domingo, fevereiro 20, 2011

DANUZA LEÃO

 Ronaldo e a Copa de 98
DANUZA LEÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/02/11

Muitos boatos surgiram; 13 anos se passaram e até hoje nada foi explicado. A gente tem o direito de saber


A SEMANA FOI DE RONALDO.
Quando o craque começou, dentuço, com 16 anos, tive a maior simpatia por ele. É sempre uma alegria ver uma pessoa de origem humilde conquistar o mundo. Fiquei triste com sua despedida, claro, mas confesso que em um determinado momento comecei a implicar com ele.
A primeira vez foi há anos, quando ele saltou de um jatinho no Kosovo e fez uma visita relâmpago a um hospital. Dava para ver que ele não sabia nem onde estava, mas tratava-se da construção de sua imagem.
Ronaldo começou a se vestir com roupas de Armani, a namorar manequins famosas e, excluindo suas atuações em campo, ficou sem personalidade alguma. Não era mais o menino de Bento Ribeiro, nem tinha vocação para se tornar o que os fazedores de imagem queriam que ele fosse. Como pessoa jurídica, um sucesso; como física, nada.
Impossível não comparar sua trajetória com a de outros craques que continuaram amigos dos companheiros de infância, gostando das músicas de que gostavam quando ainda não faziam sucesso, tendo vida própria, enfim. As pessoas podem mudar de amigos e de gosto, claro, mas com ele não aconteceu nem uma coisa nem outra.
E foi constrangedor quando ele se casou num castelo na França, com um aparato de segurança de fazer inveja a qualquer chefe de Estado. Esse casamento -cujo amor foi anunciado no "Fantástico"- não podia dar certo, como não deu.
Ronaldo foi o máximo como jogador, mas nunca se soube quem era o verdadeiro Ronaldo. Ele sempre foi quem mandaram ele ser, mas dá para entender; era uma criança, praticamente.
Como sua despedida foi a hora da verdade, quando ele contou até mesmo do distúrbio que o fez engordar, o jogador poderia ter aproveitado para esclarecer uma dúvida que ainda permanece: o que aconteceu no último jogo da Copa de 98, na França?
Para quem não lembra, vou contar: a partida estava marcada para as 21h, e era verão em Paris, portanto, ainda dia claro.
Havíamos derrotado a Holanda e estávamos -nós, brasileiros- certos da vitória. Antes do jogo começar houve um desfile com 400 manequins no gramado, vestindo roupas de St. Laurent, um luxo. Mas quando foi anunciada a escalação do Brasil, um susto: não se ouviu o nome de Ronaldo. Ninguém entendeu nada, mas quando a seleção entrou em campo lá estava Ronaldo, e naquele climão, 80 mil torcedores, último jogo da Copa, ninguém lembrou mais disso; queríamos era ver o jogo e ganhar, para sermos penta.
Mas o que vimos foi um Ronaldo parado, apático, sem em nenhum momento ser o jogador que sempre foi. Perdemos, é claro, o que poderia não ter acontecido se tivéssemos Romário em campo.
Romário que, segundo a boataria, foi cortado da seleção porque um ex-jogador fez pressão sobre Zagalo, uma baixaria.
Perdemos o jogo e a Copa, mas nunca soubemos, na realidade, o que aconteceu. Muitos boatos surgiram: que Ronaldo havia tido uma convulsão, teria tomado um tranquilizante, que um dos patrocinadores exigiu que ele jogasse, já que ele era garoto-propaganda dos seus tênis etc.; 13 anos se passaram e, até hoje, nada foi explicado.
Coragem, Ronaldo. A gente tem o direito de saber.

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