ESTADÃO - 03/11
Os que combatem o projeto de lei que busca regular a contratação de serviços de terceiros (PLC 30/2015) não se cansam de lançar mão de exemplos que amedrontam a população. Entre eles está o caso das atividades que fazem parte da aviação comercial. Eles afirmam que, se aprovado, o projeto de lei permitirá às empresas aéreas da aviação comercial terceirizar todos os seus pilotos e indagam: você gostaria de voar com pilotos terceirizados?
É claro que a ideia gera uma enorme insegurança entre os que usam o transporte aéreo, a começar pelos parlamentares que precisam avaliar o projeto de lei em questão.
Um exame à luz do mero bom senso indica que a terceirização dos pilotos é uma hipótese impensável pelas empresas da aviação comercial do Brasil. Os motivos são óbvios.
As aeronaves modernas são aparelhos caríssimos. Um Boeing 737-800, muito usado nos voos domésticos do Brasil, custa US$ 90 milhões; o modelo 777-300, utilizado nas linhas internacionais, custa US$ 300 milhões! O mesmo ocorre com as aeronaves produzidas pela Airbus. O modelo A320, o mais popular nas linhas nacionais, custa US$ 94 milhões; o preço do A330-300, frequente nas linhas internacionais, salta para US$ 245 milhões!
Como se vê, cada aparelho custa uma verdadeira fortuna. Tem cabimento pensar que uma empresa aérea venha a colocar um avião tão caro nas mãos de estranhos? É plausível achar que uma aeronave dessas será conduzida, hoje, pelo piloto João e, amanhã, pelo piloto Joaquim - ambos estranhos à proprietária do avião?
O exemplo é ridículo. Ademais, nenhuma seguradora emitirá uma apólice para cobrir o seguro de uma aeronave cujo proprietário descumpre as exigências de treinamento e certificação dos pilotos e desrespeita as leis trabalhistas do seu país.
No Brasil, a Lei n.º 7.183 é rigorosa no uso de pilotos habilitados e registrados como empregados nas empresas aéreas, sendo especialmente exigente no campo da jornada de trabalho e dos descansos dos aeronautas. O Ministério do Trabalho e a Justiça do Trabalho têm atuado com justificado rigor nos casos de infrações que muitas vezes ocorrem nos aeroclubes, mas não nas linhas regulares da aviação comercial.
Essa lei, que é antiga (1984), vem sendo atualizada por meio de projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional (PLS 434/2011 e PL 4.824/2012) e que ampliam ainda mais os períodos de descanso dos aeronautas, com vistas a garantir melhor qualidade de vida aos profissionais e maior segurança aos usuários do transporte aéreo.
Ao lado disso, há muita regulação estabelecida nos contratos coletivos de trabalho. A Convenção Coletiva dos Aeronautas de 2015 tem um capítulo detalhado para exigir o cumprimento das regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em especial no que tange à contratação de pilotos com vinculo empregatício e protegidos pelas regras da Lei dos Aeronautas.
Nada disso vai mudar com o advento de uma lei de contratação de serviços de terceiros como a planejada no PLC 30. A alegada terceirização dos pilotos da aviação comercial seria alternativa de altíssimo risco para as empresas que, além de poderem ser gravemente penalizadas por infrações às leis vigentes, sabem muito bem que a maior parte dos acidentes aéreos é causada pelo fator humano. Nesse campo, todo cuidado é pouco.
O uso deste exemplo pelos críticos da terceirização serve aos propósitos de quem, à falta de argumentos racionais, lança mão de verdadeiro terrorismo para amedrontar a população e pôr os eleitores contra o referido projeto.
É bom que se diga, o PLC 30 não revoga nenhuma regra garantida pela Constituição Federal e pela CLT. Ao contrário, acrescenta uma série de proteções hoje inexistentes nos diplomas legais do País, assunto que é detalhadamente explorado no livro de José Pastore e José Eduardo Pastore Terceirização: necessidade para a economia e desafio para o direito, São Paulo, Ed. LTR, 2015).
* Professor da FEA-USP, é presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras.
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