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PELA PRIMEIRA vez nos últimos anos podemos escutar murmúrios sobre uma possível decisão "política" do presidente do BC na condução da política monetária. Sua decisão de desempatar a votação na reunião do Copom desta semana, no sentido de manter a taxa Selic, foi recebida por parte do mercado como tal. Afinal, usando critérios adotados pelo BC no passado, havia motivos fortes para que o Copom decidisse por um primeiro aumento do juro. Empurrar por mais 45 dias essa decisão foi certamente -para usar uma linguagem do mercado- um ponto fora da curva das decisões do BC na gestão Meirelles. Até que seja provado o contrário, não acredito que o BC correria tal risco sem boas razoes técnicas. Entre elas, está a possibilidade de desaceleração da economia por conta da redução dos estímulos fiscais e do aumento do compulsório, além de uma acomodação natural após a recuperação rápida da recessão do primeiro semestre de 2009. Pode ser que isso ocorra, mas, conhecendo o consumidor e o empresário brasileiro, parece-me que é otimismo demais confiar em uma desaceleração suficiente por conta desses fatores. O leitor da Folha conhece minhas ansiedades em relação à inflação no Brasil neste início de ano. A retomada do consumo tem sido muito rápida e já estamos em níveis de vendas ao varejo muito superiores aos de antes da crise. Além disso, a geração de empregos está acontecendo com a mesma intensidade de antes de setembro de 2008. Nos últimos cinco meses, as estatísticas do Ministério do Trabalho apontam para um aumento anual de quase 2,5 milhões de postos de trabalho no mercado formal. Com isso, a massa de salários deve em breve crescer a uma taxa anual superior a 6,5% ao ano. Sem alterações nesse ritmo, a taxa de desemprego poderia chegar a 5% ao final de 2010, nível nunca visto no país. Certamente não chegaremos a esse ponto, pois as condições de demanda e oferta de mão de obra qualificada não permitem um número tão baixo. Fica claro, portanto, que é preciso uma sensível desaceleração do crescimento do emprego para evitar o aumento de pressões inflacionárias. Mesmo que isso aconteça, ainda teremos um mercado de trabalho bem pressionado ao longo do restante do ano, com aumentos reais de salários e uma massa de renda crescendo de forma expressiva. Nesse cenário, o aumento da demanda interna continuaria muito forte em um quadro de oferta -sobretudo de bens e serviços que não podem ser importados- pressionado. Como considero o canal dos salários um dos mais importantes mecanismos de aumento dos preços de mercado, teremos nos próximos meses uma forte pressão sobre a inflação. Os economistas da Quest trabalham com uma variação do IPCA de até 5,4% para 2010. Além desse mecanismo interno, outra ameaça de inflação começa a desenhar-se no horizonte. Caso realmente aconteça uma estabilização do crescimento econômico no mundo desenvolvido, podemos viver uma nova rodada de alta dos preços das matérias-primas. No caso do minério de ferro, especula-se reajuste entre 60% e 80% já em abril. O preço do petróleo também está em alta e pode chegar a mais de US$ 90 o barril ainda neste ano. Faço votos de que o Copom tenha razão em sua paciência, mas temo que a eventual sincronia entre um choque externo de preços das commodities e um mercado interno pressionado por forte crescimento do consumo e do emprego custe caro ao Banco Central. LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 67, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso). |
sexta-feira, março 19, 2010
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
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