segunda-feira, janeiro 31, 2011

ANCELMO GÓIS

Cantora do rádio
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 31/01/11

Dilma anda de bom humor. No encontro com o governador Marcelo Déda, de Sergipe, semana passada, a presidente cantou várias músicas antigas que aprendeu ouvindo a sua mãe. Não é fofo?

Direito autoral
No meio do debate sobre a decisão da ministra Ana de Hollanda de retirar o selo da “creative commons” da página do Minc na internet, que liberava o conteúdo para terceiros, a banda Biquini Cavadão resolveu oferecer seu aplicativo gratuito para iPhone e iPad, que pode ser baixado na loja iTunes. Os fãs terão ao alcance dos dedos músicas, letras, acesso a vídeos, mídias sociais, blogs, twitter e agenda.

Rádio Aeroporto
O que se diz no portão de embarque é que o governo vai mesmo nomear um empresário para cuidar da Infraero. Especula-se também sobre a sucessão na Anac. É que o mandato de Solange Vieira como diretora presidente acaba no dia 23 de fevereiro.

Por falar ....

A Anac deve reajustar hoje a tarifa de pouso e permanência em vôos domésticos. Pela tabela de 1997, um Boeing que transporta entre 150 e 175 passageiros paga cerca de R$130 para pousar e ficar na pista até três horas.

Ivete na moda
Ivete Sangalo, sinônimo de sucesso em tudo que faz, deve lançar este ano uma linha de jeans. 

Parlez portugais?
A coluna vai se queixar a Carla Bruni. Apesar da invasão de turistas brasileiros em Paris, o Museu do Louvre oferece folhetos em francês, inglês, alemão, espanhol, italiano e até russo, chinês e japonês. Mas nada de português.

Beleza negra
Este frei David dos Santos, da ONG Educafro, é osso duro de roer. Deve-se, em grande parte, a ele a adoção de cotas para negros em muitas universidades brasileiras. O nosso herói, com ajuda do MP, conseguiu também que negros ocupassem 10% das vagas de modelos da SPFW. Agora, quer dobrar o índice.

Joga um bolão
Marta, nossa grande jogadora de futebol, foi entrevistada de capa da “Newsweek ”, revistona americana 

A vez do Exalta

O grupo ExaltaSamba, aquele que tocou com Roberto Carlos em Copacabana, tem shows agendados para todos os 28 dias de fevereiro, e, desde 17 de janeiro, as apresentações também têm sido diárias. O último resultado do Crowley, órgão que pesquisa as músicas mais tocadas nas rádios, deu ao samba “Um minuto”, do grupo, o 1º lugar nacional.

O Cine PE vai homenagear Wagner Moura e José Padilha em sua 15ª edição, de 30 de abril a 6 de maio. O secretário Carlos Roberto Osório participará do TEDxRio, dia 15 de fevereiro, no Vivo Rio.

O designer de joias Leonardo Sodré lançou o site leosodre.com.

Miéle e Eduardo Poyares, às sextas, fazem o espetáculo “Holy Broadway”, no Bar do Tom.

Abre hoje liquidação da NK Store em Ipanema.

A médica Vera Lúcia Pitombo expõe, até dia 6, almofadas para amamentação na Mega Gestante e Bebê, no Riocentro.

Cidade do Samba 2
Eduardo Paes vai construir uma nova Cidade do Samba. A atual, na Gamboa, onde as escolas do Grupo Especial preparam seu carnaval, é um sucesso. Mas o prefeito procura uma área na região de Benfica/São Cristóvão para alojar as escolas do Grupo de Acesso. A medida também ajuda na retirada de algumas escolas menores que estão ocupando provisoriamente galpões na região
do Porto.

%&*#+§!!!
A quadra de esportes do Barra Golden na Barra no Rio foi interditada por tempo indeterminado por causa acreditedo excesso de palavrões gritados ali por adolescentes e até crianças do condomínio. A administração estuda a aplicação de multa de um salário mínimo por família de autor de palavrão descoberto. 

Apelando a tudo
Dirigentes do cambaleante Vasco andaram consultando Mãe Dinah, a vidente. 

Grande Hotel

Hoje, o Rio tem 2.700 quartos de hotel em construção ou em reforma. São 17 projetos.

Trio maravilha
Quitéria Chagas será musa do carnaval do Cordão da Bola Preta. Vai desfilar ao lado da madrinha Maria Rita e da porta-estandarte Leandra Leal.

Aliás, Por Quitéria, Maria Rita e Leandra Leal, a coluna aqui mata ou morre.

GOSTOSA

CARLOS BREMER

Crescimento em ritmo chinês

Carlos Bremer 

O Estado de S.Paulo - 31/01/11

O Brasil passa por um período de aceleração no seu crescimento. Enquanto as previsões do Banco Central (BC) mostram que o Produto Interno Bruto (PIB) nacional deve ter alcançado um incremento de 7,6% em 2010, batendo ao mesmo tempo um recorde de investimento externo com um valor de US$ 48 bilhões em 2010, muitos segmentos começam a se descolar desse cenário e crescem acima dos dois dígitos, algo que pode ser considerado semelhante ao crescimento em ritmo chinês. Só que o crescimento brasileiro não é somente de volumes. Ele envolve toda uma mudança de perfil de comportamento do consumidor.

A mobilidade social e de consumo das classes E e D para as C e B e até mesmo para a A pode ser considerada um movimento sem paralelo em nossa história. A participação de classe C pulou de 44,9% em 2006 para 50,5% em 2009. Essa mesma classe dobrou seu acesso à internet em três anos e 31% deles já compraram pelo menos uma vez pela internet.

Outra característica é o acesso crescente a crédito. Cerca de 68% dos consumidores da classe C, por exemplo, compraram usando cartão de crédito. Esse contexto muda drasticamente o perfil da demanda a que as organizações têm de atender. Como e o que esses consumidores em mobilidade social irão comprar? Quais características eles valorizam e, portanto, serão diferenciais entre uma cadeia de valor a outra?

Vimos no último Natal o grande número de vendas de televisores de tela plana, LCD ou plasma. Todos com parcelamentos populares. Isso mexeu com toda uma logística de produção ou importação de peças, produção, espaço em pontos de venda, distribuição e entrega. Setores como os de linha branca, automotivo e de construção civil também são claros casos dessa indagação, fazendo mudanças significativas em seus produtos, serviços e modelos de atendimento com relação a referenciais mundiais - afinal, além de abastecer o mercado interno, muitas companhias passam pelo processo de internacionalização, levando seus produtos e serviços para além de nossas fronteiras físicas, basicamente como faz há algum tempo a China.

Estamos, assim, criando nosso referencial de valor e o desafio é construir e gerir cadeias de valor alinhadas, capazes de entregar essa nova e dinâmica realidade de propostas de valor.

Gestão. Algumas empresas, entretanto, não entendem que, para crescer nesse ritmo e ser competitivo, é preciso adaptar seu sistema de gestão para que todos os envolvidos consigam atuar da mesma forma, dentro de uma visão de cadeia de valor. Um dos problemas de gestão mais frequentes que essas empresas enfrentam é não quebrar velhos paradigmas e culturas de gerenciamento.

Um exemplo: quando é implantado um novo sistema integrado de processos, todos devem utilizá-lo de maneira horizontalizada, ou seja, todos vendo e trabalhando para todos, o que nem sempre acontece, pois as companhias ainda têm uma visão verticalizada e departamentalizada, ou seja, cada um em sua função. Esse sistema, oriundo das instituições militares, é quase que como um patenteamento de funções. Não pode ser considerado errado, mas é certamente incompleto, pois só alinha a visão de cima para baixo da organização e vice-versa. O todo e o alinhamento entre proposta e entrega de valor não é levado em conta.

A solução das empresas que realmente alcançaram o sucesso e transformaram o crescimento chinês em resultado está justamente em descobrir as falhas e gerar uma nova cultura, adaptada à realidade do futuro - no presente -, criando, com isso, novos valores que não necessariamente podem ser vistos e avaliados como novidades, mas devem levar em consideração a visão de um todo, de um sistema, de um processo maior que as simples divisórias departamentais. Só que nem sempre é tão simples, pois as corporações que veem seus resultados crescerem de forma robusta enxergam apenas o lucro imediato e não como manter a perenidade dos negócios de forma homogênea e sustentável para todos os stakeholders envolvidos.

Muitas vezes, para que a ideia saia do papel, é necessária uma visão externa. Só com um olhar realmente diferenciado dos verdadeiros gestores, que se preocupam e querem ver o negócio prosperar como um todo e muitas vezes acima de suas atribuições e responsabilidades funcionais, é possível gerar um novo conceito empresarial e alinhar desde sua proposta de valor aos mercados até sua entrega, passando por todos seus departamentos para avaliar a construção e amarração dessa cadeia.

Se observarmos as empresas mais perenes, veremos que elas se destacam porque evoluíram seu modo de pensar e agir ao longo do tempo. O Brasil está crescendo e isso é bom para todas as empresas, desde que elas percebam que, em um ambiente extremamente competitivo, cresce mais e com melhor qualidade quem se propõe a adaptar ou até se reinventar junto com as outras empresas de sua cadeia de valor.

Foco. De nada adianta crescer de maneira acelerada se a geração de valores fica em segundo plano. É justamente neste momento que precisamos refletir quais os passos primordiais para o sucesso. Precisamos mudar o foco dos recursos para as relações, tendo em mente o conceito de gestão que chamamos de "value chain", uma rede de relações que concebe, propõe e entrega valor à sociedade de forma colaborativa e sustentável.

Relações são muito mais dinâmicas e adaptáveis do que recursos. É preciso que todos cresçam construindo relações. Uma empresa não é só a venda de produtos. É o processo, é a marca, suas verdades e principalmente suas pessoas e sua capacidade de colaboração. Em tempos de crescimento com mobilidade, isso fica ainda mais forte.


FUNDADOR E DIRETOR DE INOVAÇÃO DA AXIA VALUE CHAIN

ANTONIO OLIVEIRA SANTOS

Crença do BC
ANTONIO OLIVEIRA SANTOS
O GLOBO - 31/01/11


A aceleração do crescimento econômico pode gerar problemas internos e externos, como pressões inflacionárias e desequilíbrio na conta corrente do balanço de pagamentos. A partir dessa realidade, torna-se evidente a necessidade de conciliar, no quadro da política econômica, as políticas monetária e fiscal, a fim de que atuem na mesma direção.

A inflação brasileira teve um comportamento exemplar em 2009: o IPCA/IBGE subiu 4,31% e o IGP-DI/FGV caiu 1,43% (deflação). Em 2010, os primeiros cinco meses foram de forte alta dos preços, no varejo e no atacado, influenciada pelo mercado externo; mas, nos três meses seguintes (junho, julho e agosto), os preços no varejo desabaram. A partir de setembro, novo período de alta, que começou a arrefecer em dezembro.

O que se vê é uma forte oscilação de altas e baixas, originada no mercado interno, por instabilidade climática, mas, principalmente, derivada do exterior, face às tempestades na Austrália e ao calor na Rússia (que afetaram a oferta do trigo), às inundações na Índia (que reduziram as exportações de açúcar) e outros fatores, inclusive a forte demanda da China. Em 2010, o preço do minério de ferro subiu 142%, do café e da carne, 35%, da soja, do milho e do açúcar, mais de 25%, além dos produtos da siderurgia (24%) e vários outros.

Do lado do balanço de pagamentos, o que se viu foi um excesso de demanda interna, fomentada pelo crédito, puxando fortemente as importações, que cresceram 42,2% em 2010.

Ficam difíceis as previsões sobre o que vai acontecer no futuro próximo e qual o rumo da política econômica neste primeiro ano do governo Dilma. Mas há algumas certezas: 1) é imperiosa a necessidade de enxugar os gastos correntes do setor público, para que haja recursos para os investimentos na infraestrutura; 2) é indispensável manter o compromisso com a estabilidade monetária; e, 3) para que essas coisas possam acontecer, é preciso que as medidas de controle da inflação não fiquem baseadas nas elevações da taxa Selic.

O governo induziu o aumento do crédito oficial no BNDES, CEF e BB e a expansão se propagou através do sistema bancário privado. Até dezembro de 2009, bancos oficiais expandiam as operações de crédito em média anual de 32%, e bancos privados, 9%. Agora, os bancos privados já expandem a 21,5%, praticamente o mesmo que os bancos públicos.

Essa expansão do crédito estimulou o consumo e os investimentos, e criou pressões inflacionárias, na medida em que não houve redução proporcional nos gastos do governo. Em contrapartida, a valorização cambial estimulou as importações e reduziu os preços dos produtos importados. Há quem diga que foi a crise internacional, a partir do aumento da liquidez criada pelo governo americano e pelo Federal Reserve, que elevou os preços das commodities e produziu enorme ganho nas relações de troca, a favor do Brasil. Esse raciocínio ignora as verdadeiras causas originais. Mas é óbvio que as pressões inflacionárias do crédito foram amenizadas pelo aumento das importações. O BC tem que deixar de crer que é a Selic que controla a inflação.

Como não há certeza sobre o curso da inflação nos próximos meses, é uma temeridade qualquer decisão do BC para elevar ou mesmo manter a taxa Selic em nível tão mais alto que as taxas de juros internacionais.

ANTONIO OLIVEIRA SANTOS é presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

CLÁUDIO HUMBERTO

Mantega é quem disputa poder com Palocci
Ao final do primeiro mês do governo Dilma Rousseff, consolidam-se os grupos de poder no governo federal, com destaque para o ministro considerado mais forte, Antonio Palocci (Casa Civil), rivalizando com o único colega que ameaça fazer-lhe sombra: Guido Mantega (Fazenda). Ambos disputam as atenções e os raros elogios da presidente. No primeiro governo Lula, o grande rival de Palocci era José Dirceu.

Quebra da hegemonia

Dilma tomou uma decisão importante: quebrar a hegemonia de grupos políticos no Congresso, como aquele liderado por José Sarney.

Troca de comando
A presidente vai tirar a Eletrobras da área de influência de Sarney e fazer de José Antonio Muniz presidente de outra estatal, Eletronorte.

Pele de bebê
Dilma decidiu manter a rotina de consultar-se duas vezes ao mês com seu dermatologista e amigo Guilherme Almeida, de São Paulo.

DF: governo achacava até quem queria investir
O governador Agnelo Queiroz (PT) suspendeu por 90 dias o programa Pró-DF, que concede terrenos a empresas interessadas em se instalar no Distrito Federal. Há denúncias, já sob investigação, de que em governos anteriores empresários eram achacados em até R$ 2 milhões para receberem um lote. Desde 2009, foram distribuídos 214 lotes. Há 383 processos de concessão de áreas sob exame, neste momento.

Terra arrasada
A bagunça administrativa no governo do DF invadiu a residência oficial de Águas Claras: como toda cidade, o matagal chegava a dois metros.

Armários vazios
Agnelo contou a amigos que na residência oficial não encontrou nem taças para evitar o gargalo das garrafas d'água. Levou-as de casa.

Como os romanos
O tucanato está mais dividido que o senado romano nos tempos de Cícero, mas o encrencado senador Cícero Lucena (PSDB-PB) continua o favorito na disputa pela primeira-secretaria do Senado brasileiro.

O bicho que deu
Jornalista de economia esperava o presidente do Banco Econômico, Ângelo Calmon de Sá, atrasado para uma entrevista, em Salvador. Nas publicações do banco sobre a mesa, vê o logotipo sem acento circunflexo. A sílaba tônica no "mi" gerava um "Economico". Terminada a entrevista, não resistiu:
- O senhor não acha que não fica bem? Afinal, "mico" não é coisa agradável em bancos.
Calmon de Sá explicou rindo que, por ser banco centenário, seria grafia antiga. E garantiu, com serenidade baiana:
- Não se preocupe. Neste banco nunca vai haver "mico".
Anrã...

Apagão oficial
Agnelo e família chegaram a ficar 24 horas sem energia, na residência oficial. E o gerador, sem manutenção há seis meses, não funcionou.

MENGO

SEGUNDA NOS JORNAIS

Globo: Oposição se articula para fim da ditadura no Egito
Folha: EUA pedem fim da ditadura no Egito
Estadão: Itamaraty pede a embaixadas reavaliação da política externa
JB: Pra cá de Bagdá
Correio: Vale-transporte vira moeda até na Internet
Valor Econômico: Crédito do FGC facilita venda do PanAmericano ao Pactual
Estado de Minas: Indústria divide lucro e paga R$ 213 mi a empregados
Jornal do Commercio: Festa do Timbu
Zero Hora: Saques e embates põem Egito à beira do colapso

domingo, janeiro 30, 2011

J. R. GUZZO

Lições de cima
J. R. GUZZO
REVISTA VEJA

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DANIEL PIZA

O que Dilma espera?
DANIEL PIZA 
O Estado de S.Paulo - 30/01/11

Quando vai começar o governo Dilma? Depois do carnaval? Janeiro termina amanhã e quase nada se viu. É claro que a ampla bancada chapa branca da mídia já encontra motivos para elogios genéricos, em especial o de que ela tem um perfil mais administrativo; ou seja, estaria preocupada em fazer a máquina funcionar melhor e não em sair mundo afora fazendo discursos bravateiros enquanto os outros tomam decisões práticas. E é certo que se dê a governos iniciantes uma "lua de mel" de cem dias, como se diz, antes de sair emitindo julgamentos definitivos. Mas quanto antes ela apresentar suas propostas, mandar ao Congresso e mostrar à sociedade os planos e as reformas que acredita poder fazer, melhor. O capital político de sua votação não pode ser desperdiçado, ainda mais quando há tarefas inglórias pela frente.

Na realidade, há sacrifícios a fazer, mas é justamente por isso que ela precisa lançar diretrizes maiores, alimentar esperanças mais consistentes. Entre os sacrifícios está o de corrigir o caos fiscal que herdou do governo Lula. Os restos a pagar, a queda do superávit e a carência de investimentos não são problemas pequenos; a inflação vem subindo e o PIB não deve chegar a 5% neste ano. O aumento da arrecadação e dos ingressos externos não cobre o rombo, por mais maquiagem contábil que se faça com futuros faturamentos de estatais. Os juros oficiais já subiram e as obras de infraestrutura estão atrasadas. Como Lula em 2003, Dilma terá de passar por um primeiro ano de contenção firme, apesar da melhor conjuntura econômica. Mas dificilmente conseguirá neutralizar as críticas com slogans sociais e gestos carismáticos.

O que tivemos até agora foi a triste divisão do butim; isto é, o PMDB e o PT se engalfinhando por ministérios, estatais e cargos de confiança, todos em número absurdo sob qualquer parâmetro internacional. Escrevi uma vez que o PT seria o PMDB do século 21, o maior e mais fisiológico partido brasileiro, e o tempo vem confirmando a suspeita. Para uma legenda que nasceu reformista, há 30 anos, com apoio de intelectuais como Sergio Buarque de Holanda, é um destino melancólico. Mas a situação é favorável a médio e até a longo prazos. O Brasil está na moda, com desemprego baixo, commodities ainda em alta e a perspectiva de eventos esportivos (Copa em 2014, Olimpíada em 2016) e o pré-sal. Politicamente, o governo quase não enfrenta oposição; basta citar nomes como Aécio Neves e Gilberto Kassab e verificar.

Só que, para aproveitar de verdade esse cenário, além do corte nos gastos públicos, Dilma precisa dizer a que veio. Uma reforma que seria importante é a política, mas, pelo descrito acima, é difícil apostar nela, a não ser em um ou outro item (fidelidade partidária, cláusula de barreira ou qualquer coisa que impeça um número tão alto de partidos sem representatividade). Os esforços deveriam ser concentrados em duas áreas, cada uma em seu ritmo. Primeira, a melhora do ambiente econômico: a redução e simplificação da carga tributária e algumas medidas antiburocráticas permitiriam que as empresas pagassem melhor, fossem mais produtivas e cobrassem preços menores, pois o custo de vida está acima de qualquer senso. Segunda, uma profunda revisão da educação, para ter mão de obra bem mais qualificada e desempenho melhor em provas mundiais.

Essas duas ações significariam que o Brasil não quer ser apenas um exportador de ferro, soja e carne, movido por empregos de baixa escolaridade; quer ter um parque industrial amplo e inovador, com uma sociedade mais moderna e civilizada. Como nos tempos do regime militar, o debate econômico no Brasil se limita aos números do PIB, como se o avanço educacional e cultural viesse por inércia. Não vem. É preciso investir não apenas em bolsas sociais, mas em infraestrutura como saneamento e transporte, dois itens essenciais que a maioria não tem como deveria ter. E é preciso fazer o que os chineses já estão fazendo e os coreanos fazem há uma geração: perseguir metas e mudar conteúdos da educação, valorizando a economia criativa e a pesquisa tecnológica. Mas cadê os projetos e cronogramas de Dilma nessas duas áreas fundamentais? Para usar uma canção do seu tempo, "quem sabe faz a hora, não espera acontecer".

Temo que parte dessa paralisia se explique por sua crença de que "o Estado voltou", expressa durante a crise financeira mundial de 2008. Como os governos precisaram socorrer os mercados financeiros, à beira do colapso pela facilidade de conceder empréstimos e hipotecas, muita gente achou também que o intervencionismo estatal seria retomado; li até elogios ao "capitalismo de Estado" chinês, que seria semelhante ao que EUA e Europa tiveram no passado. Nada disso. Agora são os governos que estão reduzindo gastos e impostos de novo, mergulhados em déficits; e o enriquecimento da China só se deu no momento em que ela liberou a iniciativa privada, não o contrário. No caso do Brasil, onde o Estado é carcomido por incompetência e corrupção, a tendência jamais pode ser a de ampliar seu tamanho, e sim a de melhorar suas funções.

Dilma poderia ler O Mundo em Queda Livre, de Joseph Stiglitz, que mostra como hoje cabe ao Estado um papel de regulamentador e indutor, não de controlador e produtor. O mercado não é autossuficiente, como dizem os conservadores (vulgo "neoliberais"); sua soma final não é o reequilíbrio cíclico. O Estado, no entanto, não substitui nem pode emperrar seu dinamismo. Nem Hayek nem Keynes, diz Stiglitz; Estado e mercado não são entidades opostas, nunca foram. Se o governo Dilma continuar a pensar que seu trabalho é apenas estimular o consumo e adotar políticas compensatórias, acreditando que o BNDES e o fluxo de dólares podem dar conta de todos os investimentos necessários, pagará um preço cedo ou tarde. Tirar peso do Estado das forças produtivas e melhorar sua eficiência na formação educacional são a chave para sair do vergonhoso lugar que o Brasil ainda ocupa no ranking do IDH. A hora é agora.

De la musique. Finalmente escutei dois CDs muito elogiados no ano passado, Flor de Fogo, de Chico Pinheiro, e Feito pra Acabar, de Marcelo Jeneci. O de Jeneci realmente fez jus ao nome e logo se esgotou nas lojas. Mas o de Chico Pinheiro é melhor. A questão é que Jeneci faz canções melodiosas, beirando o água com açúcar, com refrões que colam - e a faixa-título, por exemplo, já se tornou um hit. Pinheiro, que é um baita violonista, não faz hits e sua voz não é tão boa, tal como acontece com Guinga, mas suas músicas com letras de Paulo César Pinheiro, como Boca de Siri, são admiráveis.

Por que não me ufano (1). Foi muito divertido ler as matérias sobre a mudança dos signos astrológicos. Cientes de que muitas pessoas leem horóscopo todo dia e boa parte delas o leva a sério, as publicações abriram grande espaço para o assunto e, mesmo quando pretenderam mostrar sua inconsistência científica, acabaram apenas confirmando a repercussão do tema. Até parece que só agora se sabe que o céu é bastante diferente daquele usado em mapas astrais... E era óbvio que os profissionais da área teriam "explicações" para isso, pois a mudança já estaria prevista, etc. e tal. O ponto que escapou é o seguinte: o que as pessoas não suportam não é que a natureza não tenha "mistérios", pois ela os tem, da flutuação quântica à consciência humana; é que esses "mistérios" não sirvam para orientar sua vida, para servir de guia moral, para ter um uso cotidiano. Esses segredos só podem ser mágicos, ou seja, ter algum efeito invisível e direto sobre nosso comportamento e nosso destino.

Em outras palavras, as pessoas não vão à astrologia em busca de conhecimento, mas de consolo. Ela fornece receitas e desculpas fáceis: se eu fizer isto, os astros me ajudarão; se não conseguir, é porque não sou assim. Acho engraçado quando descrevem o comportamento típico de um signo e, diante da observação de que duas pessoas do mesmo signo são completamente opostas, justificam que é por causa do ascendente. Então devo ler no horóscopo diário apenas o conselho dado ao meu ascendente? Ou devo fazer uma interpretação combinada dele com o do signo? Considerando que esses textos são os mais vagos e banais possíveis, deduzo que essa combinação vai ser aquela que se encaixar melhor nos meus desejos ou medos. Já prevejo os emails que receberei me dizendo que só com um mapa astral é possível ter essas respostas. Mas o que nunca vão entender é que uma pessoa não esteja buscando essas respostas.

Por que não me ufano (2). Já escrevi aqui que não dá para levar o Brasil a sério enquanto os bancos cobrarem juros de mais de 12% ao mês no cartão de crédito, ou seja, mais que a taxa Selic anual. E que achar que aumentar o porcentual de pagamento mínimo vai reduzir a inadimplência é ingênuo, porque no segundo mês ele já sobe automaticamente de 10% para 50% e joga o cliente numa roda sem fim. O que eu não sabia é que os bancos aceitam parcelar o débito com juros menores (então por que já não usam essa taxa na fatura?) e não aceitam quitação do débito total com desconto, o que fere direitos do consumidor. Parecem desejar que o cliente seja um devedor eterno. Reclamam, porém, que os impostos e a inadimplência são as causas dos juros de agiota. Que tal inverter o raciocínio? A inadimplência é alta porque os juros são altos, não o contrário. É por isso que mais da metade dos brasileiros está pendurada em cheques especiais e cartões de crédito. Enquanto isso, governo e economistas ficam discutindo o valor da Selic. Na vida real, o buraco é bem maior...

LYA LUFT

O que sentimos na desgraça
LYA LUFT
REVISTA VEJA


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FERREIRA GULLAR

Como cego em tiroteio
FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SÃO PAULO - 30/01/11

Muitos juristas insistem na complacência que favorece o criminoso e fere o direito dos cidadãos
EM BOA hora, o ministro da Justiça demitiu o novo secretário nacional de Políticas sobre Drogas, que mal assumira propôs acabar com a pena de prisão para o pequeno traficante. A ideia era trocar a prisão por penas alternativas e assim evitar que ele seja aliciado pelo crime organizado dentro das penitenciárias. Ou seja, se não for preso, para de traficar. Você acredita nisso? Sou a favor de penas alternativas para autores de delitos menores e, sobretudo, quando não significam ameaça grave à sociedade. Não há por que meter na cadeia o sujeito que deu desfalque ou o autor de pequenas burlas no fisco. A prisão se torna indispensável para o homicida, o estuprador, o assaltante. No entanto, com frequência, se sabe de estupradores e homicidas que voltam a atacar graças a privilégios que a lei lhes concede, como o de passar o Natal com a família. Eles saem da cadeia, não retornam e voltam a estuprar e matar.
Há muita coisa errada na aplicação da justiça no Brasil. Todo mundo sabe disso. Mas muitos juristas insistem na complacência que favorece o criminoso e fere o direito dos cidadãos. Um ministro da Justiça chegou a propor a revogação da lei que pune o crime hediondo, alegando que como não reduzira esse tipo de crime, mostrou-se dispensável. Esse é o mesmo raciocínio com que se pretende pôr fim à repressão ao tráfico de droga, sob o pretexto de que, apesar dela, o tráfico cresceu.
Mas paremos para refletir: não faz séculos que a sociedade pune criminosos? Não obstante, a criminalidade continua a crescer. Devemos, então, acabar com a Justiça e todo o aparato policial, uma vez que se mostraram incapazes de reduzir o crime? Essa é uma conclusão simplista, que ignora as inúmeras causas da criminalidade. Se o comércio de drogas tem aumentado, apesar da repressão aos traficantes, é que estes contam com a colaboração preciosa de centenas de milhares de consumidores de drogas. Entre estes estão desde os garotos de escola, os adolescentes das favelas até gente bem posta na vida, como executivos, artistas, esportistas etc. O que explica o aumento do consumo de drogas, mais que a ineficiência da repressão, é a adesão crescente de pessoas de todas as classes sociais. Basta raciocinar, honestamente, sem sofismas: quando o comércio de automóveis aumenta é porque aumentou o número de compradores de automóveis. A solução do problema do tráfico está na redução do número de consumidores de drogas. E isso só se conseguirá promovendo uma ampla campanha de esclarecimento (entre outras medidas) em nível nacional e internacional, a fim de que os jovens entendam o que a droga tem de destrutivo e nefasto. Se se conseguir reduzir o consumo, reduzir-se-á consequentemente a produção e o tráfico.
No entanto, não vejo quase ninguém preocupado com isso. Raramente li ou ouvi declarações de autoridades ou militantes nesse campo que considerem a redução do número de consumidores a medida prioritária para combater o tráfico de drogas.
Em vez disso, defende-se a descriminalização das drogas e a não punição dos consumidores, que seriam, todos eles, vítimas patológicas do vício e, como tais, devem ser tratados e não punidos. Na verdade, do mesmo modo que a maioria dos consumidores de bebidas alcoólicas não é alcoólatra, a maioria dos consumidores de drogas as consume socialmente. Desse modo, pensando ajudar os que são de fato vítimas, livra-se da repressão a grande maioria dos que consomem drogas socialmente e mantêm o mercado do tráfico.
Como se isso não bastasse, surgiu agora essa nova proposta tão ou mais desastrada que aquela: livrar de prisão o pequeno traficante, que logo contou com a adesão de especialistas nesse assunto. Um deles chegou a afirmar que quem a isso se opõe é "moralista", como se consumir drogas fosse uma conquista ética e combatê-las, um retrocesso moral. A alegação de que o pequeno traficante, se preso, será aliciado pelo crime organizado, não tem cabimento, uma vez que, se ele foi preso, é porque já traficava. Trocar a prisão por trabalho comunitário seria ampliar sua área de atuação, agora sob proteção oficial.

CELSO MING

Espigas chochas
Celso Ming 
O Estado de S.Paulo

Desde José do Egito os dirigentes políticos tratam de garantir suprimentos de grãos para a população.

E foi quando tratava de abastecer Roma com carregamentos de trigo que Pompeu, o Grande, proferiu uma frase que se tornou lema de inúmeras companhias de navegação: "Navegar é preciso, viver não é preciso", ordenou ele ao capitão de seus navios que insistia em permanecer no porto para não ter de enfrentar uma tempestade.

O presidente da França, Nicolas Sarkozy, prepara-se para assumir a presidência rotativa do Grupo dos 20 (G-20) e avisou reiteradas vezes, a última delas em sua participação no Fórum Econômico Mundial realizado essa semana em Davos (Suíça), que vai propor a criação de um sistema global de estoques reguladores de alimentos. Ele acha que a disparada dos preços das commodities está colocando em risco a segurança alimentar da humanidade.

Há razões para desconfiar de que Sarkozy quer apenas montar um esquema que aumente os subsídios agrícolas na França e em toda União Europeia, e, nessas condições, recuperar a boa vontade do eleitor.

Estoques reguladores podem funcionar dentro de um determinado país quando se trata de reduzir as perdas provenientes de quebras de safra. Mas não fazem sentido em escala global.

Também desde José do Egito sabemos que há períodos de espigas cheias e vacas gordas sucedidos por períodos de espigas chochas e vacas magras. No entanto, em escala mundial, quando há um ano de seca em um continente, há ano de boas chuvas em outra parte. A produção mundial tende a se compensar reciprocamente.

A atual escalada dos preços (veja o Confira) apenas em parte se deve a quebras de safra, como é o caso do trigo, cuja cultura foi duramente atingida em 2010 pela seca na Ucrânia, um dos grandes produtores. Para Sarkozy, o principal fator de alta é a especulação financeira no mercado de derivativos. Segunda-feira, criticara a versão preliminar de um relatório da União Europeia que concluiu que a especulação global na área é irrelevante. Sarkozy recomendou que o documento fosse publicado no Dia da Mentira, ou seja, em 1.º de abril. Ele parece ter interesse em que se eleja a especulação como responsável por tudo porque também defende a criação de um imposto mundial sobre transações financeiras (uma espécie de CPMF global), aparentemente porque quer contar com mais dinheiro na mão.

É difícil escapar do diagnóstico de que o principal acelerador dos preços é mesmo o aumento do consumo, especialmente pela população asiática, cujo poder aquisitivo cresce rapidamente. Além de mais demanda para alimentação, cada vez maior volume de grãos está sendo canalizado para a ração animal e para a produção de etanol, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.

A criação de um sistema global de formação de estoques reguladores tenderia a novas distorções. Os preços subiriam ainda mais porque, além de atender ao consumo crescente, seria preciso canalizar a produção para os armazéns.

Além disso, o simples crescimento dos estoques seria fator de derrubada de preços e, portanto, de desestímulo da produção, especialmente em países de produtividade mais baixa. Aparentemente, Sarkozy está forçando esse projeto para reforçar o orçamento de subsídios do Plano Agrícola Comum (PAC), da União Europeia, e compensar com novas jogadas a mediocridade de seu governo.

GOSTOSA

JOSÉ SIMÃO

Ueba!Fagundes engoliu melancia!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 30/01/11

E a definição definitiva do Berlusconi: um Paulo Maluf pornô! Possuído pelo demônio da Prostituição
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Oba! Tá todo mundo louco. "Prefeito de Duartina morde morador que deve IPTU".
Prefeito pitbull. Tá certo, todo imposto é uma mordida. E já imaginou se a moda pega. Já imaginou levar uma mordida do Kassab? Mordida de capivara d'água! "Tataranetas do Tiradentes vão pedir pensão pro governo". É a farra das pensões vitalícias. Eu também quero. Sou heptatritetrabisneto de Adão. E filho de Deus! Deus é um ilustre brasileiro. Qualquer R$ 25 mil tá bom. E bisneto de Lampião? E olha a placa que eu vi na Bahia: "ALUGO MINHA SOGRA PARA O CARNAVAL". Rarará!
E o chargista Zedassilva mostra a Tabela do Lula. Palestras, R$ 200 mil. Aparecer em Palanque, R$ 100 mil. Contar piada em churrasco, 50 real. Rarará!
E a definição definitiva do Berlusconi: um Paulo Maluf pornô! E um evangélico me disse que o Berlusconi tá possuído pelo demônio da Prostituição! O Berluscome Todas! E uma amiga me disse: "Tô preocupada, o Lázaro Ramos e o Berlusconi não me comeram". Então é a única. Rarará!
E o Fagundes? Adoro a trajetória novelística do Fagundes; Foi Dono do Mundo e quebrou, foi Rei do Gado e faliu, foi caminhoneiro e rodou, virou chefe de favela e agora levou um chifre. Do tamanho da Torre Eiffel! O Insensato Chifrudão! O chifre é próprio da novela, o boi usa de intrometido. E como disse um amigo: "O problema não é o chifre, é aguentar os comentários". Novela das 6: chifre. Novela das 7: chifre. Novela das 9: chifre. A Globo é chifruda!
E uma leitora não tá gostando do barrigão do Fagundes: "Eu acho que ele comeu a Mulher Melancia, e não foi no bom sentido". Foi no sentido errado: engoliu a Mulher e a Melancia!
O Brasileiro é Cordial! Olha a placa do Gervásio na empresa em São Bernardo: "Se eu descobrir quem foi o tarado que ligou 3 vezes no mês passado para o telessexo, vou fazer o garanhão da madrugada vestir o uniforme da copeira e sentar numa doce garrafa pet de dois litros. Conto com todos. Assinado: Gervásio". O Gervásio devia ser secretário-geral da ONU. Ou então abrir um centro de treinamento pra receber turistas na Copa de 2014. Rarará.
E adorei o nome daquele personal trainer: Marco Antonio PANSA! Rarará! A situação está ficando psicodélica. Nóis sofre mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

GAUDÊNCIO TORQUATO

Descontinuar continuando
Gaudêncio Torquato
O ESTADO DE SÃO PAULO - 30/01/11

Continuar ou descontinuar? Essa tem sido recorrente questão sempre que novos governantes começam a gestão. Este jornal mostrou, na terça-feira, que a sucessão nos governos dos Estados interrompe programas, altera ênfases administrativas, impõe novos rótulos, sendo a descontinuidade a marca não apenas de opositores que ganharam o pleito, como Siqueira Campos (PSDB), que decidiu eliminar da fisionomia pública do Tocantins todos os traços do antecessor, Carlos Gaguim (PMDB), mas de correligionários, como é o caso, em São Paulo, do tucano Geraldo Alckmin, que ordenou a revisão de contratos do ex-governador José Serra. A descontinuidade, vale dizer, é um fenômeno natural do regime democrático, na medida em que ele ganha oxigênio com rodízios no comando de poder e, por conseguinte, com a adoção de abordagens diferentes nas administrações federal, estadual e municipal. A tese seria inquestionável se a descontinuidade abrigasse mudança de programas ineficazes e continuidade de ações positivas e aprovadas pelas comunidades. No caso brasileiro, porém, o verbo descontinuar significa apagar vestígios da gestão anterior e colocar em seu lugar a moldura do governo seguinte.

Se a estratégia objetiva elevar os perfis de novos governantes, e não a modernização de processos ou mesmo a calibragem de programas já existentes, a conclusão é de que, no País, a expectativa de mudança fica só na promessa. A descontinuidade administrativa, aqui entendida como retorno ao ponto de partida, adquire o paradoxal significado de continuísmo. Expliquemos: os governantes que se sucedem promovem mudanças de forma, mas não de fundo, consolidando o jogo de soma zero: o ganho de um é a perda de outro, o que o anterior faz o posterior anula. A alternância do poder não significa, nesse caso, a mudança de valores e padrões de comportamento tradicionais, a racionalização das estruturas, a criação de ações e programas voltados para a melhoria do bem-estar coletivo, a substituição de critérios políticos por parâmetros de desempenho e a distribuição mais equitativa de recursos materiais e simbólicos. Em suma, o campo das reformas clamadas pela coletividade é substituído pelo território das conveniências pessoais. A dinâmica, apontada como atributo do rodízio de poder, submete-se à estática (e estética) condizente com a glorificação dos mandatários. Ora, esse custo alto que a democracia paga acaba corroendo parcela das riquezas de uma nação.

Imaginemos, por exemplo, se a política urbana e de meio ambiente fosse uma linha contínua, sempre avançando na régua dos governos, desde os idos de 1985, quando foi criado o Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio Ambiente. Veríamos, hoje, as tragédias e catástrofes que assolam a vida nacional? Pouco provável. O fato é que o esforço de coordenação das políticas urbana e ambiental, que se enxergava naquela pasta, fragmentou-se ao longo das administrações, a partir de 1989, quando suas atribuições se repartiram em quatro Ministérios. Criaram-se, desde então, diversos órgãos que se foram acomodando aos novos comandos ministeriais. A divisão de programas e espaços foi se amoldando aos interesses partidários, na esteira da complexidade que a política vem adquirindo nos últimos anos. O efeito sanfona - vai e vem - dos formatos ministeriais contribui, sobremaneira, para "a filosofia das novas soluções" que os gestores públicos expõem quando iniciam sua jornada. Nas novas planilhas, prioridades são afastadas; nomes de programas ganham rotulação criativa, atendendo aos parâmetros do Estado da fosforescência e novas ênfases são arrumadas. Como a vasta seara social é a que rende mais frutos na colheita eleitoral, é em torno dela que se processam as mais fortes ações de (des)continuidade. Programas assistencialistas, e de evidente viés populista, passam a ser a "bola da vez" em todos os recantos. Para coroar a festança os governantes, com a maior cara de pau, pegam carona no velho refrão: "É melhor ensinar a pescar que dar o peixe".

Parte da aguerrida estratégia da descontinuidade que descamba no continuísmo de métodos convoca ao palco de guerra políticos e burocratas, estes querendo avocar domínio do conhecimento técnico, aqueles erguendo a bandeira da vitória nas urnas. Mais uma vez, os efeitos são deletérios: mudança de rumos nas ações de governo, desestímulo de equipes, tensão nos ambientes, animosidade e chantagens. Diante dessa radiografia cheia de furos, a pergunta é: como atenuar os rombos do custo Brasil do desperdício decorrente da descontinuidade? Sementes de racionalidade, felizmente, começam a florescer. A começar pela defesa intransigente da ideia de que territórios que exijam intensa e insubstituível identidade técnica sejam administrados por perfis condizentes com seu escopo. Outro caminho que pode servir para contornar os obstáculos é a própria democracia participativa. Um corpo de representantes da comunidade - escolhidos no seio de entidades respeitadas da sociedade civil - poderia apontar os programas que devem ser continuados e as ações que precisam ganhar nova rota. A parceria entre União e Estados, resultando em programas integrados, também se apresenta como alternativa para evitar os estragos de desgovernos.

Não existe, porém, melhor baliza para os governantes que o bom senso. E não é difícil saber onde está o bom senso em matéria de administração pública. É só tentar descobrir o que é novo e o que é obsoleto. O que vou fazer é algo efetivamente inovador ou essa ideia é coisa desgastada?

Srs. governantes, meditem sobre a pergunta. Jorge Luis Borges escreveu: "Somos nossa memória, somos esse quimérico museu de formas inconstantes, essa pilha de espelhos rotos". Pois bem, olhem para esses espelhos. Mesmo rotos, eles poderão mostrar aos governantes de boa vontade uma aurora brilhante na administração.

JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP, CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO

GOSTOSA

SERGIO FAUSTO

Impressões iniciais
Sergio Fausto 
O ESTADO DE SÃO PAULO - 30/01/11

A esta altura não é possível ter mais do que impressões a respeito do governo Dilma Rousseff. E elas não são ruins. Em especial por uma ausência notável: Lula. Sinto-me como quem se recupera de uma intoxicação alimentar depois de se ver forçado a engolir quantidades excessivas de uma comida de qualidade duvidosa. O silêncio inicial de Dilma é a bem-vinda dieta de chá com maçã raspada.

O ex-presidente merece reconhecimento. Em seu primeiro mandato deu respaldo político firme à política econômica não petista da dupla Palocci e Meirelles, protegendo-a do intenso "fogo amigo" disparado pelo PT, de fora e de dentro do governo.

Tivesse sido diferente, o panorama econômico seria outro, e pior. Também importante foi a substituição do Fome Zero, bandeira da campanha eleitoral, pelo Bolsa-Família. O primeiro trazia a marca da esquerda cristã, remanescente das origens do PT, e padecia de problemas conceituais e operacionais graves. Já o segundo faz parte da família de programas de transferência de renda que se espalharam na América Latina a partir dos anos 1990, sob os auspícios do Banco Mundial e do BID.

Não são uma panaceia, mas se mostraram razoavelmente bem-sucedidos na mitigação da pobreza. Mais uma prova de que o presidente não se deixou prender por dogmas ideológicos de seu partido.

No segundo mandato, porém, inebriado pelo sucesso, Lula desandou a dizer disparates (muitos e em quantidades cada vez maiores) e a cometer equívocos. Na política externa, o maior de todos foi a aproximação política com o Irã e o desastrado acordo que supostamente daria solução alternativa à imposição de sanções àquele país pelo Conselho de Segurança da ONU. Lula ergueu o braço de Ahmadinejad em Teerã, para no dia seguinte assistir aos Estados Unidos rechaçarem o acordo, com o apoio da China e da Rússia, que o ex-presidente ingenuamente imaginou atrair para a posição brasileira. Tratou-se de uma aventura em que Lula se deixou levar pelos maus conselhos de seu chanceler e pela imensidão de seu ego.

Lula fechou o segundo mandato com chave de ouro. Disse ser "gostoso" ver Europa e Estados Unidos em crise, enquanto o Brasil acelera o crescimento. E sentenciou que com ele "acabou esse negócio de governar só para um terço do País", em encontro com representantes do movimento sindical e movimentos sociais vinculados ao governo. Provocação tola no primeiro caso. Pura lorota - mais uma - no segundo.

Há explicação, embora não haja justificativa, para o comentário sobre a Europa e os Estados Unidos. Lula sentiu-se traído por Barack Obama no episódio que culminou no malfadado acordo em Teerã. Com o ego ferido pelo fracasso em cena pública, reagiu de maneira descabida.

Já a segunda afirmação, sobre o modo Lula de governar, revela a tendência do ex-presidente a mistificar a si próprio e distorcer a História do País em seu benefício. Para repor a verdade dos fatos não custa perguntar: terá o Plano Real beneficiado apenas o terço mais rico da população? E a privatização das telecomunicações, que universalizou o acesso aos celulares e hoje permite almejar a universalização da banda larga? E a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), que tornou viável o acesso de quase 100% das crianças entre 7 e 14 anos à escola? E a Lei de Responsabilidade Fiscal, que protege o País da propensão nacional ao descontrole das contas públicas? Nenhuma dessas medidas foi tomada no governo Lula. Todas elas sofreram a oposição do PT e do ex-presidente.

Por contraste, é bom ver Dilma em exercício, mais ocupada em bem administrar o País do que em animar permanentemente o distinto público de um imaginário auditório. Uma presidente que cumpre a sua agenda de trabalho, com disciplina e empenho, e parece de fato preocupada em assegurar o maior número possível de nomeações pautadas pela competência, e não apenas por indicação política. Não é fácil, sob a avalanche de pressões partidárias por cargos na máquina estatal.

Até quando veremos essa cena que degrada a atividade política e compromete a qualidade dos serviços prestados pelo Estado à população? Até quando barões e anões do atraso terão tanto peso na política brasileira, a ponto de obterem Ministérios e controlarem estatais importantes?

Fosse o problema apenas residual - o lento declínio de oligarquias regionais -, haveria menos razão para exasperação. Mas o descenso das oligarquias regionais em nada garante a melhoria da representação política. Temos assistido cada vez mais à emergência de novos personagens a operar a política como negócio. Dessa perspectiva, o PMDB apresenta um fascinante campo de observação, pela mistura de "velhos oligarcas" e "novos operadores", cada qual ou cada grupo jogando seu jogo. Já no PT a lógica é partidária, mesmo quando o veículo são os sindicatos.

Quando vejo no Ministério de Dilma quadros políticos como José Eduardo Cardozo, Fernando Pimentel e Antônio Palocci não consigo evitar a sensação de que em algum momento da história da redemocratização brasileira se deu um "desvio" que desafortunadamente empurrou o que de melhor há no PSDB e no PT para campos opostos, piorando a qualidade de cada um e colocando ambos os partidos na contingência de pagar um tributo excessivo para governar o País. Que haja dois partidos de maior conteúdo programático, distintos e competitivos entre si, é ótimo para o Brasil. Que essa polarização impeça o diálogo substantivo em torno de políticas e reformas que atendam ao interesse público é uma lástima de graves consequências para o País.

Tomara que esse estado de coisas se altere, juntamente com o afastamento de Lula do centro da arena política. Ninguém jogou mais contra o diálogo e a favor da estigmatização do que ele e José Dirceu.

Será ingenuidade acreditar nessa possibilidade?

DIRETOR EXECUTIVO DO iFHC, É MEMBRO DO GACINT-USP.

VIVIAN OSWALD e FÁBIO FABRINI

A "canelada" e o dinheiro público
Vivian Oswald e Fábio Fabrini
O GLOBO - 30/01/11


Faltam verbas para programas essenciais, mas sobram para fazer prédios suntuosos

Sem dinheiro para instalar um sistema de alerta contra chuvas e antevendo cortes até no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o país vive uma temporada de contradições orçamentárias que favorecem a elite do funcionalismo público nos três poderes. Embora tenha faltado verba para aplicar R$115 milhões em radares meteorológicos nos últimos dois anos, instalar varas federais no interior e melhorar a qualidade da saúde pública, entre outras prioridades, será pago R$1,2 bilhão só para construir ou alugar suntuosos prédios para órgãos como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Polícia Federal, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e o Ministério da Cultura.

Na lista das despesas miúdas dos mais diversos órgãos, que também oneram as contas públicas, entram de latas de cerveja, chicletes de menta, bolas de futebol e até evento para afugentar o estresse de servidores.

O Orçamento da União, que em 2011 alcança R$1,394 trilhão, na prática só pode dispor de 10% para gastos que não sejam obrigatórios. O restante já está comprometido com a folha de pagamentos dos servidores, aposentadorias e programas assistenciais, além dos repasses obrigatórios, previstos na Constituição, para bancar Saúde e Educação. É, portanto, numa margem mínima de manobra que concorrem projetos faraônicos, de prioridade questionável, ao lado de investimentos indispensáveis para a população.

- É uma briga muito acirrada, mas de cachorro pequeno. Infelizmente, não há garantia de que seja racional. É a lei da canelada: ganha o mais forte, quem tiver mais poder político - resume o especialista em contas públicas Raul Velloso.

Aluguel, mesmo com prédio cedido

Na queda de braço entre os diversos órgãos da máquina federal, o Ministério da Ciência e Tecnologia bem que tentou, mas não conseguiu emplacar seu plano de radares para monitorar as chuvas, como revelou o secretário demissionário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento, Luiz Antônio Barreto de Castro. Por outro lado, sobrou dinheiro para a Anac se dar ao luxo de gastar R$76,2 milhões com o aluguel de um prédio inteiro em Brasília, mais despesas de condomínio, por cinco anos, quando poderia ocupar, de graça, imóvel cedido pela Infraero.

O BNDES vai gastar, até 2015, R$310 milhões para ocupar 23 andares em um edifício próximo à sua sede no Rio, que está em reforma. O argumento é que o orçamento cresceu, e a estrutura, criada há 30 anos para 1,7 mil funcionários, hoje reúne 2,6 mil. Já o Ministério da Cultura desembolsará R$90,3 milhões no mesmo período para locar oito andares em Brasília. Uma parte ficou desocupada por meses, mesmo após assinados os contratos.

Depois de reformar completamente seu prédio na capital federal, o imponente "Máscara Negra", a PF trabalha no projeto executivo de um novo espigão, a ser erguido no Setor de Autarquias Norte, cujo custo estimado, por baixo, é de R$250 milhões.

A máxima "fazer mais com menos", lançada pela presidente Dilma Rousseff, vale há anos para o Ministério da Integração Nacional. De 2004 a 2010, dos R$2,3 bilhões previstos para o Programa de Prevenção e Preparação para Desastres Naturais, foram gastos R$540 milhões (menos de um quarto).

A despeito dos gargalos e das deficiências de atendimento no Judiciário, o TSE vive um momento à parte: empenhou (comprometeu-se a pagar) R$458 milhões para a obra de sua nova sede em Brasília, com previsão de entrega no segundo semestre e que já estourou o orçamento.

Em outro braço do Judiciário, a Justiça Federal tenta, há décadas, reduzir o déficit de varas de primeira instância país afora, mas os recursos nunca são suficientes para suprir a crescente demanda. Embora sejam verbas de órgãos distintos, os gastos da obra do TSE cobririam a instalação e o funcionamento por um ano de 412 dessas varas.

Especialistas dizem que o Executivo tem pouco a fazer quando os recursos são repassados a outros poderes. E reconhecem que, enquanto alguns órgãos do governo vivem à míngua, outros não têm capacidade de gastar tudo o que receberam.

- A distribuição é só política. Não há espaço para planejamento. É como um orçamento familiar enxuto: como o dinheiro é pouco para todos, o pai dá a parte de cada dependente e diz: "toma e se vira" - compara Velloso.

As grandes contradições da execução orçamentária somam-se a gastos de pequena monta, por vezes inusitados, que oneram os cofres públicos. Nas despesas de custeio dos diversos órgãos, entra de tudo. Por R$1.224, por exemplo, o 4º Batalhão de Infantaria de Selva em Rio Branco (AC) comprou 1,2 mil latas de cerveja em 2010. No ano anterior, o contribuinte pagou a conta de 720 latas de cerveja para o Comando da 12ª Região Militar em Manaus (AM): R$2.185.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pagou cerca de R$30 mil à empresa de representação que cuidou, em 2007, do evento para gerenciar o estresse de seus funcionários. Já o Supremo Tribunal Federal (STF) desembolsou valor semelhante por 6,5 mil calendários em 2010 e 2011.

Por R$7,9 mil, os freezeres do Gabinete do comandante da Aeronáutica se encheram de 110 quilos de filé de salmão, 110 de filé de robalo, 85 de filé de badejo e 85 de filé de linguado em 2008. De sobremesa, 70 caixas de bombons sortidos. Na lista da Base de Lançamentos de Alcântara, em 2008, ração, vinho e chicletes de menta.

Consultados, o Exército e a Aeronáutica informaram que só a partir de segunda-feira vão poder explicar as compras. O STJ alegou que o estresse é motivo de afastamento de pessoal, o que justifica os eventos. O Supremo, embora questionado, não se pronunciou.

GOSTOSA

ELIANE CANTANHÊDE

Uma presidente, vários incêndios
Eliane Cantanhêde
FOLHA DE SÃO PAULO - 30/01/11

Dilma Rousseff enfrenta nesta semana sua primeira viagem internacional, a reabertura do Congresso e o reinício do Supremo, tudo com a crise no Egito -ou seria no mundo árabe?

Na Argentina, Dilma acertará com Cristina Kirchner a construção de um reator nuclear bilateral para fins civis e terá momentos de grande simbologia ao se encontrar com as Mães da Praça de Maio, dias depois de comparar vítimas de ditaduras a vítimas do Holocausto. Ou seja: vai sinalizar que seu governo dará passos firmes para investigar crimes do regime militar.

No Congresso, onde o salário mínimo será seu grande teste, o problema não são as oposições, desunidas e desnutridas, mas sim os próprios aliados, também desunidos, mas muito bem alimentados e ainda assim famintos. A guerra PT-PMDB foi devidamente resumida pelo peemedebista Eduardo Cunha: "Quem com ferro fere com ferro será ferido". Leia-se: é guerra!

No Supremo, a grande questão em pauta é a extradição ou não do ex-terrorista Cesare Battisti para a Itália. Lula disse não, mas parte dos ministros considera que o tratado Brasil-Itália não dá poderes discricionários aos presidentes.

Por esse entendimento, o Supremo é quem decide, e a Lula cabia apenas dizer quando e como Battisti seria entregue. O primeiro-ministro Silvio Berlusconi (sim, esse mesmo) não dá tanta bola para o assunto, mas o presidente Giorgio Napolitano mantém a pressão.

E a cúpula América do Sul-países árabes vem aí, dia 16, em Lima, com as ditaduras árabes tremendo nas bases e o Brasil tentando fingir que não tem nada a ver com isso. Ou seja, em cima do muro. Até lá, pode ser compelido -até pela comunidade internacional- a descer para o lado de Mubarak ou da oposição. E lá se vai a cúpula peruana.

Viver não é fácil. Governar é pior ainda. Mas Dilma sabia muito bem onde estava se metendo. Ou melhor, onde Lula a estava metendo.

DORA KRAMER

Fato irrelevante
Dora Kramer
O ESTADO DE SÃO PAULO - 30/01/11

Terça-feira toma posse o Congresso eleito em 2010, que no mesmo dia elege os presidentes da Câmara e do Senado para os próximos dois anos, sem que a sociedade possa reconhecer a mínima relevância no fato nem consiga se identificar com o que ali se discute a respeito do início de uma nova legislatura.

O distanciamento não ocorre por acaso nem é fruto só da alienação de um povo despolitizado, pouco informado, insuficientemente educado: é principalmente produto do comportamento do Parlamento que se aliena da Nação e segue indiferente à gravidade da própria situação de fragilidade e desmoralização.

E qual é o cenário hoje, 48 horas antes da posse e da eleição dos chefes do Poder Legislativo? No Senado, José Sarney eleito por consenso pela quarta vez apesar de todos os conhecidos pesares. Debate, só entre os partidos para a divisão dos cargos na Mesa Diretora.

Na Câmara, a preocupação é que o deputado Sandro Mabel e sua promessa de construir um novo prédio para acomodar os gabinetes das excelências não atrapalhe a eleição do petista Marco Maia, já no cargo desde que substituiu Michel Temer depois da eleição do colega para vice-presidente da República.

Limita-se a isso a discussão, embora seja ampla a agenda necessária. Nenhum partido gasta um minuto com os problemas do Legislativo.

O PSDB, que saiu derrotado da eleição presidencial prometendo fazer e acontecer, no momento polemiza sobre um abaixo-assinado da bancada tucana na Câmara para a recondução de Sérgio Guerra à presidência do partido em detrimento de José Serra. Um monumento à irrelevância. A exceção é o minúsculo PSOL. Sem poder de influir, o partido elaborou um elenco de temas aos quais urgiria o Parlamento se dedicar.

Tem-se, então, que os "grandes" se dedicam a questiúnculas, enquanto o pequeno vai aos pontos.

São eles:

1. Recuperação da atividade legislativa como protagonista do Poder de representação popular;

2. Criação de uma agenda de trabalho para o primeiro semestre, incluindo a reforma política;

3. Fim da submissão ao Executivo, notadamente no que diz respeito às medidas provisórias;

4. Garantias de atuação para as minorias e respeito aos critérios de proporcionalidade;

5. Cumprimento estrito do regimento, sem atropelos de prazos e procedimentos;

6. Fixação definitiva de critérios para a remuneração dos parlamentares e da alta hierarquia dos outros Poderes;
7. Divulgação de todos os gastos, inclusive relativos à verba indenizatória;

8. Facilitação de acesso popular às sessões plenárias e de comissões;

9. Fim da "privatização" dos espaços internos da Câmara;

10. Proibição da posse de suplentes no recesso parlamentar;

11. Melhoria dos critérios de escolha e funcionamento das empresas prestadoras de serviços; para concluir, a mãe de todas as regras:

12. Rigoroso zelo pela moralidade parlamentar.

A esses podem ser acrescentados outros pontos, como os suplentes de senadores, e ainda não teremos completo rol de temas bem mais relevantes que a renovação de feudos e a consolidação de privilégios corporativos.

Risco zero. Dilma cancelou ida a inauguração de usina por causa de protestos dos ambientalistas. Antes havia cancelado o envio de reformas estruturais do Congresso por causa das dificuldades em aprová-las.

São dois atos distintos; o que os une é o esboço de um estilo avesso a enfrentamentos.

Ainda a serra. Geólogo, Lázaro Zuquette escreve para discordar de que as ocorrências na região serrana do Rio sejam um "case" digno de estudo minucioso. "Qualquer estudante de geologia sabe que a extensão da serra do Mar voltada para o oceano evolui devido aos escorregamentos e processos erosivos".

Cita como exemplo a ocorrência de 15 mil escorregamentos nas serras do Mar e da Mantiqueira entre 2010 e 2011, cuja maioria não atingiu pessoas nem bem e, portanto, não se caracterizaram como desastres.

E conclui: "O que aconteceu foi normal para a área, o anormal é que os administradores autorizam a ocupação urbana na região".

DEVER DE CASA