quarta-feira, agosto 26, 2009

CLÓVIS ROSSI

Brasil vê bases como irreversíveis, mas tenta reaproximar vizinhos

Folha - 26/08/09

O governo brasileiro já dá como certo que a cúpula da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), na sexta-feira em Bariloche, não provocará a reversão do acordo Colômbia/EUA para o uso de bases na Colômbia por militares americanos.
A reversão era o objetivo não explicitado da cúpula. Para a Venezuela, continua sendo, como se vê da seguinte declaração de seu chanceler, Nicolás Maduro: "Esperamos que da cúpula de Bariloche surjam importantes conclusões que permitam garantir ao continente sul-americano que as bases de paz se multiplicarão e que as bases militares dos EUA comecem um processo de reversão".
Se não haverá a reversão, quer dizer que a cúpula é um fracasso pré-anunciado? Não necessariamente.
Primeiro porque era absolutamente irrealista esperar a reversão. No mesmo dia em que anunciou a disposição do presidente Álvaro Uribe de participar do encontro, a Chancelaria colombiana já avisava que não condicionava o acordo com os EUA aos resultados da cúpula.
Segundo porque Bariloche pode ser o palco para começar a fechar a mais grave ferida aberta na pele da união sul-americana, que é o confronto Equador/Colômbia. Quito rompeu relações com Bogotá depois do bombardeio de um acampamento das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) em território equatoriano, no ano passado.
No périplo que encerraram ontem pelas duas capitais, Marco Aurélio Garcia, assessor diplomático do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro da Defesa, Nelson Jobim, encontraram, na versão de Marco Aurélio, "sangue doce" de parte a parte para "desatar o nó bilateral".
De fato, somando o que autoridades equatorianas e colombianas disseram aos dois brasileiros ao que a Folha ouviu na Chancelaria colombiana, parece haver espaço para ao menos iniciar a reaproximação.

Ponto a ponto:
1 - Extraterritorialidade - É a exigência equatoriana de que a Colômbia renuncie definitivamente a perseguir os terroristas das Farc em território de outros países. Marco Aurélio encontrou boa disposição entre os colombianos para atender o pedido.
2 - Combate às Farc - Os colombianos, sem mencionar nomes de países, queixam-se de que os vizinhos não colaboram no combate ao narcoterrorismo representado pelas Farc. É uma queixa que se dirige tanto à Venezuela como ao Equador.
Mas os equatorianos exibiram a Jobim e Marco Aurélio "dados muito significativos" sobre a repressão ao pessoal das Farc que cruza a fronteira.
Além disso, prometeram que processarão judicialmente todos os equatorianos acusados de vinculação com as Farc, inclusive pessoas que participaram da campanha eleitoral do presidente Rafael Correa.
3 - O caso Juan Manuel Santos - É o ex-ministro colombiano da Defesa, eventual candidato à sucessão de Uribe e o principal responsável pela repressão às Farc. A Chancelaria colombiana não aceita que o Equador queira processá-lo por conta do ataque ao acampamento das Farc.
Os equatorianos disseram aos brasileiros que o caso foi iniciado pelo Poder Judiciário, sem qualquer subordinação ao Executivo.
Resolver a pendência Equador/Colômbia é um passo no sentido de reafirmar que "nada é mais importante que a Unasul. Ela tem prioridade sobre qualquer outra questão", como diz Marco Aurélio.
Sem negar que a questão das bases continuará causando "desconforto" ao governo brasileiro, o assessor de Lula não deixa de dar relevo ao que Colômbia e EUA apontam como único objetivo do acordo entre eles (combate ao narcotráfico e ao terrorismo, umbilicalmente ligados): "O narcotráfico é um inimigo fundamental. Não pode pesar nenhuma suspeição sobre nenhum país de leniência no combate a ele".

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