ESTADÃO - 10/07
A Câmara dos Deputados chegou à redemocratização com o inatacável Ulysses Guimarães na presidência, mas acendeu o sinal amarelo com a eleição do indescritível Severino Cavalcanti e o sinal vermelho com o duplamente réu Eduardo Cunha e, agora, não apenas convive com o inacreditável Waldir Maranhão como está entre duas opções: ou um estouro da boiada e mais um presidente problema, ou uma união das forças políticas em torno de um nome palatável pela opinião pública.
Os maiores partidos, PMDB, PSDB e PT, simplesmente não apresentaram candidatos, para não piorar a implosão da Câmara e para esperar 2017. Mas, além deles, nenhum outro partido fechou firmemente em torno de um nome que preencha requisitos básicos, como o respeito da grande maioria e uma ficha razoavelmente limpa. Está difícil!
Eleições para as presidências da Câmara e do Senado deveriam ser como quaisquer outras, quando sempre despontam nomes naturais, com liderança, legitimidade e ampla simpatia entre seus pares, como o de Ulysses, que era inquestionável. Mas os Ulysses andam em falta, e Severino Cavalcanti, de triste memória, acabou chegando lá exatamente por eliminação: não havia soluções naturais, nem consenso em torno nomes. “Se não tem tu, vai de tu mesmo.” Depois, aguenta.
Hoje, a situação é ainda mais complexa: a sucessão de Eduardo Cunha gira em torno do próprio Eduardo Cunha. Com uma multidão de candidatos avulsos no primeiro turno, o segundo será entre o candidato dele e aquele que galvanizar o anti-Cunha, criando um interessante movimento: Planalto e líderes anti-impeachment, PT e PSDB, todos teriam de tapar o nariz e se unir em torno de um mesmo candidato contra o “inimigo comum”. Até ontem, o nome mais forte era Rodrigo Maia (DEM), mas isso sempre pode mudar.
Assim, a maior força do deputado Rogério Rosso (PSD-DF) é Cunha (no primeiro turno) e a maior fraqueza de Rosso também é Cunha (no segundo). Os demais não são candidatos ainda a presidente, mas candidatos a antídoto contra Cunha e Rosso, sem que nenhum deles consiga convencer nem ter apoio consensual nos seus próprios partidos. O PSB, o PP, o DEM, todos têm mais de um postulante, o que pode chegar a uma lista de 14 nomes. Quando há tantos, é porque não há nenhum. Logo, o estouro da boiada é no deserto.
O Planalto emite sinais contraditórios. Michel Temer se encontra com Cunha no escurinho do Jaburu num domingo à noite, mas nega. É suspeito de tramar um acordão com Cunha para adiar sua cassação e garantir-lhe ingerência na escolha do sucessor, mas nega. Jura que o Executivo não vai se meter numa decisão da Câmara, mas sua entourage não faz outra coisa, claro. Um adversário na presidência da Câmara?!
Enquanto isso, o Centrão bate cabeça, a base aliada ao Planalto está pulverizada em várias candidaturas e a “nova oposição” (PT e seus seguidores), que andava muito silenciosa, monta uma armadilha para Temer. Ou todos fecham com Rodrigo Maia, ou vem aí o ex-ministro da Saúde do final de Dilma, Marcelo de Castro, como forma de encurralar o presidente interino. Ou apoiar Castro, que votou contra o impeachment, mas é do PMDB, ou optar pelo Rosso ou um candidato qualquer de Cunha, confirmando a tese indigesta de um “acordão” entre Temer e Cunha.
Tudo está confuso, incerto e expondo as entranhas da Câmara: partidos rachados; um presidente que jamais deveria chegar aonde chegou e corre o risco de sair dali direto para a prisão; um substituto não só incapaz em vários sentidos como capaz de tentar um golpe para anular o impeachment aprovado em plenário; a inexistência de dois ou três líderes que emergissem como soluções naturais; logo, uma preocupante rejeição da opinião pública.
E a Lava Jato nem começou ainda a julgar, condenar e prender os políticos. Imaginem quando começar...
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