O presidente Jair Bolsonaro é um simulacro de Jânio Quadros, que mandava bilhetinhos proibindo biquínis, desfile de misses, briga de galo. Os bilhetinhos do Bolsonaro são os seus tuítes. Tal qual o personagem de nossa tragédia, que agora se repete como farsa, Bolsonaro dá seu toque pessoal especialmente em questões comportamentais, um populismo tosco que se volta para seu público específico, e não para os interesses do país.
Agora mesmo vetou um vídeo publicitário do Banco do Brasil, e ainda demitiu o diretor de Comunicação e Marketing do banco estatal, Delano Valentim. A campanha, marcada pela diversidade, trazia atores e atrizes negros, uma transexual e jovens tatuados usando anéis e cabelos coloridos. O objetivo da propaganda era levar o Banco do Brasil até os jovens, e ele não gostou do que viu.
Se fosse o dono de um banco privado, poderia dar vazão às suas idiossincrasias, mas talvez tivesse problemas com seus conselheiros, que poderiam ficar preocupados com a imagem da instituição. Mas o Banco do Brasil não é do presidente do momento, e não pode, portanto, obedecer a seus desejos pessoais.
Tem que ser dirigido de acordo com objetivos técnicos, e a propaganda devia estar adequada aos nichos jovens que o banco busca. O país tem que acompanhar sua juventude, que é o seu futuro. Uma atitude hostil a comportamentos característicos de jovens contemporâneos é retroceder nos hábitos e costumes já aceitos, inclusive legalmente, no Brasil.
Acontece a mesma inadequação quando diz que o Brasil não pode ser o paraíso do turismo gay. “O Brasil não pode ser um país do mundo gay, de turismo gay, porque aqui temos famílias”. Além de intolerável, essa discriminação assumida já há muito, e que tentava negar, foi acompanhada de um comentário insensato: “Quem quiser vir aqui fazer sexo com mulher, fique à vontade”.
O país não pode ser receptáculo de turismo sexual, ponto. Sobretudo de pedofilia, uma praga, principalmente nos estados mais pobres. Tem a obrigação de receber bem seus turistas, homossexuais ou não. Se os gays se sentem no Brasil bem acolhidos, sem repressão, é ótimo que o país tenha uma fama internacional de ser acolhedor com os gays.
Fortalece a imagem de que somos um país acolhedor, que não reprime as minorias, não tem preconceitos. Alguns países perseguem as minorias, especialmente os gays. Essas posições pessoais do presidente Bolsonaro não podem se transformar em posições do Estado brasileiro. Ao falar essas coisas, o presidente estimula atitudes agressivas contra os gays, pode ter gente que se sentirá autorizada a discriminar gays, a não recebê-los em hotéis em restaurantes.
O Brasil, que já esteve entre os 20 países mais amigáveis aos gays, vem perdendo posições no ranking do site Spartacus, e passou do 55º lugar em 2018 para o 68º em 2019. A criminalização da homofobia está em julgamento no Supremo Tribunal Federal, suspenso com placar de 4 a 0 favorável para que o preconceito contra gays vire crime de racismo. O presidente Bolsonaro, ainda candidato, deu declarações contrárias a essa iniciativa.
Os avanços institucionais nesse campo são evidentes. Em 5 de maio de 2011 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a família homoafetiva, conferindo aos casais homossexuais o direito à união estável, um direito apenas do homem e da mulher, em razão do artigo 1.723 do Código Civil, que define o núcleo familiar como formado “por homem e mulher”.
O STF permitiu a interpretação extensiva aos casais de mesmo sexo. Ao proferir a decisão, o STF deixou expresso que o reconhecimento deve ser feito "segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva". Mas a eleição de Bolsonaro trouxe inquietação a essa minoria, e comentários como os que fez diante de um grupo de jornalistas não ajudam em nada a conter a fama de homofóbico, que o presidente oficialmente renega.
A falta de compreensão do que seja uma política humanística e inclusiva faz com que o governo Bolsonaro pense em cortar verbas de estudos de Humanas como sociologia e filosofia, no pressuposto de que são matérias que não contribuem para o avanço do país. Tudo faz parte de uma visão estreita do que seja governar um país”.
Correção
Na coluna de ontem do jornal impresso escrevi que a proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, previa um corte de R$ 1,2 bilhão na reforma da Previdência. Evidentemente o corte proposto é de R$ 1,2 trilhão. No blog saiu correto.
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