Multiplicam-se os casos de ‘fracasso escolar’ causados não por suposta ‘dificuldade de aprendizagem’, mas por inadequação da escola às possibilidades de cada faixa etária
Em 2016 completa-se uma década da implantação do nono ano do ensino fundamental, prazo que autoriza balanços e avaliações. Em tese, a medida adotada em 2006 visava a proporcionar às crianças brasileiras um ano a mais de estudo.
A geração que frequentou a escola até os anos 1960/70 se lembra da quinta série, ou “admissão”, que marcava a transição entre o primário e os quatro anos do ginásio. O termo “admissão” referia-se ao exame exigido para o ingresso no curso ginasial. Era um perverso gargalo, capaz de abreviar e encerrar a curta escolaridade de muitas crianças, que só completavam o primário. Em 1971, a Lei 5.692 estabeleceu um fluxo contínuo até a oitava série do primeiro grau.
A lei eliminou o obstáculo, mas reduziu a trajetória escolar em um ano. A mesma estrutura foi mantida quando, em 1996, o primeiro grau se tornou ensino fundamental. Assim, as gerações que frequentaram a escola nas décadas de 1970, 1980 e 1990 cursaram, todas elas, o primeiro grau em oito séries.
Decorridos 30 anos, já na primeira década deste século, constatou-se que era curta a trajetória escolar proporcionada pelo Brasil às suas crianças. Caberia oferecer-lhes um ano a mais de estudo no ensino fundamental, antes que chegassem ao ensino médio.
A Lei 11.274/06 teve como prioridade a rede oficial, cuja realidade impunha a necessidade de se antecipar o ingresso do aluno na escola. Era também conveniente que as verbas destinadas à alfabetização da criança brasileira aos 6 anos de idade fossem alocadas no segmento do fundamental.
Na prática, a expansão consistiu em incluir a classe de alfabetização (CA) — até então uma etapa da educação pré-escolar — no ensino fundamental. O CA passou a ser chamado de primeiro ano. E as demais séries do fundamental foram apenas renomeadas anos.
Em um contexto mais amplo, essa condução trouxe certa perplexidade. Chegava-se formalmente ao nono ano do ensino fundamental, sem, na verdade, prolongar a escolaridade. Na época, as escolas foram então “tranquilizadas” pelo governo, que esclareceu que a inclusão de um ano a mais não implicaria alteração nos programas ou conteúdos a serem ensinados: na prática, nada mudava.
Decorridos dez anos de sua implantação, caberia fazer-se um balanço da eficácia dessa lei e de seus efeitos sobre a trajetória escolar.
À primeira vista, os dados apurados recentemente pela Avaliação Nacional de Alfabetização sugerem que a estratégia parece não ter garantido um impacto efetivo. Os resultados são, no entender do próprio governo, preocupantes: revelam que, ao concluírem o terceiro ano do fundamental, muitos alunos demonstram um domínio insatisfatório de leitura e de escrita. Aos 8 anos de idade, muitos apenas decifram palavras isoladas, mas não compreendem uma frase completa. Por mais louváveis que fossem os objetivos, a opção feita pelo país não garantiu resultados na camada que mais precisaria.
À medida que se aproxima o fim do ensino fundamental, multiplicam-se os casos de “fracasso escolar” que não decorrem de uma suposta “dificuldade de aprendizagem”, mas de uma inadequação da escola às possibilidades de cada faixa etária.
Hoje, muitos alunos concluem o fundamental não apenas despreparados, como também imaturos para enfrentar as exigências do atual ensino médio. O descompasso criado torna ainda mais urgente a revisão curricular e a diversificação das trajetórias nesse último segmento da educação básica.
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