terça-feira, dezembro 29, 2009

LUIZ GARCIA

A cabo

O GLOBO - 29/12/09

Não lembro o ano, mas foi em Nova York, na casa de um amigo, que conheci a tal da televisão por assinatura.

Como não dependia de anúncios, poderia ser culta e inteligente.

Balé, ópera e concertos de montão, sem falar em Shakespeare e outras coisas finas. E passei uns dois dias tomando cultura na veia, bocejando de vez em quando. Como sabido, o tédio pode ser o preço da erudição.

O tempo passou e, sempre como sabido, a TV paga logo abandonou a pretensão de manter o QI nas alturas.

Pelo menos, não o tempo todo. Claro: quantos, no vasto mundo da audiência, dão-se ao esforço de serem exclusivamente inteligentes? Mas sobrevivem nichos de sofisticação. No bom sentido, evidentemente.

Por exemplo, o “Painel”, comandado por William Waack na Globonews nas noites de sábado, com reprise no domingo. Não tem filmetes nem fotos. São apenas três senhores com algo a dizer sobre problemas do momento. Ninguém está vendendo coisa alguma, exceto suas próprias ideias e, talvez mais importante, as informações de que os três dispõem sobre o assunto em questão. O formato do programa parece perfeito. Não há catequese, mas debate: você escolhe, se quiser, a opinião que melhor se combina com o que você já pensa a respeito do tema.

Se nunca teve posição a respeito, pode começar a ter.

No último fim de semana, Waack administrou uma discussão sobre o que esperar de 2010 na política externa brasileira. É tema rico. No mau sentido, evidentemente. O Itamaraty, como sabido, não consegue ter atitude minimamente crítica em relação às posturas demagógicas do venezuelano Chávez, não sabe o que fazer em relação à crise política em Honduras, demorou a tomar posição definitiva sobre a entrada da citada Venezuela no Mercosul e diversos etcs.

Não são questões que o leitor de jornal ignore. Mas discussões inteligentes na TV ajudam-no a tomar posição — concordando ou discordando dos especialistas convidados, pouco importa.

No fim das contas, é esse o serviço prestado por programas como o de Waack. É a TV por cabo, tal como ela prometia ser quando apareceu.

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