Será que as regras de mercado podem afetar a percepção dos indivíduos sobre o que é correto fazer? A economia supõe que não. A evidência, porém, sugere que essa resposta deve ser reavaliada em alguns casos.
A pesquisa acadêmica em economia tem estudado, cada vez mais, temas diferentes, como os determinantes dos homicídios ou as razões pelas quais procrastinamos estudar para uma prova –assuntos muito distantes dos tradicionais, como juros e câmbio.
Na medida do possível, o estudo sobre os determinantes das decisões individuais requer dois grupos semelhantes de pessoas, sendo apenas um deles afetado pelas mudanças (o outro é denominado grupo de controle). A diferença observada nas escolhas dos indivíduos em cada grupo permite estimar o impacto das alterações realizadas.
Os economistas usualmente supõem que os valores individuais sobre o que é correto fazer não são afetados por alterações das regras de mercado ou pelos contratos adotados. As circunstâncias, porém, afetam as opções disponíveis e, por isso, resultam em diferentes escolhas.
Pode-se gostar mais de livro do que de cinema, mas, se o preço do livro aumenta, o seu consumo deve cair, em decorrência do novo custo relativo entre as diversas opções. As circunstâncias teriam alterado as escolhas possíveis, mas não os valores e as preferências individuais.
Um experimento realizado em Haifa, Israel, mostra que essa suposição nem sempre é correta. Algumas creches adotaram uma multa para os pais que se atrasassem para pegar seus filhos. Segundo a economia tradicional, como a impontualidade tornou-se mais cara, em decorrência da multa, o percentual de pais atrasados deveria ser reduzido.
Para testar a hipótese, o impacto da multa sobre a pontualidade dos pais foi comparado ao observado em outras creches, que não a adotaram (grupo de controle).
O resultado surpreendeu. O número de pais atrasados aumentou em comparação ao observado no grupo de controle, ao contrário do esperado. Depois de algum tempo, a multa foi retirada. Os atrasos, porém, não se reduziram.
A preocupação dos pais com a pontualidade fora alterada pela introdução temporária da multa. O atraso perdeu a sua conotação moral negativa, e a multa, aparentemente, foi interpretada como o preço pelo serviço de cuidar das crianças além do horário previsto. Retirada a multa, permaneceu a percepção de que a impontualidade não era moralmente repreensível.
Uri Gneezy e Aldo Rustichini contam essa história no artigo "A Fine is a Price, Journal of Legal Studies", de 2000. Teses podem ser propostas livremente. Melhor quando suportadas pelos dados disponíveis.
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