Sequência de problemas reduz a crença na capacidade do governo (e de Guedes) de entregar política econômica tão apoiada
Não está errado dizer que a Petrobras perdeu R$ 32,4 bilhões quando o presidente Bolsonaro suspendeu o reajuste de 5,7% que a estatal anunciara para o preço do diesel.
Mais correto, porém, é dizer que os acionistas da Petrobras perderam todo aquele dinheiro. E não foi apenas por causa dos 5,7%.
Ações caem quando há mais investidores vendendo do que comprando os papéis. E quem vende é porque perdeu confiança. Em geral, só os grandes investidores fazem esses movimentos rápidos. Os outros, entre os quais se incluem quase todos os brasileiros que têm alguma poupança, só podem reclamar ou lamentar. Todos, portanto, perdem dinheiro e confiança.
E quem são os acionistas?
O próprio governo federal, por exemplo. O BNDES tem em sua carteira algo como R$ 40 bilhões em papéis da Petrobras. A Caixa, uns R$ 10 bi. Só aí, portanto, o governo perdeu R$ 4,5 bilhões naquele dia (desvalorização dos papéis de uns 9%).
É dinheiro. Ainda nesta semana, o governo disse que o BNDES vai emprestar R$ 500 milhões para os caminhoneiros comprarem pneus. E que vai procurar no orçamento uns R$ 2 bilhões para arrumar rodovias. Acharia ali na carteira de ações.
Claro que as ações podem recuperar valor — se a Petrobras conseguir reaplicar o aumento do diesel ou se descobrir um baita campo de petróleo ou se o preço internacional do óleo subir — mas a desconfiança permanece.
A versão oficial diz que o presidente Bolsonaro não mandou cancelar o reajuste do diesel. Apenas pediu para suspendê-lo porque estava confuso e queria entender melhor o sistema de preços da Petrobras.
Com todos esses anos de jornalismo, a gente sabe desconfiar de uma versão oficial. E também sabe apurar nos bastidores.
Assim, com boa vontade, podemos fazer duas hipóteses. Primeira, o presidente de fato não entendia o sistema de preços da Petrobras e ficou confuso com o aumento. Segunda, entendia perfeitamente e mandou suspender o aumento porque ficou sabendo da bronca dos caminhoneiros.
Em qualquer caso, é complicado, digamos. Esse assunto dos reajustes da Petrobras não é de hoje. Vem de mais de ano, foi discutido na greve dos caminhoneiros (aliás, apoiada por Bolsonaro) e debatido na campanha eleitoral. Como o presidente poderia não saber?
E se sabia, mandou cancelar o reajuste para, ouvindo as ruas, como disse Paulo Guedes, atender à reivindicação dos caminhoneiros. O que significa que a política econômica liberal tem limites. Até onde?
Tem uma terceira questão: será que o presidente nem desconfiava das consequências de seu ato, a enorme perda de valor da Petrobras?
Acrescente-se ao cenário a confusão na tramitação da reforma da Previdência. Claro que não é um problema grave que a votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara tenha sido adiada para a próxima terça-feira. Mas, caramba, como os líderes governistas não conseguem administrar uma votação que não é das mais difíceis?
Tudo considerado, as expectativas estão piorando. Estavam bastante elevadas logo após a eleição de Bolsonaro e subiram ainda mais quando se formou a equipe de Paulo Guedes. Mais ainda com as juras de reformas macro e micro e privatizações em massa, além de autonomia das estatais e agências.
Aí surgem os “pequenos” problemas. Algumas péssimas escolhas ministeriais, brigalhada dentro do governo, lideranças ineficientes no Congresso, caneladas nos políticos, os da velha e da nova, ataques a Rodrigo Maia, o grande defensor das reformas econômicas, o caso Petrobras, as derrotas na Câmara.
Tudo coisa que pode ser consertada, mas a sequência certamente reduz a crença na capacidade do governo (e de Guedes) de entregar a política econômica tão apoiada.
Não é por acaso que as expectativas de crescimento para este ano são cada vez menores.
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