FOLHA DE SÃO PAULO - 03/08/09
RIO DE JANEIRO - Coluna recente, em que falei de certos rituais do cinema americano do passado -envelopes que se fechavam com uma simples lambida, cigarros soltos dentro dos bolsos etc.-, despertou a memória de meu amigo Celso Arnaldo Araújo, companheiro de "Manchete" nos anos 70. Ele me lembrou de outras manias daqueles filmes.
Por exemplo, quando as balas do revólver do bandido acabavam, este jogava o revólver fora. Qualquer cheque, mesmo de milhões de dólares, era preenchido e assinado perfunctoriamente, em menos de dois segundos. E, quando as pessoas tinham de vomitar no filme, era sempre com a cabeça enfiada no vaso sanitário, quase dentro da água, mesmo que a cena se passasse em nojentos banheiros de beira de estrada -na época, o cinema ainda nos poupava de vômitos explícitos.
As ligações telefônicas eram sempre interrompidas abruptamente, com a pessoa batendo o telefone no gancho -ninguém dizia um simples "tchau, tchau" ao fim da conversa, mesmo que não estivesse braba com o interlocutor. E, nos apartamentos, a campainha tocava, o herói ia abrir e a visita era sempre surpreendente -nunca se viu um porteiro ou interfone nos velhos filmes americanos.
Eu acrescentaria aqueles fósforos que se acendiam ao ser riscados em qualquer lugar -na parede, na sola do sapato e até na careca do coadjuvante. Em 1974, percorri meio EUA em busca dos tais fósforos, mas não os encontrei em lugar nenhum.
Assim como eu, Celso Arnaldo vê com divertida perplexidade esses ritos de Hollywood -ou de Brasília, em que, por mais que um político pinte e borde, não bastam as provas mais contundentes para classificá-lo como corrupto e justificar sua defenestração. Como nos filmes, exige-se que se faça de conta que tudo aquilo é normal.
RIO DE JANEIRO - Coluna recente, em que falei de certos rituais do cinema americano do passado -envelopes que se fechavam com uma simples lambida, cigarros soltos dentro dos bolsos etc.-, despertou a memória de meu amigo Celso Arnaldo Araújo, companheiro de "Manchete" nos anos 70. Ele me lembrou de outras manias daqueles filmes.
Por exemplo, quando as balas do revólver do bandido acabavam, este jogava o revólver fora. Qualquer cheque, mesmo de milhões de dólares, era preenchido e assinado perfunctoriamente, em menos de dois segundos. E, quando as pessoas tinham de vomitar no filme, era sempre com a cabeça enfiada no vaso sanitário, quase dentro da água, mesmo que a cena se passasse em nojentos banheiros de beira de estrada -na época, o cinema ainda nos poupava de vômitos explícitos.
As ligações telefônicas eram sempre interrompidas abruptamente, com a pessoa batendo o telefone no gancho -ninguém dizia um simples "tchau, tchau" ao fim da conversa, mesmo que não estivesse braba com o interlocutor. E, nos apartamentos, a campainha tocava, o herói ia abrir e a visita era sempre surpreendente -nunca se viu um porteiro ou interfone nos velhos filmes americanos.
Eu acrescentaria aqueles fósforos que se acendiam ao ser riscados em qualquer lugar -na parede, na sola do sapato e até na careca do coadjuvante. Em 1974, percorri meio EUA em busca dos tais fósforos, mas não os encontrei em lugar nenhum.
Assim como eu, Celso Arnaldo vê com divertida perplexidade esses ritos de Hollywood -ou de Brasília, em que, por mais que um político pinte e borde, não bastam as provas mais contundentes para classificá-lo como corrupto e justificar sua defenestração. Como nos filmes, exige-se que se faça de conta que tudo aquilo é normal.
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