O Globo - 25/08
Um brasileiro pode viver num país com taxa de desemprego de 20,6% ou no Brasil de apenas 1,9% de desempregados. Depende da renda. A primeira é a taxa de desemprego dos 10% mais pobres; a segunda, dos 10% mais ricos. Foi o que mostrou ontem o ministro Henrique Meirelles. Com isso, ele comprova de forma eloquente a perversidade da crise econômica que desabou sobre o país.
Oministro da Fazenda e o ministro Dyogo de Oliveira, do Planejamento, foram ontem à Câmara para tentar convencer os parlamentares a votar a favor da Proposta de Emenda Constitucional que estabelece que os gastos públicos só poderão ser reajustados de acordo com a inflação do ano anterior. Para começar, eles traçaram o tamanho da crise provocada internamente pela política econômica que levou à desorganização fiscal. O Brasil perdeu 16% de PIB per capita. Era R$ 30,5 mil, em 2013, eé R$ 25,7 mil, em 2016. Por isso, eles chamam a crise de “sem precedentes”.
A proposta do governo é que nos próximos 20 anos a expansão de gastos não seja superior à inflação e que isso valha para os três poderes, o Ministério Público e a Defensoria Pública. Entender que a crise é grave e dolorosa foi mais fácil do que saber como justificar os aumentos salariais dos servidores neste contexto de perda de renda per capita e de desemprego avassalador entre os pobres. O governo Temer, que pode deixar de ser interino em uma semana, defendeu aumentos salariais, depois recuou, e agora a base se dividiu a esse respeito. E se formou uma estranha aliança, PT e PMDB, inimigos de morte no debate do impeachment, estão juntos nos reajustes das várias categorias profissionais do funcionalismo. Na oposição ao aumento, estão partidos que também são da base, como o PSDB e DEM.
No mínimo essa ambiguidade aumenta o ruído em torno do que o governo quer dizer ao pedir esse teto para os gastos. Até porque vários órgãos terão aumento com os servidores. O governo está pedindo que votem o teto dos gastos e sendo pouco claro sobre o que pretende fazer com um item importante das despesas.
Há muitos motivos para combater a crise econômica, um deles é pelo que o ministro Meirelles disse ontem, que “a melhor política social é criação de empregos”. Os dois ministros explicaram que para sair da crise é preciso restabelecer a confiança, e para isso é fundamental dar um horizonte de controle das despesas públicas.
— Mais de 50% das despesas do governo federal são para o pagamento de aposentadorias, pensões, benefícios previdenciários. Já o investimento é 3% das despesas. A nossa dívida este ano vai passar de 70% e pela trajetória atual não há um ponto no qual ela para de crescer — disse Dyogo Oliveira.
Os ministros explicaram que a despesa com a previdência está aumentando, entre 2015 e 2017, mais de R$ 100 bilhões. O pior é que o governo, quando fala em despesa da previdência, está contando apenas uma parte da triste história, porque se restringe ao INSS. Em termos per capita, a despesa com a previdência dos funcionários públicos civis e militares é muito mais alta. Mas o governo tem tido foco apenas no INSS, a previdência de quem trabalha no setor privado. Só a conta dos aposentados do setor privado está aumentando 0,8% a 0,9% do PIB ao ano.
Os ministros pintaram esse quadro dramático e pediram pela aprovação do teto dos gastos. A questão é que os números revelam uma realidade tão difícil que a PEC do teto das despesas pode não ser suficiente para reverter. Principalmente quando o governo não tem demonstrado firmeza suficiente.
Os deputados diante de uma situação assim tão difícil defenderam detalhes como: por que não limitar essa medida a sete anos? O ministro Meirelles defendeu que ficasse então em 11, dizendo que o importante era dar previsibilidade.
O governo Dilma entra agora na última fase do julgamento de impeachment. Dentro de uma semana, será a votação que pode afastá-la definitivamente. O país está com uma crise grave demais, que tem aumentado a desigualdade, destruído renda per capita, e todos os remédios que estão sendo prescritos parecem excessivamente fracos para superar o problema, mas são apontados como amargos demais para os políticos aprovarem. Os ministros bem que tentaram explicar que amarga mesmo é a crise.
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