A sabedoria popular diz que o que vem fácil vai fácil. É o esforço na obtenção que leva à contenção - enquanto o que é dado escoa rápido. Isso se confirma, plenamente, com a gastança das centrais sindicais brasileiras. Elas foram presenteadas com pródiga dinheirama desde 31 de março, quando o presidente Lula as reconheceu, assegurando-lhes o direito ao repasse de recursos correspondentes a 10% do Imposto Sindical arrecadado, ao mesmo tempo que vetou o dispositivo do projeto que obrigava à fiscalização de suas contas por parte do Tribunal de Contas da União (TCU). Matéria publicada sexta-feira no Estado dá conta de que a compra de prédio inteiro, pronto, para abrigar a sede de uma delas, o aluguel de salas, o pagamento de dívidas, o reembolso de viagens e até uma insólita “sardinhada” de protesto contra os juros altos, em frente ao Banco Central, foram as formas que as centrais encontraram para gastar parte substancial dos R$ 61 milhões gentilmente ofertados pelo governo federal, mas compulsoriamente retirados do bolso dos trabalhadores, sindicalizados ou não, que têm de contribuir, anualmente, com o equivalente a um dia de trabalho. O prédio-sede, no caso, foi comprado pela Força Sindical - uma “casa nova”, como a ele se referiu seu presidente, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força.
Essa parcela do bolo arrecadado do Imposto Sindical tornou-se a principal fonte de recursos das centrais sindicais, que também recebem mensalidades dos sindicatos filiados. Os 10% da arrecadação total do Imposto Sindical, mesmo porcentual retido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, são divididos entre a Central Única dos Trabalhadores (CUT) - maior beneficiária, que recebeu este ano R$ 21,5 milhões -, a Força Sindical - a segunda aquinhoada, com R$ 16,5 milhões -, a União Geral dos Trabalhadores (UGT), a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) e a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
A legalização dessas entidades e a transferência dos mencionados recursos para elas sempre gerou muita polêmica. Tramita no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade, impetrada pelo DEM, questionando a base constitucional tanto do reconhecimento das centrais quanto de sua participação na arrecadação do Imposto Sindical. Agrava a controvérsia o fato de o presidente Lula ter vetado o artigo da lei que obrigava as centrais a prestar contas, ao TCU, do dinheiro arrecadado. Quais os motivos que levaram à eliminação do controle financeiro e contábil do dinheiro público, pois arrecadado sob a forma de imposto, proveniente do esforço dos trabalhadores, a não ser manter os sindicatos atrelados às tetas do governo? Foi o que fez a ditadura getulista, que criou o famigerado imposto e, com ele, os chamados “pelegos sindicais”.
Merece atenção especial a participação da CUT nesse processo. Primeiro porque a central que mais arrecadou informa que nada gastou. Seu secretário-geral, Quintino Severo, afirma que a entidade preferiu utilizar esses recursos numa ampla campanha de sindicalização. Entende-se o projeto, especialmente porque o próximo ano será decisivo no campo político - e ninguém ignora a grande participação sindical nos embates eleitorais. Além disso, a CUT sempre teve por bandeira a eliminação do Imposto Sindical - embora, paradoxalmente, sempre repetisse não ser possível acabar com essa fonte de financiamento sem abalar o sistema sindical. De fato, a proposta encaminhada pela CUT à Casa Civil, de substituir o Imposto Sindical por uma “contribuição negocial” - fixada em assembléias -, não passa de uma troca de seis por meia dúzia.
Considerando-se que os sindicatos são quase sempre dominados por “panelas” que decidem tudo - e nem sempre de conformidade com os interesses da maioria -, a “contribuição negocial” terá as mesmas características compulsórias do Imposto Sindical. E não tendo poder de decisão diante dos eternos “donos do clube”, os trabalhadores contribuintes poderão até ter que pagar “contribuições negociais” mais caras que o dia de trabalho do imposto.
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