E o segundo turno?
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 08/10/10
Nas últimas eleições, 70% dos brasileiros votaram em mulher para presidente, um sinal importante de maturidade e superação de preconceito. Quem lembra é o presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro. Ele contesta que o instituto tenha errado nas pesquisas que fez, inclusive de boca de urna, e garante que em 15 dias Dilma caiu 10% e Marina subiu 10%. Uma tirou da outra.
No segundo turno, Montenegro diz que Dilma continua a favorita, entre outras razões por ter ficado a apenas três pontos percentuais da vitória, mas tem também pontos desfavoráveis. A pesquisa Datafolha sai sábado, mas a do Ibope, só na semana que vem:
- Acho melhor deixar baixar um pouco a poeira, haver o primeiro debate, a volta do programa eleitoral. Tem o feriadão. O melhor talvez seja na quarta-feira.
Ele diz que a eleição de segundo turno para os institutos é mais fácil e mais difícil ao mesmo tempo:
- No primeiro turno, tinha deputado estadual, federal, dois senadores, governador e presidente. Ao todo, nós fizemos 521 estimativas só nas pesquisas de véspera. Agora, há apenas os governadores de alguns estados e só dois candidatos a presidente. Mas cada candidato sobe tomando do outro, isso significa que a diferença num dia pode ser de 18, e no dia seguinte ser de sete, porque cada ponto vale dois.
Os institutos de pesquisa foram muito criticados por terem dado durante semanas seguidas vitória de Dilma no primeiro turno, Marina estagnada em 10%, e Serra com tendência de queda. Só no final é que ajustaram. Até a boca de urna do Ibope apontava Dilma com 51%. Há cientistas políticos, como Jairo Nicolau, da Uerj, que acham que os institutos deveriam rever suas metodologias da mesma forma como os ingleses fizeram em 1992, quando apontaram a vitória trabalhista e os conservadores ganharam.
Conversei ontem longamente com Montenegro e ele tem toda uma estatística mostrando acertos no Brasil todo e não considera que essa diferença na eleição presidencial seja comprometedora do trabalho. A senadora Marina Silva acha, no entanto, que foi prejudicada pelos institutos. O Ibope, por exemplo, dava 9% para ela 15 dias antes.
A grande discussão é até que ponto a divulgação da pesquisa afeta o voto, por desanimar eleitores de alguns e induzir o voto em outros?
Montenegro acha que as perguntas não devem ser feitas só aos institutos.
- A imprensa se pauta demais pelas pesquisas e começa a dar espaços maiores para quem tem mais intenção de voto. Ela deveria fazer pesquisas qualitativas, deveria considerar também o voto espontâneo. Os financiadores doam mais a quem está com mais intenção de votos. Tudo isso deveria ser discutido - diz.
Ele garante que a diferença gritante entre intenção de voto atribuída ao candidato ao Senado por São Paulo, Aloysio Nunes Ferreira, e o que de fato aconteceu é resultado de uma decisão tardia do eleitor.
- No sábado, 40% não sabiam em quem votar para senador - diz Montenegro.
Há duas outras dificuldades técnicas do trabalho no Brasil, segundo ele. Primeiro, o TSE não divulga o perfil de quem se absteve. Portanto, as amostras não podem ser calibradas para incluir a abstenção. Segundo, só 44% dos domicílios têm telefone fixo, e a maioria do telefone celular é pré-pago. Não há como ter o cadastro dessas pessoas. O Ibope faz também visita às casas:
- Podem achar que erramos, mas vamos ponderar aqui: dissemos que a boca de urna apontava 51% para Geraldo Alckmin. Isso com duas mil entrevistas. O TSE com 25 milhões de votos apurados em São Paulo, às 22h, ainda não previa se haveria ou não segundo turno.
Esses são os argumentos do presidente do Ibope, mas o problema é que a grande vantagem dada a Dilma durante semanas pelas pesquisas, queda de Serra e estagnação de Marina criaram uma situação circular: quem está na frente atrai mais financiamento, estimula mais o militante, atrai mais eleitores. Os outros, perdem. É difícil crer que tantos tenham mudado tão rapidamente o voto:
- Mudaram sim. Em São Paulo, Serra estava perdendo e acabou ganhando sem ter saído do lugar. Ele ficou estacionado, Dilma perdeu seis pontos em poucos dias e Marina ganhou.
Ele acha que os fatores influenciadores, não necessariamente nesta ordem, foram: salto alto do PT, Erenice Guerra, quebra de sigilo, aborto, briga de Lula com a imprensa. Além disso, houve uma abstenção forte no Nordeste.
E agora? Bom, Montenegro acha que agora há a favor de Dilma o peso do Lula, o sentimento a favor do continuísmo, o fato de que ela só deixou de ter 3% e a maioria dos votos que perdeu foi para Marina. Contra Dilma, há o fato de que como havia expectativa de vitória no primeiro turno, ela apareceu como derrotada e se comportou nas primeiras horas como se fosse. E agora o tempo é igual para os dois candidatos. Serra tem a seu favor esse tempo igual na TV, o ânimo renovado de ter chegado ao segundo turno, sua maior experiência no governo, nos debates e em campanhas, e a possibilidade de trazer de volta o que houve de bom no governo Fernando Henrique.
Serra não explorou o fato de que foi o Fernando Henrique, no governo Itamar Franco, que derrotou o pior inimigo da história econômica recente do Brasil. Quem não viu, ouviu os pais contarem a época da hiperinflação. Além disso, a privatização mostrada como Aécio mostrou: como passaporte para a posse de bens é uma história favorável. Montenegro acha que não houve nessa eleição nenhuma onda vermelha e sim continuísmo de governos bem avaliados. O PT só ganhou no primeiro turno os governos de quatro estados e no Acre ganhou por muito pouco.
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