Não se trata de mera troca de presidente, mas de paradigma na administração; ou seja, garantir que não haverá de fato qualquer condescendência com a corrupção
A experiência do impeachment do presidente Collor, vivida há 24 anos, o primeira da era republicana brasileira, ensinou que se trata de um momento grave, tenso, em que é preciso serenidade e clarividência das lideranças políticas. Como já se vê. Mesmo naquele processo de impedimento, em que não restaram atrás do presidente partidos com um mínimo de representatividade, o rito de passagem de poder para o vice Itamar Franco precisou ser feito com extrema cautela, e também em meio a uma tempestade econômica.
Hoje, no impedimento de Dilma, a debacle econômica é maior, e seu partido, o PT, mesmo acompanhando a presidente na queda vertiginosa de popularidade, é organizado, conta com bases históricas e outras cooptadas na manipulação de dinheiro do contribuinte nos 13 anos de poder.
O vice Michel Temer tem a seu favor, em comparação a Itamar, um grande partido em que se apoiar, o PMDB, do qual é presidente licenciado. Mas esta vantagem também lhe traz ônus, pela sedimentada tradição da legenda de exercitar sem remorsos o clientelismo, o fisiologismo.
Os primeiros movimentos feitos por Michel Temer, nesta contagem regressiva para o provável afastamento temporário de Dilma ainda nesta primeira quinzena, emitem sinais que dão esperança, mas também preocupam.
O otimismo decorre, por exemplo, da elevada cotação, no momento, de Henrique Meirelles, de larga experiência no setor privado e já testado no BC de Lula, para assumir o Ministério da Fazenda de Temer. Deriva, ainda, da seriedade de propostas que circulam em documentos como “Uma ponte para o futuro”, na macroeconomia, e outras para a área social, além de ideias positivas para retomar as privatizações e acelerar as concessões por meio de uma regulação confiável.
Na outra ponta, há várias preocupações e temores. O adesismo avassalador a Temer tem forçado a revisão de previsões de cortes de ministérios, um dos símbolos do desregramento fiscal do lulopetismo. Os 32 atuais seriam cortados para algo entre 20 e 22, mas já se fala em 26, a fim de acomodar aliados. Um péssimo começo.
Outra questão, de relevância estratégica, é a imagem do governo. Se vingar, ele já carregará a má simbologia do PMDB — embora deva se reconhecer que o partido serve de barreira a aventuras inconstitucionais —, que será enfatizada se Temer permitir que políticos investigados pela Lava-Jato ou qualquer outra operação anticorrupção ocupem cargos na administração. Romero Jucá é o nome mais óbvio.
Há muita gente arrolada em operações contra corrupção na era lulopetista, em que se envolveram, além do óbvio PT, o PMDB, PP, PR , e assim por diante. Legendas que correm para buscar espaço numa gestão Temer.
Não se é ingênuo de imaginar-se que não haja custos na montagem de uma ampla base parlamentar que dê sustentação às reformas necessárias. Mas existem limites razoáveis nessas negociações, como demonstrado na administração de FH. O provável governo Temer não pode repetir a explicação malandra do lulopetismo de que “pessoas investigadas não devem ser prejulgadas”. Sim, mas não podem fazer parte de um governo o qual a sociedade espera que seja a antítese dos que patrocinaram o mensalão e o petrolão, apenas para falar dos escândalos maiores.
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