Cada um por si
Celso Ming
O Estado de S.Paulo - 29/06/2010
A reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20) que se realizou nesse fim de semana em Toronto, Canadá, mostrou que já não há mais a mesma unanimidade entre os chefes de Estado demonstrada em 2008 e 2009, quando se tratou de apagar o incêndio da crise e acabar com o alastramento do pânico.
Cada país ou subconjunto de países tem agora sua prioridade, diferente das dos demais, e não abre mão delas em benefício de um esquema conjugado de governanças.
Apesar das pressões do governo dos Estados Unidos, a União Europeia conseguiu o reconhecimento do seu ponto de vista, o de que o momento não é de despejo de recursos públicos, mas de volta à austeridade e ao equilíbrio das finanças públicas.
Domingo, o presidente do Bank for International Settlements (BIS), Jaime Caruana, resumiu tudo com uma frase: "Não podemos esperar a retomada de um crescimento econômico forte para dar início ao processo de correção da política."
A principal consequência da decisão foi a de que a recuperação da economia global vai demorar mais ou, até mesmo, os países ricos poderão mergulhar num período adicional de recessão. Em compensação, o processo fica mais confiável, porque liberta as economias mais maduras do poder de chantagem dos credores.
Falta saber se haverá condições políticas para reduzir os atuais rombos orçamentários à metade em apenas três anos. Em todo o caso, a decisão de deixar a cada país a escolha da intensidade e do timing das medidas parece ter sido a saída encontrada para garantir flexibilidade para enfrentar os principais focos de resistência.
As pressões para criar impostos novos sobre os bancos e, dessa maneira, obter uma espécie de indenização pelas despesas que bancos centrais e Tesouros foram obrigados a fazer para salvar os bancos também não obtiveram consenso, apesar da maré favorável a castigar o segmento que provocou o desastre. E, se a taxação dos bancos não for universalizada, muito provavelmente não funcionarão os impostos onde forem instituídos. Os grandes bancos são instituições globais. Eles saberão se defender das taxações por meio da arbitragem regulatória, ou seja, por meio da transferência da titularidade de ativos para países não sujeitos a tais impostos. E o Brasil é um deles.
E, se nem a taxação dos bancos consegue sinal verde, muito menos conseguirá a adoção de uma contribuição global sobre transferências de valores financeiros (conhecida como Taxa Tobin), que se transformou em bandeira de luta do movimento social-democrata internacional.
A China obteve também sua vitória ao conseguir evitar o debate e, mais do que isso, a inclusão no documento final de qualquer nova pressão para valorizar a sua moeda, o yuan. Foi mais uma vitória da política faça-o-seu-jogo.
No mais, foi incompreensível a ausência do presidente Lula. A alegação era a de que sua presença no Brasil ficou necessária por conta dos estragos provocados no Nordeste pelas enchentes. Como Lula não fez nada de muito novo nesse final de semana pelos flagelados, essa ausência foi interpretada como um jeito de fugir das interpelações a que se submeteria por defender a política nuclear do Irã.
Cobrança
Alguns analistas internacionais, entre os quais o Prêmio Nobel Paul Krugman e o articulista do Financial Times Martin Wolf, insistem em que não há solução para a economia global enquanto a Alemanha não aumentar seu consumo e a China não promover a valorização de sua moeda, o yuan.
Barriga cheia
O problema é que as necessidades de consumo na Alemanha estão rigorosamente atendidas. Obrigar a Alemanha a consumir mais é enfiar uma feijoada goela abaixo depois do jantar terminado. E impor a valorização do yuan é exigir que a China faça, de graça, o jogo cambial que hoje mais convém aos Estados Unidos.
Questão de soberania
Nessa reunião de cúpula do G-20, a China conseguiu eliminar do documento final os textos que pediam o fim da desvalorização artificial do yuan. O argumento esgrimido pelos representantes chineses foi o de que a política cambial é prerrogativa de soberania nacional.
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