O GLOBO - 14/06
Em uma das gravações clandestinas do ex-senador Sérgio Machado, ele afirma que, depois que o STF decidiu que é possível decretar a prisão com condenação em segunda instância, todo mundo resolveu fazer delação premiada para escapar da cadeia. O fim dessa jurisprudência, que vigorava até 2009 e foi retomada este ano, seria um dos alvos de suposta conspiração política contra as investigações da Lava-Jato.
Na ocasião, o relator, ministro Teori Zavascki, que foi seguido por 7 dos 11 ministros, afirmou: “Ao invés de constituir um instrumento de garantia da presunção de não culpabilidade do apenado, (os recursos) acabam representando um mecanismo inibidor da efetividade da jurisdição penal”.
É nesse clima que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai revisitar o caso e tende a ampliar o alcance da decisão, dando-lhe repercussão geral, no julgamento de duas ações marcado para o próximo dia 22: o Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizaram no STF Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC), com pedido de liminar, visando ao reconhecimento da legitimidade constitucional da nova redação do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), que condiciona o início do cumprimento da pena de prisão ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória, com base no princípio da presunção de inocência.
Embora sejam ações separadas, elas serão julgadas conjuntamente, e representam interesses políticos e corporativos. Os advogados do nanico Partido Ecológico Nacional são os mesmos que têm atuado em processos do PT, inclusive Antonio Carlos de Almeida Castro, o hoje famoso Kakay, o que indica que os interesses políticos revelados nas gravações clandestinas de Sérgio Machado procuram uma maneira de desmontar um dos principais avanços no combate à corrupção.
Do outro lado, a OAB, ao defender os recursos em liberdade até o trânsito em julgado na última instância, luta também pelos interesses corporativos da classe, pois a decisão do STF, embora não seja obrigatória até o momento, é uma indicação para a maioria dos juízes.
Zavascki afirmou em seu voto que “a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência”.
Já Luís Roberto Barroso procurou demonstrar em seu voto que não apenas é perfeitamente compatível com a Constituição a execução da condenação criminal após a decisão em segundo grau, como praticamente é uma imposição da Constituição, em nome da efetividade mínima que se exige do sistema penal.
Para Barroso, a nova jurisprudência do STF impede a desmoralização do sistema de Justiça, produzindo três resultados relevantes: (a) coíbe os recursos procrastinatórios, que impedem o cumprimento da pena em tempo aceitável; (b) diminui a seletividade do sistema penal brasileiro, inibindo, sobretudo, os crimes de colarinho branco; e (c) quebra o paradigma de impunidade que vigora no país para crimes cometidos por qualquer pessoa que não seja miserável.
A tendência é de manutenção da maioria já fixada, e, como lembra Gilmar Mendes, não houve motivo para mudança de posição de ministros que votaram a favor da primeira vez, ao contrário. O momento político é mais sensível hoje à necessidade de combate rigoroso à corrupção de colarinho branco, e qualquer alteração nessa tendência do STF pode dar a sensação ao cidadão comum de que realmente há uma conspiração para tentar limitar as investigações na Lava-Jato.
Dias Toffoli, que votou a favor, determinou a prisão do ex-senador Luiz Estevão com base na jurisprudência retomada pelo STF. O ministro Edson Fachin, por exemplo, suscitou polêmica ao julgar inviável reclamação apresentada pelo Ministério Público do Maranhão contra liminar do Superior Tribunal de Justiça que indeferiu a prisão de políticos locais condenados em segunda instância por crimes de fraude à licitação e falsificação de documento público.
Fachin, porém, lembrou que o recurso de apelação não foi unânime, abrindo possibilidade de embargos infringentes, o que significa que o julgamento na segunda instância ainda não está encerrado.
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