BC financia o déficit público, alimentando o descalabro fiscal; é uma estatal estruturada para administrar a dívida pública em favor do governo
Agora é a figura da dominância fiscal que domina o debate. Pretende-se dizer que o descalabro fiscal anula a política monetária como instrumento de combate à inflação, uma vez que a elevação dos juros — única variável que o Banco Central sabe operar — inviabilizaria de vez as contas públicas, tornando a dívida pública (DP) inadministrável. Portanto, enquanto o Congresso não vota o ajuste fiscal, resta-nos conviver com a inflação crescente.
Dominância implicando a existência de dominadores e dominados, cabe desconstruir esta figura. No caso, os dominadores seriam os responsáveis pela situação fiscal — o Congresso Nacional, que aprovou o Orçamento, e o Tesouro Nacional, encarregado de executar a peça aprovada; e o dominado, por impotente, seria o Banco Central (BC). Um enganoso jogo de palavras criado com o objetivo de vitimizar o BC. O infalível BC. Inflação no centro da meta? Palmas para o BC. Fora da meta? Vaias para qualquer um, menos para o BC.
Precisamos entender que é o BC que financia o déficit público, alimentando o descalabro fiscal; que o BC é uma estatal estruturada para administrar a dívida pública em favor do governo, jamais em prejuízo dele. Não por outra razão, é a DP o seu único instrumento de política monetária. Troca DP por dinheiro, e vice-versa. Quer criar crédito? Compra DP do mercado, recebendo os títulos e entregando dinheiro. Quer reduzir crédito? Vende DP para o mercado, entregando os títulos e recolhendo o dinheiro anteriormente entregue. Aparentemente, um mecanismo simples, e funcional.
Na realidade, um mecanismo desastroso — as sucessivas destruições de moedas demonstram isso com clareza —, uma vez que, para que isso funcione, o BC se obriga, institucionalmente, a dar liquidez à DP. Ou seja, é um comprador de última instância — o mercado não tendo comprador para a DP, o BC obriga-se a comprar. Daí qualificar-se a DP como soberana. O governo tem o poder soberano, através de sua maior estatal, que é o BC, de emitir quanta moeda for necessária para pagar aos portadores. Inflaciona, mas paga.
Querem verificar? Em 31/12/2007 (último ano antes da “marolinha”), a DP total era de R$ 1,6 trilhões, dos quais o BC possuía (ativo) R$ 0,36 trilhão. Em 30/09/2015, a DP total era de R$ 3,8 trilhões, dos quais o BC possuía R$ 1,2 trilhões. Ou seja, dos 2,2 trilhões de DP adicional emitida pelo Tesouro no período, o BC ficou com quase R$ 1 trilhão!
E, para completar o apoio do BC à farra fiscal, este ainda se transformou em operador direto da DP ao entrar pesado no mercado garantindo posições de tomadores de DP através da conta Compromissos de Recompra (passivo). Esta conta passou de R$ 190,2 bilhões, em 31/12/2007, a R$ 890 bilhões em 30/09/2015.
Por que o Copom, em suas atas, nunca explicitou que, sendo fiscalmente submisso por natureza, estava financiando um descalabro fiscal? Será que não entendem a natureza da instituição que dirigem?
O BC, não tendo a opção de quebrar o governo, continuará cumprindo com sua função de alimentar a dominância fiscal até o ponto em que a DP se tornará insustentável, senão pela disparada das taxas de juros reais, então pela disparada da inflação, que levará as taxas de juros reais ao entorno de zero. E aí teremos o verdadeiro ajuste fiscal — que vai custar muito caro.
Silvio Figer é economista
Agora é a figura da dominância fiscal que domina o debate. Pretende-se dizer que o descalabro fiscal anula a política monetária como instrumento de combate à inflação, uma vez que a elevação dos juros — única variável que o Banco Central sabe operar — inviabilizaria de vez as contas públicas, tornando a dívida pública (DP) inadministrável. Portanto, enquanto o Congresso não vota o ajuste fiscal, resta-nos conviver com a inflação crescente.
Dominância implicando a existência de dominadores e dominados, cabe desconstruir esta figura. No caso, os dominadores seriam os responsáveis pela situação fiscal — o Congresso Nacional, que aprovou o Orçamento, e o Tesouro Nacional, encarregado de executar a peça aprovada; e o dominado, por impotente, seria o Banco Central (BC). Um enganoso jogo de palavras criado com o objetivo de vitimizar o BC. O infalível BC. Inflação no centro da meta? Palmas para o BC. Fora da meta? Vaias para qualquer um, menos para o BC.
Precisamos entender que é o BC que financia o déficit público, alimentando o descalabro fiscal; que o BC é uma estatal estruturada para administrar a dívida pública em favor do governo, jamais em prejuízo dele. Não por outra razão, é a DP o seu único instrumento de política monetária. Troca DP por dinheiro, e vice-versa. Quer criar crédito? Compra DP do mercado, recebendo os títulos e entregando dinheiro. Quer reduzir crédito? Vende DP para o mercado, entregando os títulos e recolhendo o dinheiro anteriormente entregue. Aparentemente, um mecanismo simples, e funcional.
Na realidade, um mecanismo desastroso — as sucessivas destruições de moedas demonstram isso com clareza —, uma vez que, para que isso funcione, o BC se obriga, institucionalmente, a dar liquidez à DP. Ou seja, é um comprador de última instância — o mercado não tendo comprador para a DP, o BC obriga-se a comprar. Daí qualificar-se a DP como soberana. O governo tem o poder soberano, através de sua maior estatal, que é o BC, de emitir quanta moeda for necessária para pagar aos portadores. Inflaciona, mas paga.
Querem verificar? Em 31/12/2007 (último ano antes da “marolinha”), a DP total era de R$ 1,6 trilhões, dos quais o BC possuía (ativo) R$ 0,36 trilhão. Em 30/09/2015, a DP total era de R$ 3,8 trilhões, dos quais o BC possuía R$ 1,2 trilhões. Ou seja, dos 2,2 trilhões de DP adicional emitida pelo Tesouro no período, o BC ficou com quase R$ 1 trilhão!
E, para completar o apoio do BC à farra fiscal, este ainda se transformou em operador direto da DP ao entrar pesado no mercado garantindo posições de tomadores de DP através da conta Compromissos de Recompra (passivo). Esta conta passou de R$ 190,2 bilhões, em 31/12/2007, a R$ 890 bilhões em 30/09/2015.
Por que o Copom, em suas atas, nunca explicitou que, sendo fiscalmente submisso por natureza, estava financiando um descalabro fiscal? Será que não entendem a natureza da instituição que dirigem?
O BC, não tendo a opção de quebrar o governo, continuará cumprindo com sua função de alimentar a dominância fiscal até o ponto em que a DP se tornará insustentável, senão pela disparada das taxas de juros reais, então pela disparada da inflação, que levará as taxas de juros reais ao entorno de zero. E aí teremos o verdadeiro ajuste fiscal — que vai custar muito caro.
Silvio Figer é economista
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