadrada. Enfim, "pode". Ou não -como todo mundo.
É o mesmo raciocínio que, há alguns Carnavais, levou a Prefeitura do Rio a preferir um rei Momo magro. Não queria arriscar-se a um piripaco do próprio num baile de sua responsabilidade -o que levou o Momo vigente a operar o estômago e emagrecer 80 kg para continuar Momo. Mas o povo nunca aceitou os Momos magros e eis que, agora, estão voltando os gordinhos.
É curioso tal tipo de discriminação acontecer nesses tempos tão politicamente corretos, em que ninguém mais pode ser chamado de crioulo, anão, zarolho, perneta ou bicha -embora os eufemismos usados no lugar das velhas ofensas não atenuem o constrangimento. Já os obesos podem continuar sendo chamados de obesos e vistos com maus olhos pelas pessoas "normais", que os impedem de exercer atividades públicas.
Acredito em cada palavra acima, mas, no fundo, estou também defendendo o meu peixe -precavendo-me para se, um dia, a Folha ou a Companhia das Letras concluir que, por ter passado dos 100 kg, tornei-me inapto a escrever uma coluna ou uma biografia.

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