SÃO MUITO significativos os ecos de Davos. Um ano de crise global fez desaparecer toda a arrogância do primeiro mundo, que sempre desdenhou os países emergentes. Agora, os deficits fiscais, as dívidas públicas incontroláveis e até as atitudes populistas dos governos são características dos países desenvolvidos, incluindo os Estados Unidos, o Japão e as tradicionais nações europeias. Enquanto isso, os emergentes, entre eles o Brasil, gozam de enorme credibilidade e prestígio. Os quatro Bric -Brasil, Rússia, Índia e China- acumulam reservas somadas de US$ 3 trilhões e se transformaram em grandes credores internacionais. A China é maior de todos, com US$ 2,4 trilhões guardados. "O Brasil é hoje a última das nossas preocupações", testemunhou Charles Dallara, representante dos grandes bancos, do Instituto de Finanças Internacionais. Quem diria. Poucos anos atrás, o Brasil era considerado um grande risco para os investidores globais. Até 30 de abril de 2008, o país ainda não tinha o grau de investimento concedido pelas agências mundiais de rating, indicando que oferecia risco de não honrar seus compromissos financeiros. Uma das agências relutou até setembro do ano passado para dar a classificação ao Brasil. Ironicamente, agora o risco vem do primeiro mundo. Nouriel Roubini, o célebre economista americano que previu a crise de setembro de 2008, agora antevê que o risco de calote vem de países como Irlanda, Grécia, Itália, Reino Unido e até Estados Unidos, de Estados como Califórnia e Alabama. Kenneth Rogoff, professor de Harvard, também cita a Grécia, mas inclui na lista Hungria, Ucrânia e Letônia. Não dá para acatar sem ressalvas essas previsões apocalípticas. Afinal, um ano atrás, o mesmo Roubini, por exemplo, profetizava que o mundo ainda estaria em recessão em 2010. E pelo visto, consideradas as estimativas do Fundo Monetário Internacional, a economia global vai crescer cerca de 3,9% neste ano. De qualquer forma, a realidade que emerge no pós-crise, retratada na comunidade econômica dos países ricos, em Davos, indica que vivemos novos tempos. As previsões feitas pelo famoso trabalho da Goldman Sacks sobre a emergência dos Bric foi mais do que profética. Segundo o trabalho, a China ultrapassaria o Japão, em produção econômica, em 2016. Isso já espantou muita gente em 2003, quando o trabalho foi publicado. Mas a ultrapassagem chinesa se deu bem antes do previsto. O PIB chinês superou o japonês em 2009, com um valor estimado em US$ 4,9 trilhões. A China também se tornou o maior exportador do mundo, tomando o lugar da Alemanha. Por que ocorre isso com os Bric? O que os distingue? Em três palavras, a resposta é: capacidade de crescer. Essa competência, demonstrada claramente ao longo da última década, e reforçada durante a atual crise global, deu aos emergentes um selo de qualidade. O Brasil poderia até ter sido mais virtuoso nesse quesito se não mantivesse durante todo esse período uma política de juros equivocada, que impediu o país de deslanchar em razão dos custos financeiros exorbitantes. Ainda na semana passada, o Brasil retomou a liderança mundial no ranking dos países com maior juro real do mundo, com 4% ao ano. E mais: o Banco Central ameaça aumentar ainda mais a taxa básica, atualmente em 8,75%. Não faz sentido.
BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). |
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