terça-feira, fevereiro 02, 2010

MARCOS NOBRE

A hora do STJ

FOLHA DE SÃO PAULO - 02/02/10


PRIMEIRO, JOSÉ Sarney ficou.
Depois, o STF resolveu rasgar a liberdade de imprensa, mantendo a censura ao jornal "O Estado de S. Paulo" em relação a Fernando Sarney e ao grupo político de seu pai. Agora, esse fechamento a vácuo de Brasília pode se estender por todo o sistema político.
Em menos de 45 dias, o STJ suspendeu os processos judiciais ligados a duas das mais importantes operações da Polícia Federal em uma década. Hoje, ao voltar do recesso, o STJdeve começar a examinar o mérito da suspensão da Operação Castelo de Areia.
As investigações obtiveram indícios consistentes e inéditos de todos os elos da cadeia que liga corruptores e corrompidos, obra pública e empreiteira privada. O potencial de destruição política dessas ações é tão grande que ninguém menos do que o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, após uma reunião com Lula, aceitou defender a empresa Camargo Corrêa, alvo da operação. O mínimo que se pode esperar é que a decisão do STJ não acabe objetivamente colaborando com esse gigantesco jogo de preservação de carreiras políticas que, dito de maneira direta, é simplesmente contra a democracia.
Não bastasse estar em jogo a proteção de parte substancial da elite política, esse julgamento é também um episódio decisivo de uma luta política interna ao próprio Judiciário, envolvendo os tribunais superiores e inferiores e o Ministério Público. STF e STJ são e devem mesmo ser instâncias que uniformizam o entendimento judicial.
Mas esse papel não deve ser confundido com subjugar as instâncias inferiores e o MP, bloqueando o surgimento de novas interpretações e de procedimentos inovadores. STF e STJ não devem se colocar na posição de órgãos fiscalizadores e disciplinadores de instâncias inferiores e do MP. Para isso existem as respectivas corregedorias, o CNJ e o CNMP.
A independência e a criatividade de decisões de instâncias inferiores foram muitas vezes tábua de salvação. Basta pensar, por exemplo, nos desbloqueios de contas correntes que autorizaram durante o famigerado Plano Collor, de 1990, impedindo que a economia travasse. O mesmo Collor que foi posteriormente objeto de investigação liderada pelo MP.
O que teria acontecido se os tribunais superiores tivessem bloqueado essas ações por parte das instâncias inferiores e do MP? É a pergunta que o STJ deve se fazer agora ao julgar os processos da Operação Castelo de Areia. Para que, no final, não acabe objetivamente amordaçando o Judiciário e se tornando oficina de blindagem da política oficial.

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