Previsão sugere que governo vai parar se não der 'tudo certo'
Quem lê as previsões de receita e despesa do governo federal nos próximos anos até 2022 conclui que o país está a caminho de alguma explosão, talvez várias.
Se não passar uma reforma da Previdência integral e, de quebra, se não entrar um dinheiro grosso extra, muitas das poucas obras restantes e partes da administração pública vão parar em 2021, quem sabe antes. O gasto discricionário, aquele que o governo está “livre” para fazer ou não, o que inclui investimento em obras, cairia uns 45% do realizado em 2018 até o estimado para 2022. O governo para.
Não chega a ser grande novidade, mas o roteiro do desastre está documentado no aparentemente burocrático “Anexo 4.1, de Metas Fiscais Anuais”, do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020,enviado nesta semana ao Congresso.
Primeiro alerta: na projeção do “Anexo 4.1”, a receita líquida do governo federal cai a partir deste ano e sem parar até 2022, como proporção do PIB. Isto é, a receita cresceria ainda menos do que a economia. É uma estimativa conservadora, no sentido de não ser otimista, o que em geral é conveniente quando se faz um Orçamento. Mas os motivos para o conservadorismo da projeção não tranquilizam ninguém.
“No atual momento ... observa-se um cenário em que a recuperação da arrecadação está atrelada fundamentalmente ao crescimento da economia, haja vista não se vislumbrar, nas projeções até 2022, retomada de medidas não recorrentes como as utilizadas no passado recente”. Isto é dinheiro de repatriação de capital que fugiu de maneira ilegal e de vários “Refis” (dívidas tributárias refinanciadas) ou receitas de concessões e dinheiro extra com royalties de petróleo e gás, por exemplo.
Alguém pode dizer que algum tutu de concessões entrará. O pessoal do governo preferiu não arriscar um valor.
Algum crescimento de despesa será contido com alguma reforma da Previdência, sabe-se lá quanto. No máximo, os economistas do governo presumiram que não se vai gastar dinheiro extra com reajustes reais do salário mínimo. Hum.
Sem reforma e sem dinheiro extra, o governo terá de fazer cortes progressivos. Quais? Alguma redução real do valor gasto com salários de servidores. Um talho brutal, mais da metade, do quase irrisório dinheiro despendido atualmente em obras. Cortes de serviços outros do governo.
Como se explica lá no Anexo 4.1, o crescimento da despesa obrigatória (em especial Previdência) “...tende a precarizar gradualmente a oferta de serviços públicos e a pressionar, ou até mesmo eliminar investimentos importantes” dado o teto de gastos.
Reformas da Previdência, dos impostos, administrativa, abertura comercial e privatizações tendem a provocar um aumento de receita, escreve-se lá no Anexo 4.1, mas nada disso é dado como certo, ovos na cesta.
Parece óbvio, pois, que a disputa social e política pelos recursos mínimos do governo vai ficar ainda mais crítica, se não explosiva.
Agora mesmo, caminhoneiros e ruralistas querem algum tipo de subsídio. Empresas da construção civil reclamam que o governo invista algum em obras de casas, por exemplo.
O congelamento do valor real do salário mínimo, medida que contém um pouco da despesa previdenciária, tende a provocar reações sociais e foi recebido com chiadeira no Congresso.
É preciso que dê tudo muito certo para que as previsões assustadoras do Anexo 4.1 estejam erradas.
“Tenso”, como dizem os jovens.
Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA
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