O Estado de S. Paulo - 21/05
É uma história bem triste: lá estavam eles, os épicos petistas, empenhados em salvar o povo brasileiro da opressão quando, não mais que de repente, “eles” chegaram e “contaminaram” o PT com o “financiamento empresarial de campanhas” por meio do qual “as classes dominantes se articulam com o Estado”. Embora tenham, supõe-se, resistido bravamente, os petistas acabaram “envolvidos em práticas de partidos tradicionais”.
Parece piada, mas é exatamente esse o estapafúrdio argumento central da “autocrítica” feita pelos dirigentes nacionais do PT, na qual admitiram erros na condução da economia, todos eles atribuídos a Dilma Rousseff.
O presidente do partido, Rui Falcão, fez questão de explicar que o PT não está “pedindo desculpas nem fulanizando avaliações”, mas admite: “Pontuamos como autocrítica, por exemplo, o fato de tardarmos a reconhecer que havia um esgotamento da política de desenvolvimento que imprimimos”. Mas a direção nacional petista, fingindo acreditar que Dilma Rousseff voltará a exercer a Presidência da República, deixou claro, no documento que serviu de base para discussão no encontro, que a responsabilidade pelo “erro” é toda dela: “O Partido dos Trabalhadores propõe que a presidenta Dilma Rousseff apresente rapidamente um compromisso público sobre o rumo de seu governo, depois de derrotado o golpismo, defendendo uma ampla reforma política e medidas capazes de retomar o desenvolvimento, a distribuição de renda e a geração de empregos”.
Quanto à “ampla reforma política”, Falcão não se deu ao trabalho de explicar por que o PT não moveu uma palha para promovê-la nos 13 anos em que ocupou o poder, embora a explicação pareça implícita na admissão do fato de que o partido foi “contaminado” e preferiu dedicar-se a usufruir os benefícios da corrupção que instituiu como método de cooptação política e de fundamento da “governabilidade”.
Quanto à economia, o documento petista persevera no voluntarismo – ou caradurismo – que é a principal característica de seu populismo irresponsável. Propõe para o triunfante regresso de Dilma a demagógica obviedade de “medidas capazes de retomar o desenvolvimento, a distribuição de renda e a geração de empregos”, como se essas medidas pudessem se concretizar pela simples vontade dos governantes. Ora, o desenvolvimento econômico é desejado por todo mundo, não apenas pelos petistas. Mas foi a incompetência e teimosia do governo do PT que resultaram não no desejado desenvolvimento, mas em retração econômica, com suas graves consequências sociais. Essa tragédia é produto da absoluta inépcia administrativa do lulopetismo, aliada à espoliação sistemática do Tesouro e dos recursos da Nação.
A distribuição de renda de que falam os lulopetistas é outra empulhação paternalista, porque, por razões eleitorais, querem fazer o povo acreditar que se trata da ação unilateral de um governo generosamente disposto a “distribuir” dinheiro do próprio bolso – como se esse dinheiro não fosse de todos –, escamoteando o fato de que a verdadeira distribuição de renda é o justo compartilhamento, por toda a sociedade, da riqueza que ela própria cria. Bolsa Família, por exemplo, não é distribuição de renda. É medida governamental de emergência destinada a atender carências básicas.
Finalmente, “geração de emprego”, condição indispensável ao crescimento econômico e ao desenvolvimento social, é uma expressão que hoje o PT deveria ter vergonha de mencionar, já que os cerca de 14 milhões de brasileiros evidenciam o retumbante fracasso de sua “nova matriz econômica”.
Afastado do poder como consequência dos crimes de responsabilidade de que Dilma Rousseff é acusada, e também porque se demonstrou incapaz de abrir para os brasileiros as portas do prometido Paraíso, o PT preocupa-se agora exclusivamente com sua sobrevivência política. Dividido, não consegue definir a melhor estratégia para recuperar o prestígio perdido. Muitos petistas, como Lula, pensam em “voltar às raízes” e reencetar a luta por um “governo popular”. Não será tarefa fácil, porque perdeu a identidade, a credibilidade e o poder de garantir o apoio de movimentos “de esquerda” mantidos com verbas públicas. Foi no que deu ter-se deixado “contaminar”, não pelas “classes dominantes”, mas pelo embuste e pela corrupção.
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