quarta-feira, novembro 17, 2010

CELSO MING

Sem guarda-chuva 
Celso Ming 
O Estado de S.Paulo - 17/11/2010

Do rombo total do Banco Panamericano (R$ 2,5 bilhões), um pedaço de R$ 400 milhões foi atribuído a desvios em operações com cartões de crédito. O Banco Central vem dizendo que esse segmento está fora de sua área de supervisão e a fraude tem de ser explicada pelos administradores por ele responsáveis.

Mesmo se o Banco Central estiver carregado de razão nesse particular, não dá para ignorar o resto. O movimento dos cartões de crédito está tão emaranhado com os financiamentos bancários que é preciso mais vigilância para que inconsistências desse tipo não produzam crises sistêmicas.

Convém explicar que a supervisão do Banco Central deve ser entendida como fiscalização das operações bancárias, mas também como assistência em caso de crise de liquidez.

O crédito não é e não pode ser monopólio do sistema financeiro. Um grande número de segmentos da economia opera com crédito fora do sistema bancário. Quando, por exemplo, uma empresa dá um prazo para pagamento de uma duplicata, está passando um crédito para seu cliente. Grandes contratos quase nunca são pagos à vista. Seus prazos de vencimento são previamente negociados e podem implicar emissão de títulos de crédito que passam ou não pelo aval de um banco. O mesmo acontece quando o varejista aceita pagamento em várias prestações, venha ou não com contrapartida de cheque pré-datado, promissória ou, simplesmente, da palavra do cliente. Todas essas não são operações de crédito intermediadas por instituição financeira. São operações comerciais. E, como tais, estão fora da supervisão do Banco Central.

Os cartões de crédito têm um tratamento diferente. Como explica o consultor especializado na área, Álvaro Musa, quando se limitam à relação entre administradora do cartão e cliente, também correspondem a operações comerciais não alcançadas pelo guarda-chuva do Banco Central. No entanto, quando o titular do cartão deixa de pagar uma conta, precisa receber cobertura de crédito de um banco para saldá-la. Em geral essa cobertura é automática, como previsto no contrato, até o limite de crédito de cada consumidor.

Esse repasse de recursos à administradora é, sim, objeto de supervisão do Banco Central, porque foi realizado por instituição financeira.

Os R$ 400 milhões do rombo no segmento dos cartões de crédito do Panamericano aparentemente foram objeto de cobertura de crédito bancário fornecida aos clientes inadimplentes. E o rombo contábil apareceu porque essas operações foram infladas pela administração do próprio banco, supostamente para alocar a diferença para outro item do balanço. Se foi isso, também aí houve um cochilo da supervisão do Banco Central.

O caso do Panamericano está passando o recado de que é preciso mais cuidado com o bolão dos cartões de crédito. Estes vêm substituindo o uso do cheque e custosos procedimentos de compensação bancária. Apenas no Brasil, os cartões de crédito vão representar este ano mais de 7 bilhões de transações comerciais correspondentes a um movimento de mais de meio trilhão de reais (veja tabela).

Toda a administração dos cartões está de tal forma envolvida com operações de crédito que não faz sentido que essa importante fatia do mercado continue fora do âmbito de vigilância do Banco Central.

Mais devagar?
O mercado financeiro global teve ontem mais um dia azedo, como o gráfico acima está apontando. O governo da China, preocupado com a esticada da inflação, passou sinais de que pode aumentar mais uma vez os juros e desacelerar o crescimento econômico.

Contaminação
Por outro lado, as crises das dívidas da periferia da Eurolândia, especialmente da Irlanda e de Portugal, ameaçam contaminar outros países e sufocar a ainda frágil atividade econômica da área.

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