O pior que Rodrigo Maia poderia fazer, a essa altura, é engavetar o projeto de reforma da Previdência com argumentos que não param em pé
O calendário prometido no ano passado para a reforma da Previdência já está atrasado: pelo que havia sido decidido no fim de 2017, as discussões sobre o projeto já deveriam ter começado na Câmara dos Deputados e a votação ocorreria no dia 19 ou no dia 20. Em vez disso, o ano legislativo começou sem discussão alguma, e a data da votação virou o marco para o início dos debates. Mas até isso está na corda bamba.
Na quinta-feira, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, garantiu que o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), cumprirá o novo cronograma e iniciará os debates na próxima semana. O ministro fez a afirmação depois de reunião com o próprio Maia. Mas informações de bastidores levantadas pelo jornal O Estado de S.Paulodizem que o presidente da Câmara já tem o discurso pronto para engavetar o projeto, já que o governo não tem ainda os 308 votos necessários para a aprovação da emenda constitucional.
Se a proposta é “necessária”, tem de ser feita, independentemente do resultado que surja das urnas no fim deste ano
Enterrar a reforma da Previdência seria uma irresponsabilidade sem tamanho, e nenhum dos argumentos citados pelas fontes ligadas a Maia e que seriam usados por ele para justificar tal decisão para em pé, a começar pela avaliação de que a reforma é “necessária”, mas que o futuro da proposta tem de ser definido pelas eleições de outubro. Afirmar algo assim é praticamente fugir das responsabilidades que os eleitores atribuíram a este Congresso eleito em 2012 e que tem a obrigação de seguir trabalhando até o último dia de mandato. Ora, se a proposta é “necessária”, tem de ser feita, independentemente do resultado que surja das urnas no fim deste ano. Maia sabe muito bem do sucesso das campanhas de desinformação levadas a cabo por quem diz não haver necessidade de reformas, e do risco de que o eleitor consagre mais uma vez, como em 2014, o populismo enganador. Aceitar esse risco não é exatamente uma demonstração de convicção na “necessidade” da reforma.
Um outro argumento, o de que não adianta colocar a reforma em pauta para que ela seja derrotada, fazia algum sentido meses atrás, quando havia tempo hábil para continuar a costurar apoios. Agora, com a contagem regressiva para o início do período eleitoral, em que nossos congressistas praticamente abandonam seu trabalho para o qual foram eleitos (e para o qual são pagos) para caçar votos Brasil afora, é melhor, sim, votar a reforma de uma vez; se não para aprová-la, pelo menos para que o debate possa avançar e ficar mais evidente, para que haja novas oportunidades de desmentir a falácia do “déficit inexistente”; assim, aplaina-se o caminho para – por que não? – uma mudança de convicções dos indecisos em favor da reforma, ou, na pior das hipóteses, para que a o tema não seja ignorado pela próxima legislatura.
Ainda segundo o Estado, o grupo ligado a Maia entregou que as motivações do presidente da Câmara não têm nada a ver com o “papel institucional” que ele alegaria se realmente anunciar o engavetamento da reforma da Previdência: ele desejaria se distanciar de uma proposta impopular para aumentar sua viabilidade eleitoral – o que, aliás, só confirma a temeridade de empurrar a responsabilidade de fazer a reforma para os eleitos em outubro, já que o próprio grupo de Maia avalia que o ânimo do eleitor é, hoje, contrário ao texto. Este não é o momento de um presidente de casa legislativa colocar os próprios cálculos eleitorais acima da matemática fiscal que ameaça destruir as contas públicas.
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