Parafraseando o ex-ministro Roberto Campos, os últimos dias mostraram que o estatismo no Brasil tem “um passado glorioso e um futuro promissor”. Quando finalmente o brasileiro elege um chefe do Poder Executivo que traz consigo uma pauta liberalizante, o Supremo Tribunal Federal se encarrega de desfazer o otimismo – e, pior ainda, mais uma vez inventando regras que os legisladores não tinham a menor intenção de impor ao poder público. Trata-se do julgamento encerrado na quinta-feira, dia 6, envolvendo a necessidade de aval do Poder Legislativo para a realização de privatizações e venda de subsidiárias de empresas estatais. Seu resultado, apesar de destravar no curto prazo os programas de desinvestimento de Petrobras e Eletrobrás, cria um novo obstáculo ao programa de desestatização do governo.
A Constituição Federal é muito clara a respeito dos processos de surgimento de estatais, exigindo, em seu artigo 173, a aprovação do Congresso para que o governo possa, por meio de decreto, criar uma empresa. Mas em nenhum momento a Carta Magna faz essa mesma exigência para que o poder público se desfaça de uma estatal. Não se trata de omissão ou esquecimento, mas de uma decisão consciente do constituinte, baseada no que afirma o mesmíssimo artigo 173: a “exploração direta de atividade econômica” por parte do Estado é uma excepcionalidade, um ponto fora da curva, uma circunstância extraordinária. O normal é que essa função caiba à iniciativa privada. Podemos afirmar, com toda a certeza, que o legislador não quis condicionar uma privatização ao aval do Legislativo, com a exceção dos casos previstos no artigo 177 da Constituição, que trata dos monopólios da União, e daquelas empresas que o Congresso incluiu nominalmente na Lei 9.491/97, que criou o Programa Nacional de Desestatização. Entram nesses critérios, por exemplo, Petrobras, Eletrobrás, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, mas não as suas subsidiárias, e nem a esmagadora maioria das quase 140 estatais federais existentes hoje.
O Supremo mostrou ao investidor que a liberdade econômica continua a ser bem escasso neste país
A clareza do legislador sobre o que é necessário para criar uma estatal e para privatizá-la não foi suficiente para Ricardo Lewandowski, que em 2018 barrou liminarmente a venda de subsidiárias da Eletrobras argumentando que, se era preciso haver lei para criar, também seria preciso haver uma outra lei para vender, ainda que isso não estivesse escrito em nenhum lugar – na prática, o ministro inventou uma regra que o Congresso não estabeleceu, mais uma vez assumindo o papel de legislador no qual tantos membros do STF se sentem confortáveis. Mais recentemente, foi seguido por Edson Fachin, que, em outra liminar, barrou a venda de duas subsidiárias e três refinarias da Petrobras. No julgamento encerrado no dia 6, quem mais se aproximou da linha de Lewandowski e Fachin foi Rosa Weber, que defendeu apenas uma “lei genérica” para a venda de subsidiárias, com processos que garantam a concorrência.
Alexandre de Moraes abriu uma divergência, mas parcial. Para ele, a venda de subsidiárias não exigiria aval legislativo, como defenderam Lewandowski e Fachin, mas a privatização de uma “empresa-mãe” precisaria da autorização do Congresso. Foi acompanhado por Cármen Lúcia, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli, somando nove ministros em defesa da necessidade de autorização para a privatização e seis ministros que votaram para não exigir lei no caso da venda de subsidiárias. Marco Aurélio Mello se pronunciou apenas sobre a questão das subsidiárias, mas referendou a liminar de Lewandowski.
A única voz do bom senso e do respeito à liberdade econômica e aos intenções do legislador foi a de Luís Roberto Barroso, para quem as privatizações – tanto de estatais quanto de subsidiárias – não precisam de nenhuma autorização do Congresso. O ministro defendeu que “para desinvestir, não vale a mesma regra que vale para criar” e ainda classificou como “fetiche” a visão que coloca o Estado como “protagonista de tudo”. Quanto menos uma corte constitucional interferir na ordem econômica, melhor, afirmou. Infelizmente, Barroso ficou sozinho.
A suprema corte pode até ter destravado os programas de desinvestimento de Petrobras e Eletrobrás, mas, ao decidir que toda estatal precisa de autorização do Congresso para ser vendida, o STF condena o país inteiro a continuar bancando empresas deficitárias, que poderiam muito bem ser recuperadas pela iniciativa privada, e coloca o destino do programa de privatizações do governo Bolsonaro na mão de dois tipos de congressistas: aqueles que, por razões ideológicas, alimentam o “fetiche” descrito por Barroso, o do protagonismo estatal na atividade econômica; e aqueles que enxergam as estatais como cabides de empregos onde podem pendurar apadrinhados em cargos de comando, em troca de apoio político, e que por isso resistirão às privatizações por ver nelas o fim de um instrumento de barganha. Uma decisão que já seria desastrosa em tempos de vacas gordas, porque representa uma inversão do saudável princípio da subsidiariedade, se revela ainda mais daninha nesta época de dificuldades fiscais, mostrando ao investidor que a liberdade econômica continua a ser bem escasso neste país.
Alexandre de Moraes abriu uma divergência, mas parcial. Para ele, a venda de subsidiárias não exigiria aval legislativo, como defenderam Lewandowski e Fachin, mas a privatização de uma “empresa-mãe” precisaria da autorização do Congresso. Foi acompanhado por Cármen Lúcia, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli, somando nove ministros em defesa da necessidade de autorização para a privatização e seis ministros que votaram para não exigir lei no caso da venda de subsidiárias. Marco Aurélio Mello se pronunciou apenas sobre a questão das subsidiárias, mas referendou a liminar de Lewandowski.
A única voz do bom senso e do respeito à liberdade econômica e aos intenções do legislador foi a de Luís Roberto Barroso, para quem as privatizações – tanto de estatais quanto de subsidiárias – não precisam de nenhuma autorização do Congresso. O ministro defendeu que “para desinvestir, não vale a mesma regra que vale para criar” e ainda classificou como “fetiche” a visão que coloca o Estado como “protagonista de tudo”. Quanto menos uma corte constitucional interferir na ordem econômica, melhor, afirmou. Infelizmente, Barroso ficou sozinho.
A suprema corte pode até ter destravado os programas de desinvestimento de Petrobras e Eletrobrás, mas, ao decidir que toda estatal precisa de autorização do Congresso para ser vendida, o STF condena o país inteiro a continuar bancando empresas deficitárias, que poderiam muito bem ser recuperadas pela iniciativa privada, e coloca o destino do programa de privatizações do governo Bolsonaro na mão de dois tipos de congressistas: aqueles que, por razões ideológicas, alimentam o “fetiche” descrito por Barroso, o do protagonismo estatal na atividade econômica; e aqueles que enxergam as estatais como cabides de empregos onde podem pendurar apadrinhados em cargos de comando, em troca de apoio político, e que por isso resistirão às privatizações por ver nelas o fim de um instrumento de barganha. Uma decisão que já seria desastrosa em tempos de vacas gordas, porque representa uma inversão do saudável princípio da subsidiariedade, se revela ainda mais daninha nesta época de dificuldades fiscais, mostrando ao investidor que a liberdade econômica continua a ser bem escasso neste país.
Nenhum comentário:
Postar um comentário