quarta-feira, janeiro 06, 2016

Endividar-se não resolve crise fiscal dos estados - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 06/01

Governadores e prefeitos se animam com a possibilidade de contrair mais empréstimos, mas, se não fizerem reformas, cedo ou tarde estarão na mesma situação



O grupo de dez governantes estaduais que bateram à porta do governo atrás de socorro deixou Brasília animado com a entrada em vigor da troca do indexador de suas dívidas, e de prefeituras de grande porte, como São Paulo e Rio. Conforme lei aprovada no Congresso, a mudança de indexador — sai o IGP-DI mais juros de 6% a 9%, e entram 4% de juros e IPCA ou Selic, o que estiver mais baixo — começa a valer em 31 de janeiro e retroage a antes de 1º de janeiro de 2013. Um baita subsídio e enorme transferência de renda dos contribuintes a estados e alguns municípios.

A mudança de indexadores e juros mais altos por outros mais baixos fazia sentido, porque a grande renegociação de dívidas da Federação foi patrocinada em 1998/99, na era FH, como etapa essencial da estabilização da economia, numa outra conjuntura.

À época, as dívidas foram federalizadas, e governadores e prefeitos negociaram as condições do ressarcimento ao Tesouro — quem oferecesse ativos à privatização pagaria taxas mais baixas —, e se comprometeram a não mais se endividar. Uma regra de ouro quebrada agora.

Na prática, a retroatividade representou nova renegociação de dívida, contra o espírito da própria Lei de Responsabilidade Fiscal — de que o PT nunca gostou mesmo. E por isso Dilma está às voltas com um pedido de impeachment.

O total das dívidas é de R$ 766,6 bilhões. Com a aplicação retroativa de índices mais baixos, abre-se espaço para estados e os municípios contraírem mais dívidas. Sepulta-se agora a ideia que se tinha em 1998/99 — ingênua, se vê — de que aquela deveria ser a última renegociação de dívidas públicas, porque a economia entraria num ciclo duradouro de estabilidade, e a responsabilidade fiscal se enraizaria na gestão pública.

Isso não aconteceu. A própria aplicação de uma correção mais baixa antes de janeiro de 2013 —“no Brasil, até o passado é incerto...” — já é uma renegociação. E, a depender da sucessão de Dilma, pode-se apostar, com alguma margem de certeza, que, no futuro, estados e municípios pedirão novamente socorro. É preciso apenas persistir o descaso com a responsabilidade fiscal.

As autoridades regionais só aguardam autorização do Executivo para procurar os bancos. Esperam, assim, não ter de fazer muitos cortes. Mas é preciso saber a que taxas os banqueiros emprestarão a estados de um país cuja nota de risco de crédito foi rebaixada.

Outra questão é que, a julgar pelas expectativas, a recessão entrará por 2017. Vale dizer, a receita tributária tão cedo não será copiosa como no passado, e isso aconselha cuidado com o caixa de estados e municípios.

As autoridades regionais deveriam se dedicar a fazer fundas reformas administrativas, cujos benefícios podem ser estruturais, duradouros. O Rio de Janeiro, por exemplo, anuncia algo nesta direção. Mas elevará impostos e levantará dinheiro em banco. Recomeça tudo de novo.

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