FOLHA DE SP - 07/08
O leilão do 5G vai atrasar (estava previsto para março de 2020). Segundo a agência reguladora (Anatel), devido às transmissões na faixa de 3,5 GHz, que causariam interferência no sinal de TV aberta captado por antenas parabólicas.
Filtros poderiam solucionar o problema, mas há receio de que encareçam o acesso às antenas. Se for o caso, sempre é possível compensar custos extras por meio da redução de tributos. O que não podemos aceitar é que se empurre com a barriga a chegada da tecnologia 5G.
Além disso, espero que o eventual adiamento nada tenha a ver com as teles, pois, com 5G, as TV por assinatura, via cabo, teriam de enfrentar a concorrência de canais transmitidos pela internet, por meio do celular. O aumento da velocidade propiciado pela tecnologia também facilitaria o consumo de conteúdo via streaming, que hoje já incomoda as TVs pagas.
Não é possível que o atraso digital do país continue, ainda mais agora, que firmamos acordo comercial com a União Europeia. Competição com países desenvolvidos sem educação de alto nível –que não temos– nem infraestrutura tecnológica e de comunicação –precária– seria um convite ao desemprego e ao subemprego.
TV por assinatura é serviço caro, com normas leoninas nos contratos. Somos, por exemplo, obrigados a optar por pacotes repletos de canais que não nos interessam. Além disso, as telecomunicações têm elevada taxação pelos Estados, e há regiões em que é difícil até completar uma ligação telefônica por dispositivo móvel.
As novas tecnologias sempre impactaram fortemente as companhias mais tradicionais. Os apps de transporte e de hospedagem, por exemplo, irritam taxistas e hoteleiros, respectivamente. As operadoras de planos de saúde sentem o peso da concorrência de aplicativos de consultas e exames.
Não há, contudo, motivo para criar barreiras às novas tecnologias e às suas aplicações. Até os poderosos bancos têm de conviver com fintechs, startups que oferecem serviços financeiros digitais.
Pode ser que a tecnologia 5G modifique a forma como assistimos a canais pagos. Mas as teles se adaptariam, sem dúvida, e o consumidor ganharia mais opções, provavelmente com preços mais em conta.
Quanto às antenas parabólicas, muito utilizadas no interior do Brasil, principalmente nas áreas rurais, lembro que também foram necessários conversores em aparelhos analógicos para receber o sinal da TV digital.
Antes que me esqueça, nunca é demais enfatizar: não devemos restringir o escopo das tecnologias de quinta geração por questões políticas, o que seria lesivo ao consumidor. No mundo dos negócios, não há amigos nem inimigos. Todos os países são concorrentes, o que é comprovado pela atual queda de braço entre Estados Unidos e China, provocada por questões comerciais.
Maria Inês Dolci
Advogada especialista em direitos do consumidor, foi coordenadora da Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor)
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