O Globo - 06/09
Não sei se houve cem mil pessoas nas ruas de São Paulo, mas tinha muita gente, o que obrigou o ministro Henrique Meirelles a admitir que era “um número considerável”. Uma manifestação como essa sempre é um baque para qualquer governo, e tenho a impressão de que as forças que apoiam a presidente cassada Dilma ganharam motivação nova com o impasse criado pelo fatiamento, que acabou colocando o próprio impeachment em questionamento na judicialização do processo no Supremo Tribunal Federal.
Essa insegurança jurídica sobre o desfecho do processo obriga o Supremo a uma decisão rápida, mesmo que a impressão predominante entre os especialistas seja a de que nada será anulado, nem a decisão de cassar a presidente nem a esdrúxula divisão de um texto constitucional que não admitia tal separação de penas, como se a inabilitação da presidente punida fosse uma pena acessória, e não a própria continuidade do castigo legal.
Uma decisão contrária, de anulação do impeachment, jogaria o país num caos de insegurança jurídica que teria consequências graves, inclusive colocarse no cenário internacional como, aí, sim, uma verdadeira República bananeira, cuja Constituição é manipulada por grupos políticos a torto e a direito.
O presidente Temer viajou para a reunião do G-20 sustentado por uma decisão do Senado, assinou documentos, fez acordos diplomáticos, para de repente ser destituído devido a uma manobra casuística de grupos políticos? Fala-se tanto em golpe parlamentar, e a separação do texto constitucional para beneficiar a presidente destituída seria exatamente o quê?
Situação delicada que precisa ser esclarecida rapidamente pelo STF. Mas foi uma temeridade Michel Temer minimizar as manifestações contra seu governo, que ocorrem em diversos pontos do país. Defender a presidente Dilma era mais difícil do que defender o “Fora, Temer”, e é improvável que multidões vão para a rua para pedir “Fica, Temer”. A defesa de seu direito de assumir a Presidência da República advém muito mais do cumprimento da Constituição do que de sua qualidade de líder político, que ainda está para ser provada.
Mostrando mais uma vez que seu faro político continua aguçado, o ex-presidente Lula lançou a campanha por eleições diretas já, para dar a seus seguidores uma razão para sair às ruas, esquecendo as muitas outras razões que têm para se envergonhar.
É uma utopia inalcançável, pois tem um componente revolucionário que não terá o apoio da maioria da população, mas serve para animar os militantes. Esse componente revolucionário, movido a violentos ataques ao patrimônio público por mascarados, é mais uma razão para afastar essas novas manifestações da maioria da sociedade, que, se não se mobiliza a favor de Temer, pode vir a se mobilizar contra os arroubos revolucionários desses movimentos sociais que instalaram o pânico nas cidades onde se manifestaram.
As eleições deste ano mostrarão o repúdio do eleitorado médio ao PT e à esquerda, especialmente se a violência continuar sendo o motor das manifestações. Ao mesmo tempo em que ganharam motivação maior com a campanha “Diretas já”, continuarão sangrando com as revelações da Lava-Jato e outras assemelhadas.
A de ontem, envolvendo os golpes dados nos fundos de pensão das estatais, mostra a face mais cruel do esquema de corrupção organizado pelo PT e por seus asseclas. Desviaram dinheiro dos empréstimos consignados, atingindo os funcionários públicos mais necessitados, e agora estão metidos em golpes na aposentadoria dos servidores das estatais, isto é, além de quebrar as empresas, causando prejuízos ao país, roubaram a previdência de seus empregados.
A insegurança jurídica continua mesmo depois do impeachment da presidente Dilma, e será muito difícil para o PMDB controlar essa situação, porque seu trabalho prioritário é aprovar as reformas estruturais em setores delicados, como o corte de gastos públicos, a Previdência Social e a legislação trabalhista, que são medidas impopulares no plano imediato, embora sejam fundamentais para garantir o futuro dos próprios trabalhadores.
Difícil de explicar, fácil de ser explorado por líderes populistas que já se apresentam para a disputa de 2018. Quanto mais medidas impopulares o governo aprovar, mais fácil ficará o trabalho da oposição, uma situação complicada de enfrentar.
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