sexta-feira, dezembro 18, 2015

Modelo de gestão da ´era pós-Levy´ já começa a surgir - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 18/12

Embora não tenha sido oficializada a saída de Joaquim Levy do Ministério da Fazenda, a gestão do governo pós-Levy já começou.

Fontes da área econômica viram uma primeira iniciativa de mudança da política econômica, que se seguirá à demissão do ministro, na decisão do BC que, na quarta feira, liberou compulsório para financiar projetos de infraestrutura do PAC e para bancos de menor porte. São cerca de R$ 3 bilhões que serão, segundo essas fontes, destinados a financiar as empresas construtoras do Minha Casa, Minha Vida credoras do governo, que não tem dinheiro para pagá-las. Levy não gostou do que viu.

A presidente Dilma Rousseff teria manifestado interesse em colocar na Fazenda um nome que saiba vender esperança no futuro. Levy teria ficado muito focado no ajuste fiscal, no entender de fontes do Planalto. Dilma e o ex-presidente Lula querem um ministro que fale em crescimento econômico para mostrar que a recessão e o desemprego são passageiros.

Em conversas com amigos nas duas últimas semanas, Levy comentava que, ao contrário do que se espalhou pelos quatro ventos, sua agenda na Fazenda nunca foi só o ajuste fiscal. No discurso de posse, lembrou que desfiou os principais eixos da política econômica que pretendia imprimir, começando por "enfrentar hábitos arraigados, consertar equívocos e avançar nas reformas para preparar o Brasil pós-commodities".

Se o governo pretendeu focar no fiscal, disse ele, foi porque "provavelmente não quer reformas" e que, muito provavelmente, "ainda pensa, como no caso do impeachment, que pode manter tudo igual só com ajustes de curto prazo".

O custo da deriva fiscal ficou cristalino com o envio, ao Congresso, do Orçamento de 2016 deficitário e a consequente perda do grau de investimento pelas agências de rating Standard & Poor´s, em setembro, e pela Fitch, nesta semana. O preço do ajuste vai aumentar porque o Congresso entra em recesso sem ter votado medidas de aumento de impostos que exigem o princípio da anterioridade.

Levy encontrou as finanças públicas devastadas pelo governo durante o primeiro mandato. Errou por ter firmado uma meta de superávit primário de 1,2% do PIB ainda no fim de 2014, mas não conhecia a extensão da gastança, das pedaladas, dos impactos nos anos seguintes de medidas tomadas até 2014. Nem todas as informações lhe foram passadas durante a transição. Houve uma farta distribuição de generosos subsídios, durante a vigência da nova matriz econômica, as contas não fechavam e o buraco era gigantesco.

Para ele, a agenda de crescimento do Ministério da Fazenda teve início com o "combate ao patrimonialismo", a exemplo do Conselho Administrativo da Receita Federal (Carf), envolvido nas investigações de corrupção da Operação Zelotes, que mesmo diante desse processo passou por profundas reformas.

Sob sua gestão, a Fazenda cortou subsídios sem retorno, com a reoneração parcial da folha de pagamento das empresas. Já anunciados ministros - ele e Nelson Barbosa, no fim do ano passado -, reformaram as condições dos empréstimos do Programa de Sustentação dos Investimentos (PSI), que abriu um rombo de R$ 30 bilhões nas contas públicas.

O Conselho Monetário Nacional sob a presidência da Fazenda, aumentou a TJLP e os juros no plano safra, que haviam gerado pedaladas bilionárias no Banco do Brasil. Reduziu focos de tensão com o TCU dando maior transparência nas receitas e despesas da União e acatando sugestões do tribunal.

Em várias conversas que teve nos últimos dias, o ministro fazia um verdadeiro testamento. Citou que com o ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga, fez todo o conserto do setor elétrico, cujas empresas estavam com sérios problemas financeiros por causa das heranças da MP 579, pilar do plano da presidente Dilma Rousseff para baixar as contas de luz. Restabeleceu-se o realismo tarifário e as tarifas de energia aumentaram em média 52% este ano.

Também encontrou uma solução para o fornecimento de energia em condições mais vantajosas à indústria eletrointensiva do Nordeste, que estava à beira do colapso. Lá foram adotadas tarifas compatíveis com a expansão da oferta e reajustes usando a inflação implícita nas NTN-Bs. Esse, aliás, foi o primeiro passo para a desindexação da economia desde o Plano Real, ressaltava.

Após as reformas no setor, o governo conseguiu levantar R$ 17 bilhões em um leilão de hidrelétricas, em que pela primeira vez não houve a triangulação de recursos públicos a partir de financiamentos do BNDES. Parte do dinheiro novo, cerca de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões, será destinado à capitalização das empresas distribuidoras da Eletrobras, facilitando sua venda e fechando um dos muitos ralos da estatal, comentou.

Outras áreas que estavam sendo abordadas se referiam ao desenvolvimento de financiamentos para as grandes obras que o país demanda, com novas debêntures para a infraestrutura e realinhamento da tributação dos instrumentos financeiros como LCA, LCI e renda variável, dentre outros.

Na área tributária, tentou-se avançar em duas reformas, a do ICMS e a do PIS/Cofins, cuja proposta de introdução do regime de crédito financeiro já está na Casa Civil. A proposta de financiamento da transição do ICMS com os recursos da "repatriação", sem criar mais despesas para o Tesouro Nacional, foi, segundo o Ministério da Fazenda, "descarrilhada" na Câmara dos Deputados, mas voltaria aos trilhos com a proposta de emenda constitucional do Senado.

Levy propôs, com o Banco Central, uma nova lei de punição do sistema financeiro, aproveitando as reformas do novo Código de Processo Civil, que criaria um conselho de recursos especial para o setor de mercado de capitais, separado da área bancária, e um decreto com reforma do conselho recursal da Susep, para melhorar a governança desses órgãos.

A desvalorização do câmbio, apesar do impacto nos preços domésticos, permitiu a queda do deficit na conta corrente à metade e deu um novo alento para os exportadores. Durante esse período, não houve debate no Palácio do Planalto nem na área política e nem na Fazenda sobre a condução da taxa de juros pelo Copom.

A crise política e as investigações da Lava-Jato, porém, deram um tombo na economia e na arrecadação de impostos, inviabilizando o superávit fiscal de 2015. A recuperação da Petrobras ainda não ocorreu e a reforma da Previdência não avançou.

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