Pós-Lula com Lula
Antonio Machado
CORREIO BRAZILIENSE
Dilma e Serra vão à luta. Ela, extensão de Lula. Ele, o depois de Lula. Ambos terão identidade?
Com o lançamento formal do ex-governador José Serra à sucessão do presidente Lula pela coligação PSDB-DEM-PPS, já estando nas ruas a candidatura de Dilma Rousseff pelo PT, provavelmente o PMDB e mais um punhado de outros partidos, daqui até outubro será só pauleira entre as duas principais forças políticas do país — e ambas contra quem mais chegar querendo melar essa disputa plebiscitária.
Será difícil que outros nomes ameacem a dupla PT-PSDB. A senadora Marina Silva, candidata pelo PV, só tem seu carisma e a mística do ambientalismo, atributos não desprezíveis se pudesse dispor de uma máquina de propaganda forte e estivesse há mais tempo na estrada.
A candidatura de Ciro Gomes depende de o PSB, seu partido, querer investir no futuro, ocupando espaço para um projeto maior, visando 2014, já que não aconteceu a promessa de Lula de apoiar um segundo nome pela base aliada. O PSB, como o PV, estaria só na campanha.
A sua cúpula quer ir com Dilma, enquanto suas bases locais estão com ela ou Serra. O grosso do PSB em São Paulo, onde Lula cogitava lançar Ciro a governador, integra, por exemplo, o bloco do PSDB.
O quadro político nacional tende a uma overdose de Dilma e Serra, à falta de novidades competitivas — e eles terão de suar a camisa para não cansar o eleitor até outubro. Para alívio da torcida, no meio haverá a Copa do Mundo. Mas dura só um mês. Não há como ficar em evidência e prender a atenção sem que produzam fatos novos.
Há riscos também, e não só de enjoar precocemente o eleitor. Eles vão infiltrar-se em blogs e sites de relacionamento, como o Orkut. Se exagerarem, os candidatos acabarão caracterizados como chatos.
A culpa está posta nos marqueteiros de Barack Obama, responsáveis por parte de sua bem-sucedida campanha. O PT contratou a agência e o guru virtual de Obama para assessorar a campanha de Dilma.
Santo de casa não faz milagre. Na eleição de 2002, as assessorias de Lula e Serra já assediavam a web. Voluntários foram acionados — e, com perfis fictícios, entravam em sites com área de comentários para descarregar impropérios cruzados. Agora, será muito pior.
Os partidos estão recrutando pessoas para fazer tal serviço, além de produzir baterias de e-mails. O jeito é deixar para lá os bate-bocas nos blogs, não “dialogar” com estranhos e recusar pedidos de “amizade” nos sites de relacionamento. No limite, cair fora da web até passar a febre eleitoral. Poderá poupar dores de cabeça.
Defeitos comparados
E na velha e boa política de sempre das ideias? Por ora, Serra é quem pode inovar, se Dilma insistir em continuar comparando quem fez mais: os governos Lula ou FHC. Como tática, já funcionou. Como fio condutor de campanha, tenderá a envelhecer, pois lançado cedo.
Ela tornaria Lula muito mais unânime e benquisto, com o risco de chegar a outubro com um paradoxo: reconhecida nacionalmente, mas uma estranha para o eleitor. Só despontariam os seus defeitos.
Já Serra é a reprise das últimas eleições, das quais perdeu a de 2002 para Lula, e venceu as de 2004, para prefeito de São Paulo, e a de 2006, a governador, ambas como desafiante de administrações petistas. Seus defeitos surpreendem menos por serem ainda frescos.
Caixa de surpresas
Por mais que os marqueteiros e estrategistas políticos de PSDB e PT tentem antecipar em laboratório o sentimento do eleitor, sabe-se que eleições dificilmente são estáticas, como se viu no Chile.
Tão popular como Lula, a então presidente Michelle Bachelet não elegeu seu candidato, embora a coalizão de centro-esquerda que ela representasse estivesse dividida na eleição. O vencedor, Sebastián Piñera, de direita, em visita oficial ao país, se disse um modelo para Serra, com quem se encontrou, além de Lula. O que aconteceu?
A tática de cada um
Lá — como cá entre os governos Lula e FHC —, a política econômica pouco mudou entre a fase final da ditadura militar e os vinte anos em que a Concertação, o nome da coalizão de esquerda, governou. Os progressos foram maiores na área social. Piñera teve sucesso em se apresentar mais preparado para melhorar o que o eleitor aprovava.
O repto de Serra será fazer o mesmo, o que implica: 1º, mostrar a sequência entre FHC e Lula; e, 2º, o que e como melhorar. Para ele, os fatos novos pós-Lula são a única campanha viável, o que tende a levar Dilma a contestar, como já fez ao falar de “lobos em pele de cordeiro”, referindo-se a Serra. Quanto mais se revele convincente ao eleitor, mais ela terá de apontar o que avançar sobre o legado de Lula. Aí, a campanha ficará interessante. Ou será um marasmo.
Lula não sai de cena
Lula, de algum modo, já está legislando por Dilma, desenhando uma hipotética continuidade de seu governo depois de 2011, ao lançar o PAC 2, cobrar pressa do projeto do Eximbank Brasil, embrião de um provável Ministério do Comércio Exterior, e, mesmo sem caixa e sem programa maduro, querer anunciar a universalização da internet em banda larga. Pelo teor de suas declarações, ele não se vê de fora.
Depois de já ter dito que quem quiser derrotá-lo terá de acordar cedo, como se fosse ele o candidato, Lula agora diz que não será “instituição”. “Vou gritar mais, perturbar mais, vou arregaçar as mangas para fazer a reforma política”, afirmou em evento no qual o PC do B formalizou apoio a Dilma. E ela faria o quê? Continuará em segundo plano? Vai acabar chamada de candidata laranja.
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