Reserva de mercado
Celso Ming
O Estado de S.Paulo - 30/12/2010
Em seu discurso de posse e em entrevista concedida à repórter do Estado Raquel Landim, o novo presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, apresenta avanços no pensamento da liderança industrial. Em compensação, em outros capítulos, resvala para a proposta retrógrada e inaceitável da reserva de mercado.
Quando reivindica, por exemplo, um melhor desempenho da defesa comercial, é um empresário moderno, com visão de interesse nacional. Quando afirma que a desindustrialização não existe e que mais apropriado é afirmar que há perda de competitividade por parte de alguns setores, como o de componentes, eletrônicos e eletrodomésticos, Andrade mostra-se antenado com o mundo real.
No entanto, quando pede a proibição de investimentos em atividades industriais voltadas para o mercado interno, está chafurdando no protecionismo, que é condenável não só porque puxa para o atraso, mas também porque é irracional e impraticável.
Vejam o argumento de Andrade: "Quando o investimento (estrangeiro) é voltado para a infraestrutura, como saneamento, rodovias, energia, é benéfico porque traz competitividade para a indústria brasileira e para as exportações. Se o capital estrangeiro chega apenas para explorar o mercado interno, vai competir com a empresa brasileira e tirar mercado. Os investidores desenvolveram tecnologia fora do País e possuem técnicos e engenheiros bem formados. Logo, a competição com a indústria brasileira é desigual."
Essa é a defesa da reserva de mercado dos tempos do governo militar, que atrasou o desenvolvimento do País por mais de uma década e já afundou inúmeros setores da indústria, sendo o mais exemplar deles o da informática.
As ideias do presidente da CNI implicam criar dois mundos estanques: o da indústria nacional e o da estrangeira. E isso contraria a Constituição. Lá está escrito (art. 171) que deve ser considerada "empresa brasileira a constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País". Ou seja, a empresa brasileira pode ser inteiramente controlada por capitais estrangeiros, situação que Andrade parece não admitir.
Em segundo lugar, ele parece preferir que o capital estrangeiro produza lá fora (com a mesma tecnologia de ponta que ele considera hostil) e exporte para o mercado interno do Brasil do que venha para cá, incorpore tecnologia e crie empregos.
Tudo bem, então, para a nova direção da CNI, que a indústria de capital estrangeiro já radicada no Brasil possa importar tecnologia e a que não estiver não possa? Além disso, como criar uma proteção só para a indústria e também não impedir que empresas estrangeiras de serviços ou do setor financeiro (cuja produção não é exportável) disputem o mercado interno com as que já estão aqui?
A empresa brasileira, qualquer que seja a nacionalidade do capital controlador, se isso ainda faz sentido numa economia globalizada, tem de estar em condições de competir tanto aqui como no exterior. E isso se faz expondo-a à modernidade e não, como sugere Andrade, a metendo dentro de uma bolha.
Além disso, se quer reciprocidade, como também imagina, os investimentos estrangeiros devem ter aqui dentro o mesmo tratamento que os investimentos de empresas brasileiras têm nos países ricos.
CONFIRA
Impressão errada
Quem olha para a dívida bruta pode ficar com a impressão errada. Ainda que um pouco mais baixa, a dívida bruta do governo geral continua muito alta, acima de 58% do PIB.
Dívida mais cara
Quando o Banco Central (BC) compra dólares para as reservas, emite títulos. Essas emissões não aparecem na dívida líquida porque, no outro prato da balança, há os créditos em dólares. O problema é que o BC paga pela dívida interna juros de quase 11% ao ano, enquanto as reservas não rendem mais do que 3%.
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