Apetites
LUIS GARCIA
O GLOBO - 03/12/10
Como é mesmo que se monta uma equipe de governo? Um inocente pode imaginar algo mais ou menos assim:
1. Para cada posição, escolhe-se a pessoa considerada mais capaz de uma gestão eficiente e honesta.
2. Verifica-se se o escolhido está interessado.
3. Assina-se o decreto de nomeação.
Na vida real pelo menos na nossa vida real: na Finlândia, talvez seja como imaginamos ? não é bem assim. Acompanhemos o exemplo da formação da equipe da presidente eleita, Dilma Rousseff. Ela está escolhendo nomes dentro de um sistema de quotas (ou cotas, como se preferir), atribuídas aos partidos e facções políticas que a elegeram. Em países com apenas dois partidos, é bem mais fácil. Aqui, a coisa pode se complicar bastante.
Por exemplo, no caso do aliadíssimo PMDB. O governador Sérgio Cabral indicou o seu secretário de Saúde para o Ministério idem, sem problema. Mas o que não é comum vetou a ressurreição do ex-governador Moreira Franco para a pasta das Cidades.
Moreira andava meio fora de foco desde a sua passagem não exatamente gloriosa pelo governo fluminense. Agora, quer ser ministro das Cidades. Tem o apoio do vice-presidente eleito, Michel Temer, mas frágil adesão dos peemedebistas do Rio que, pelo visto, têm boa memória. A passagem de Moreira pelo governo fluminense não foi exatamente brilhante.
E há o curioso problema das quotas. Dilma até aceita nomear Moreira, desde que ele faça parte da quota da Câmara dos Deputados. Não pode ser na fatia do PMDB, segundo Dilma, porque esta já estaria lotada. O partido apoia Wagner Rossi, também apadrinhado por Temer. Insistindo no nome do ex-governador, ele teria, pelo menos em tese, de desistir da indicação de Rossi.
Dilma tem ainda pela frente outro problema, que também envolve as relações com o PMDB: o deputado Eduardo Cunha ? por acaso, ou não, também da bancada fluminense ? é considerado o pai do bloco de cinco partidos, com 202 deputados, que disputa com o PT fatias do poder no próximo governo. É um problema para Dilma com certeza mais preocupante do que o aborrecimento em relação a Moreira Franco. E, talvez, sintoma de que a aliança PT-PMDB funcionou muito melhor na disputa eleitoral do que na divisão do poder.
Quem sabe, existe na imensa máquina oficial um lugar para Moreira que satisfaça o vice-presidente sem irritar a bancada aliada. Se for assim, o atual desentendimento pode se reduzir a um lembrete: nos banquetes políticos, o apetite à volta da mesa é sempre maior do que o que é servido nas bandejas.
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