Pátio de escola
O GLOBO - 11/02/10
O PT não quer outra coisa do que a comparação. Em primeiro lugar porque Serra representando o governo FHC é menos preocupante do que o Serra como novidade. E também porque, como mostrou aquela insuspeita reportagem da Folha de São Paulo na terça feira, no puro cotejo de números com números, reconhecidos todos os méritos do governo anterior, o atual leva vantagem. E seu social é maior.
Mas o importante é que o ano eleitoral começa sem ninguém querendo morder a carótida de ninguém. Ou pedindo que Deus intervenha no processo.
LÍNGUAS
Certa vez fizeram uma pesquisa entre 15 mil ingleses que concluiu que a palavra mais bonita do seu idioma é “serendipity”. Tradução imprecisa: a sensação de descobrir algo desejável por acidente. Entre as outras palavras bem votadas, algumas obviedades – “love”, “peace”, “hope”, “faith”, “compassion”, “home” – amor, paz, esperança, fé, compaixão, lar, tudo o que a gente quer – e algumas curiosidades, como “onomatopoeia” e “football”. E “Jesus” e “Money” empatados em décimo lugar. Acho que os ingleses votaram mais na coisa (“fuck” não fez feio) do que no seu nome. “Football” bonita? Pensando bem, uma palavra terminada em “dipiti” a mais bonita de todas? É preciso ser inglês.
Como seria uma lista parecida no Brasil? Meu voto para a palavra mais bonita do português iria para “sobrancelha”. Segundo lugar, “sândalo”. A mais feia? “Seborréia”. Pior, até, do que “onomatopéia”. Desconfio que nós, os latinos, pesquisados, tenderíamos mais para o nome do que para a coisa, para o som da palavra mais do que para o que ela representa. Nossas línguas seriam mais abstratas do que o utilitário inglês e o preciso alemão, que nunca são falados com o gosto, com o puro prazer de saborear a pronúncia, que os italianos falam a sua, por exemplo. Mas teses sobre os povos e sua relação com seus idiomas são sempre arriscadas. O Jorge Luis Borges flagrou um paradoxo: os escritores mais representativos de cada país são sempre pouco característicos do seu povo. Nada menos típico da Inglaterra do “understatement” do que o espalhafatoso Shakespeare, que Borges considerava mais italiano ou judeu do que inglês. Nada menos alemão, com sua tolerância, seu antifanatismo e sua indiferença ao conceito de pátria, do que Goethe. Victor Hugo, com seus “grandes cenários e vastas metáforas”, segundo Borges, tem pouco do especifismo francês. E a Espanha é representada por Cervantes, um contemporâneo da Inquisição tolerante, um espanhol que satirizava a paixão. No fim todo o mundo, quando pensa formalmente na língua que fala, pensa em outra língua.
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