ESTADÃO - 31/07
'Os companheiros' parecem confusos e radicalmente divididos sobre apoiar a permanência da presidente afastada
Até que ponto o PT está mesmo interessado na volta da presidente Dilma ao governo, com tudo o que viesse depois?
O teatro e a retórica sugerem que está, sim, e que o interesse do partido se identifica com o interesse da presidente. Mas não é só a lógica que aponta para outra direção. Como tem acontecido em tantos outros assuntos, “os companheiros” parecem confusos e radicalmente divididos.
A condenação do “golpe” a que se aferram peca por falha estratégica. O PT e a presidente Dilma vêm usando todos os recursos políticos e institucionais, os mesmos que passaram a denunciar como ilegítimos. Como aceitar como legítima a defesa da presidente Dilma se todo o processo deve ser considerado nulo, como opinam?
Em outras palavras, é difícil vender a tese do golpe parlamentar e judiciário se os apoiadores da presidente afastada estão usando todos os meios e prerrogativas que lhes conferem a Constituição, as leis e os regimentos, tanto do Congresso quanto do Supremo. Se aceitam as regras do jogo, não há sentido em condená-las.
A outra contradição está no comportamento prático. O PT refugou veementemente a política econômica colocada em marcha no segundo período Dilma. Descartou o que chamou de cavalo de pau na economia adotado ainda em dezembro de 2014, que “criou a sensação de estelionato eleitoral”. Malhou o quanto pôde o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e sua política de ajuste. Malhou depois o ministro que lhe sucedeu, Nelson Barbosa, e também acusou seu programa fiscal “de destruir a base social petista, gerando confusão e desânimo nos trabalhadores, na juventude e na intelectualidade progressista”. E rejeitou também veementemente os primeiros passos em direção à proposta de reforma da Previdência feita pela própria presidente Dilma e pelo ministro Nelson Barbosa.
Em lugar de tudo isso, os dirigentes do PT defenderam a retomada da política econômica do primeiro governo Dilma, baseada na enorme expansão das despesas públicas, nas desonerações fiscais, na distribuição de subsídios, na derrubada dos juros, na fartura de crédito – decisões que deveriam ser reforçadas pela venda imediata de reservas externas. Ainda nesta sexta-feira, o presidente Lula declarou que a solução da economia está na expansão do consumo e na ativação do crédito, como se faltasse crédito – e como se a retranca no consumo fosse causa e não consequência dos desequilíbrios da economia.
Na Resolução sobre a Conjuntura, de 17 de maio de 2016, o PT comprometeu-se com a defesa de Dilma no processo de impeachment, mas exigiu que, uma vez vitoriosa, adotasse mudança radical de rumo na política econômica adotada antes do seu afastamento do governo.
Dilma chegou a propor que, uma vez de volta ao Palácio do Planalto, novas eleições fossem convocadas imediatamente para escolher novo chefe de governo. Mas essa é uma proposta de baixa viabilidade política, uma vez que exigiria renúncia do vice-presidente e aprovação de um Projeto de Emenda à Constituição (PEC), em dois turnos pelas duas Casas do Congresso, por maioria de três quintos.
E, antes disso, seria preciso saber com que base parlamentar contaria a presidente Dilma para conduzir a economia, especialmente depois do rompimento com o PMDB liderado pelo vice-presidente, Michel Temer, agora seu desafeto.
Independentemente disso, ou Dilma aceitaria a volta dos experimentos e do voluntarismo praticados enquanto vigorou a fracassada Nova Matriz Macroeconômica e sua política de pedaladas, ou adotaria uma variação qualquer da política de Temer, sem no entanto garantir a credibilidade necessária para isso. Qualquer que fosse a opção, teria potencial para produzir novos estragos e isso, decididamente, prejudicaria ainda mais o projeto eleitoral do PT, pelo menos o de 2018.
Por isso, faria mais sentido que o PT permanecesse na oposição, de onde pudesse tirar proveito político de possíveis tropeços do governo Temer, do que voltasse à base de apoio de um eventual novo período Dilma.
E se o PT não está inteiro contra o processo de impeachment, mais improvável ainda contar que seja rejeitado no Senado.
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