Absurdo
O GLOBO - 16/07/09
Não tenho acompanhado essa novela que se passa no Brasil e na Índia mas sei que tanto aqui como lá se fala o mesmo português com a mesma variação de sotaques. Nada a estranhar, o cinema nos acostumou justamente com essa suspensão da lógica sem a qual a compreensão da trama seria impossível, salvo com legendas, que no caso só complicariam mais as coisas. E deve-se dar graças a Deus e aos produtores por terem evitados absurdos dentro do absurdo como o do filme The Young Lions (Os Deuses Vencidos, dirigido, me informa o Google, por Edward Dmytryk, com Marlon Brando, Montgomery Clift e Dean Martin) em que Brando faz o papel de um oficial alemão. Por alguma razão, decidiram que ele deveria falar inglês com um sotaque alemão. Nenhum outro alemão do filme fala com sotaque alemão, só o Brando. Ele acaba se desencantado com a guerra e vira-se contra seus companheiros de farda mas suspeita-se que seu problema tem alguma coisa a ver com o sotaque inexplicável. “Esse cara está nos gozando” devem ter pensado os outros oficiais alemães, que se comunicam em inglês perfeito.
Nos filmes americanos sobre a Roma antiga convencionou-se que os aristocratas fossem interpretados por atores ingleses, falando o inglês da Rainha, e a plebe por atores com sotaque americano. No filme Spartacus o super-patrício Crassus, vivido por Laurence Olivier, fala como um nobre inglês e seu servo Antoninus fala como Tony Curtis, que é de Brooklyn, NY. Seria uma auto-crítica americana, um reconhecimento da sua culpa na vulgarização do idioma, se não fosse por um fato. Na Roma antiga, pelo menos no cinema, a plebe era virtuosa e o patriciado corrupto, e seu inglês bem falado apenas uma prova de afetação.
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