Terras: falta o governo se definir
GABRIELA GRASSI QUARTUCCI
GUARITÁ BENTO
O GLOBO - 06/09/10
Mês passado a Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomendou aos Cartórios de Registro de Imóveis e aos Tabelionatos de Notas que passem a informar às Corregedorias dosTribunais de Justiça todas as compras de terras rurais por empresas brasileiras controladas por estrangeiros (pessoas físicas ou jurídicas), conforme a Lei n° 5.709/71.
Essa lei regula a aquisição de imóvel rural por estrangeiro residente no país, ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil, ficando também sujeita ao regime da lei a pessoa jurídica brasileira — da qual participem pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas, que tenham a maioria do seu capital social e residam ou tenham sede no exterior. A lei não proíbe que pessoas, numa dessas situações, se tornem proprietárias de imóvel rural, mas impõe requisitos. Por exemplo, limitação de tamanho de propriedade naquele local, comunicação posterior ou autorização prévia.
A Constituição, em seu artigo 171, distinguia a empresa brasileira (constituída sob as leis brasileiras e com sede e administração no Brasil), da empresa brasileira de capital nacional, cujo controle estivesse sob a titularidade de pessoa domiciliada e residente no Brasil.
Contudo, a Emenda Constitucional n° 06/95 revogou esse dispositivo.
A partir daí, a Advocacia-Geral da União emitiu parecer concluindo que a Constituição de 1988 não recepcionou a Lei de 1971 e que, portanto, não havia diferença de tratamento entre empresa brasileira com capital nacional e empresa brasileira com capital estrangeiro, liberando a aquisição de terras por empresas brasileiras com participação estrangeira.
A recente recomendação do CNJ adveio de um pedido da Procuradoria Regional da República — Coordenadoria do GT Bens Públicos e Desapropriação, que defende o contrário. Para tanto, alegou a Procuradoria Regional da República que a AGU revisou seu posicionamento através de um Parecer da Consultoria-Geral (CGU/AGU001-RVJ, de 03/09/2008, no sentido da recepção da Lei no5.709 pela Constituição Federal, seja em sua redação originária, seja após a promulgação da EC n° 06/95). Esse parecer foi formalmente aprovado pela AGU (15 de outubro de 2009), mas ainda não foi aprovado pelo presidente da República, conforme determina a legislação, para que revogue o parecer anterior e produza efeitos vinculantes.
Mais: a Procuradoria sustenta que os efeitos vinculantes do ainda vigente Parecer (AGU/GQ n° 181/1997) se restringem à administração pública, mas não se estendem aos serviços registrais e notariais, razão pela qual devem os registradores manter em cadastro especial, em livro auxiliar, as aquisições de terras rurais por pessoas estrangeiras, físicas ou jurídicas.
Mesmo sem essa aprovação presidencial, o CNJ acolheu o pedido da Procuradoria e expediu a recomendação.
E determinou que as Corregedorias locais deverão promover em 60 dias a adaptação de suas normas.
Mais do que uma discussão no âmbito jurídico, esse tema tem cunho político e a manifestação do governo federal sobre o assunto está sendo aguardada com grande expectativa.
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