Privatização, fantasma a assombrar políticos
PAULO TARSO RESENDE
O ESTADO DE SÃO PAULO - 11/12/10
Em períodos de eleição,tudo o que é sólido no pensamento de um político se desmancha no ar,sobretudo quando o assunto é privatização. Diante do fantasma da concessão de serviços públicos à gestão da iniciativa privada, os candidatos se fecham em casulos nacionalistas, como se a sociedade não prestasse atenção às suas mudanças de comportamento assim que tomam posse. Definitivamente, já está passando da hora de se criar um ambiente de debate técnico que os alivie do fardo da resposta pragmática,talvez até transferindo para a sociedade o ônus da tomada de posição.
Nesse contexto, o Brasil não pode mais negligenciar suas demandas por investimentos em infraestrutura, dadas as consequências negativas para o seu crescimento econômico de longo prazo e para a sua competitividade no comércio global. Ocorre que o setor público não tem recursos para todos os projetos necessários,da ordem de US$ 30 bilhões por ano somente para as áreas de transportes,energia,mobilidade urbana e telecomunicações. E, se tivesse, não teria condições de garantir a manutenção dos sistemas implementados em níveis de eficiência compatíveis com o exigido para um país que quer chegar ao Primeiro Mundo.
Resulta, então, que o País precisa criar condições para promover maior disponibilidade de recursos para a infraestrutura, e a iniciativa privada como parceira é a saída. À medida que o ambiente regulatório e legal se consolida, as incertezas políticas diminuem, os mecanismos de redução de burocracia e conflitos legais se impõem, as licenças ambientais se desenvolvem em ambiente técnico não ideologizado, dentro de uma estratégia de eficiência em infraestrutura nacional, pode-se certamente ter o setor privado como parceiro, com garantias de retornos de investimentos em prazos maiores, o que resulta em reduções substanciais nos serviços cobrados, como os pedágios, por exemplo. Mais ainda, com transparência nos processos de concessão, com igualdade de condições para investidores e com concorrências menos dispendiosas,pode-se transmitir à sociedade brasileira um nível de conhecimento que garanta maior aceitação do papel da iniciativa em vários setores.
O maior exemplo de quem sabe tratar essa questão na América Latina é o Chile, que hoje ocupa a 24.ª posição no ranking de competitividade global do World Economic Forum, em termos de qualidade geral da infraestrutura, enquanto o Brasil ocupaa 84.ª posição.
Com um processo iniciado na década de 1990, o Chile garantiu a concessão de mais de 2milkm de estradas, o que resultou em investimentos de US$ 4 bilhões,chegando hoje a mais de US$ 9 bilhões. O sucesso gerou um programa de concessões para portos, aeroportos, hospitais e prisões que resultará em mais de US$ 20 bilhões em investimentos privados entre 2010 e 2014. E não se tem notícias de que a sociedade chile na viva em protesto contra a participação da iniciativa privada.
As décadas de quase completa ausência de investimentos em infraestrutura no Brasil não serão recuperadas facilmente se não praticarmos o princípio do equilíbrio entre as fontes de recursos públicas e privadas. As parcerias são fundamentais para a recuperação da demanda reprimida e a garantia de suprimento da demanda vindoura, com vigilância regulamentada,marcos regulatórios sólidos, num ambiente de estabilidade administrativa. Entretanto, infelizmente, ainda existem alas do governo recusando peremptoriamente o debate técnico. Nesse caso, uma saída é a estratégia seletiva, quando se recomenda aos investidores classificarem riscos e oportunidades por regiões. Deve-se, então, considerar que Estados com governos propícios à participação privada se transformem em prioritários para os projetos em infraestrutura. Isso fará com que apenas algumas regiões usufruam desses recursos, o que não é o ideal. Diante de posturas inflexíveis, no entanto, ganha-se pouco, mas é melhor do que perder tudo.
PROFESSOR E COORDENADOR DO NÚCLEO DE INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA DA FUNDAÇÃO DOM CABRAL
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