Dado mostra descompasso entre oferta e demanda no país |
MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE
FOLHA DE SÃO PAULO - 16/02/11
AUSÊNCIA DE SINTONIA TEM SIDO A PRINCIPAL CAUSA DA ALTA INFLACIONÁRIA E DO ROMBO NAS CONTAS EXTERNAS
A Pesquisa Mensal do Comércio divulgada pelo IBGE mostrou que, em dezembro, o volume de vendas no varejo ficou estagnado, apesar do crescimento vigoroso de quase 11% registrado em 2010. Diante da desaceleração constatada entre novembro e dezembro, os menos atentos aos detalhes da divulgação poderiam até achar que a demanda começou, no mês passado, a dar os primeiros sinais de desaceleração.
No entanto, uma leitura mais minuciosa dos dados mostra um quadro bem diferente, compatível com a visão de que há um assustador descompasso entre a demanda e a oferta. Essa ausência de sintonia tem sido a principal causa da alta inflacionária recente e do crescente rombo nas contas externas, com o forte aumento das importações, refletindo a dinâmica do consumo brasileiro. O resultado de dezembro refletiu a queda de 0,3% nas vendas dos hiper e supermercados, dos produtos alimentícios, bebidas e fumo, que têm um peso de cerca de 40% na pesquisa do IBGE.
A redução nesses segmentos não é surpreendente, uma vez que está associada à rápida e intensa elevação dos preços dos alimentos que vem castigando a economia brasileira nos últimos meses.
O comportamento das vendas em outros segmentos mostra nitidamente a força da demanda interna. Tecidos, vestuário e calçados cresceram 3,4% no mês; no comércio varejista ampliado, veículos e motos aumentaram as vendas em 4,7% em dezembro, enquanto as vendas de material de construção apresentaram uma variação positiva de 3,2% no mês.
A dissonância entre os dados de consumo revelados nos detalhes da PMC e o indicador da produção industrial, que em dezembro sofreu retração de 0,7%, não deixa dúvidas em relação ao quadro de descompasso entre demanda e oferta.
Com o aumento da renda -apesar da aceleração inflacionária- resultante das taxas de desemprego historicamente baixas, o consumo das famílias tem crescido além da capacidade de atendê-lo internamente. A consequência é a crescente necessidade de desviar o consumo para fora do país, como se observa nos volumes das importações de bens duráveis e não duráveis, que alcançaram os maiores patamares nas respectivas séries.
Está mais do que na hora de puxar o freio da economia brasileira, pois o quadro atual não é sustentável, como revela a alta generalizada dos preços e a piora das expectativas de inflação.
O governo tem dado sinais de que pretende enfrentar o problema. Falta agora alinhar o discurso com a gravidade da situação.
MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE é economista, professora da PUC-RJ e diretora do IEPE/Casa das Garças
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