No início de seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro deu aos brasileiros minimamente sensatos uma nesga de esperança de que, uma vez passadas as diatribes da campanha eleitoral, suas redes sociais seriam geridas com zelo e profissionalismo, como convém a um meio de comunicação que é amplamente utilizado pelo presidente da República.
O Decreto n.º 9.671, publicado no dia 2 de janeiro, entre outras disposições, atribuía à Assessoria Especial da Presidência da República, em coordenação com a Secretaria Especial de Comunicação Social da Secretaria de Governo, a “competência para administrar as contas pessoais das mídias sociais do Presidente da República”. Ou seja, servidores públicos seriam os responsáveis por administrar as contas do presidente na internet e decerto o conteúdo publicado haveria de passar por um crivo republicano.
É sobejamente conhecido o apreço que Jair Bolsonaro tem pelo Twitter e pelo Facebook como meios de “comunicação direta” com o público, a tal ponto que seu triunfo eleitoral, em larga medida, é atribuído ao uso que fez das redes sociais para transmitir sua mensagem aos eleitores ante o exíguo tempo de propaganda no rádio e na TV.
No decorrer da campanha eleitoral, suas contas nas redes sociais foram administradas por seu filho Carlos Bolsonaro, vereador na cidade do Rio de Janeiro pelo PSL. Carlos é usuário compulsivo das redes sociais e tido como hábil manipulador das informações que circulam naquele ambiente.
Uma coisa, no entanto, é a comunicação do candidato à Presidência. Outra, muito distinta, é a comunicação oficial do chefe de Estado e de governo. O Decreto n.º 9.671, portanto, indicava novos ares.
A esperança não durou mais do que poucos dias. Tanto Jair Bolsonaro não passou a moderar suas publicações nas redes sociais, tendo em vista o alto cargo que passou a ocupar na República, como suas contas, quando não administradas por ele mesmo, continuam a ser usadas por terceiros que não detêm prerrogativa para tal.
Para soltar as amarras legais que ele mesmo, em boa hora, havia atado, o presidente Jair Bolsonaro editou um novo decreto – Decreto n.º 9.703, publicado em 8 de fevereiro – revogando as disposições do Decreto n.º 9.671 que atribuíam a competência para a administração de suas contas pessoais nas redes sociais à Assessoria Especial da Presidência da República. Em outras palavras: servidores responsáveis por administrar as redes sociais do presidente da República, oficialmente, não têm mais qualquer ingerência sobre o que sai publicado no Twitter e no Facebook em nome de Jair Bolsonaro. Na prática, se assim quiser, o presidente da República pode deixar que um de seus filhos, ou qualquer pessoa que ele designar, publique informações em seu nome nas redes. Uma temeridade.
De acordo com reportagem do jornal Valor, o dispositivo do Decreto n.º 9.671 que procurava dar seriedade às postagens públicas da Presidência da República no Twitter e no Facebook foi revogado porque – pasme o leitor – “não deu certo e o presidente continuou postando”. Diz-se que o Brasil é um estranho país onde há leis que “pegam” e leis que “não pegam”. É preocupante quando uma lei “não pega” nem para o chefe do Poder Executivo.
A necessidade de moderação no uso das redes sociais pelo presidente se dá, antes de tudo, porque o que Bolsonaro diz ou escreve tem evidentes repercussões políticas e econômicas. Deveria ser desnecessário enfatizar que as pulsões do presidente no manuseio de suas redes sociais são incompatíveis com a estabilidade de que o País precisa.
O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, um funcionário sério e responsável, passou a trabalhar com nova estrutura de comunicação do governo. Era de esperar que, com a nova organização, as crises geradas pelo uso das redes sociais pelo presidente Bolsonaro fossem pelo menos amenizadas. Mas tudo continua na dependência de o presidente Bolsonaro entender a natureza do cargo que ocupa e o alcance que têm as suas palavras.
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