Brasil avança com o debate ambiental
Cesário Ramalho da Silva
O ESTADO DE SÃO PAULO - 30/08/10
A agropecuária brasileira, composta pelo pequeno, o médio e o grande produtor rural, não quer mudar o Código Florestal para desmatar mais e obter novas áreas para produzir. Por mais óbvio que isso seja, alguns setores ainda insistem em tachar o produtor de vilão ambiental.
A Sociedade Rural Brasileira tem legitimidade para falar sobre essa questão. Desde 1927 mantém ativo em seu quadro um departamento exclusivo para defender o meio ambiente e a proteção dos recursos naturais em consonância com a produção rural.
Há aproximadamente cinco décadas a agricultura e a pecuária tinham usos e costumes extrativistas. No início dos anos 1970 o agronegócio brasileiro se transformou. A criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) impulsionou a tecnologia de produção agrícola dos trópicos, pautada pela ciência, alçando o Brasil à condição de potência rural do século 21.
O resultado? Abastecimento continuo e comida farta na mesa do cidadão brasileiro e grandes exportações - leia-se: divisas, emprego e renda -, que só não são maiores em razão do protecionismo europeu, norte-americano e japonês e por causa de entraves domésticos, sendo a deficiente infraestrutura logística transportes, armazenagem e portos - o gargalo mais latente.
A combinação de luminosidade natural, qualidade pluviométrica, solos férteis, disponibilidade de terras e recursos hídricos com pesquisa e desenvolvimento (P&D) e o empreendedorismo do produtor rural tornou a agropecuária brasileira protagonista no cenário mundial.
O País passou a produzir mais e melhor em menos área. Saiu da condição de importador para celeiro do mundo. Aumentou a sua produtividade, especialmente com as lavouras avançando sobre pastagens degradadas, fenômeno que ainda tem muito a crescer.
Soma-se a isso a expansão de práticas conservacionistas e que se mostraram competitivas economicamente, como, por exemplo, a silvicultura, a integração lavoura-pecuária-florestae a técnica do plantio direto.
A verdade é que a iniciativa da Câmara dos Deputados de encarar a necessidade de alteração do Código Florestal é louvável a simples fato de chamar a atenção para a problemática da legislação ambiental merece elogios.
Há tempos grupos antagonistas a qualquer tipo de ajuste no Código Florestal boicotavam esforços nesse sentido. Isso acabou atrasando um debate mais que imprescindível ao desenvolvimento social, econômico e ambiental do Brasil.
Ou seja, se mudanças no Código Florestal já tivessem sido encaminhadas, neste momento não estaríamos analisando o passado, e sim planejando um futuro sustentável.
O fato é que milhares de produções centenárias estavam na ilegalidade jurídica e precisavam ser regularizadas. Não se trata de passar a mão na cabeça daquele cafeicultor ou produtor de maçã que desmatou sem muito bem saber o impacto desse ato. Erros foram cometidos por desconhecimento técnico - por falta de uma extensão rural acessível e decente-, mas não por má-fé. Quem age com dolo não é o genuíno produtor rural brasileiro.
O que se pretende com a reforma do Código Florestal é equilibrar produção e proteção, criando um ambiente favorável à manutenção e à atração de novos investimentos, inclusive direcionados ao pagamento por serviços ambientais.
Custa-me a crer que alguém realmente pense que o fator econômico é rival do meio ambiente. Não são coisas excludentes, ao contrário, são absolutamente interdependentes.
Desde sempre o produtor é amigo do meio ambiente. Além de entendê-la como indispensável à viabilidade da atividade rural, o produtor agora sabe que o I meio ambiente é passaporte para lucrar mais. Porque é nessa relação que se encontra a sustentabilidade. Quem zela pelo meio ambiente o faz porque é um princípio reconhecido como correto I pela sociedade. E cuida mais ainda porque sabe que ser sustentável é cortar custos, atender a exigências comerciais e, muito em breve, obviamente, ser mais bem remunerado.
Dessa forma, o relatório apresentado pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP). relator do novo Código Florestal, tem muito mérito. Foi democrático, corajoso e contou com amparo técnico. A comissão especial da Câmara dos Deputados realizou 68 audiências públicas por todo o País. Nos encontros, o relator ouviu as partes interessadas no assunto e colheu informações e sugestões para a elaboração do projeto de lei.
De fato, não é um texto definitivo nem se propunha a ser, e assertivamente já proíbe novos desmatamentos. É um documento que escancara o debate para que uma nova lei nasça sob a luz da ciência. De maneira clara e objetiva, diferentemente do código em vigor.
Só para lembrar, a legislação vigente, originária de 1965, foi remendada por portarias, decretos e medidas provisórias, à revelia da sociedade e do Congresso N acional. a que se buscou agora foi justamente expor a situação critica do Brasil rural e convidar todos a participar da solução. a debate pautado por extremos não é salutar para a Nação.
O que o Brasil precisa é de alianças que estimulem a nossa vocação de produzir alimentos e energia renovável em equilíbrio com os produtos naturais que temos. Promover a cisão nos levará a outro futuro. a desenvolvimento sustentável se dará pela geração de riqueza atrelada à proteção do meio ambiente e ao respeito pelo entorno social.
A discussão ambiental também teve o valor de colocar o agro como protagonista das decisões estratégicas da Nação. A realidade é que o setor precisa e deve ser tratado e valorizado politicamente em pé de igualdade com a importância econômica e os benefícios socioambientais que gera para o País.
Cesário Ramalho da Silva, Presidente da Sociedade Rural Brasileira, Diretor do Departamento de Agronegócio da Fiesp e Membro da Federação das Associações Rurais do Mercosul
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