O GLOBO - 08/11
Estimado ministro,
O senhor foi o primeiro funcionário do Bradesco a se tornar ministro da Fazenda. Para o banco que fundei, isso é uma honra e, ao mesmo tempo, um risco. Não trabalhamos juntos. O senhor formou-se na Universidade de Chicago. Eu, em lugar nenhum.
Resolvi escrever-lhe por causa do contratempo que a Receita Federal, sob sua jurisdição, criou para os clientes com o cadastro dos empregados domésticos. Veja que eu uso a palavra clientes, pois os cidadãos pagam impostos para receber serviços. Chamando-os de contribuintes, falsificamos a essência da relação. Contribuinte é quem deixa dinheiro numa caixa de igreja. No banco, o senhor sabe, cobramos taxas em troca de serviços. O cliente é obrigado a pagá-las, e nós somos obrigados a servi-lo.
Em 1943, quando fundei o Bradesco, o brasileiro achava que entrar em banco era coisa de rico. Passei a receber contas de luz, abri agências em cidades que não tinham energia elétrica. A mesa do gerente deveria ficar perto da porta de entrada. Nossos funcionários ensinavam a clientela a preencher cheques. Um dos nossos bancários foi escolhido para a dirigir uma agência e, com a mulher, passou o fim de semana limpando os balcões e o chão. Ele viria a se tornar presidente do banco. Em apenas oito anos, o Bradesco tornou-se o maior do país.
No domingo passado (1º), ficou claro que o sistema do cadastro não funcionava. Eu sei o que é isso porque o Bradesco foi o primeiro banco brasileiro a usar computador. O senhor e o secretário da Receita não disseram uma palavra. Pareciam aqueles paulistas quatrocentões que competiam comigo.
Passaram-se o domingo e a segunda-feira. Nada. Na terça-feira (3), a Receita avisou que não prorrogaria o prazo para a regularização do cadastro: "Não trabalhamos com essa hipótese". O senhor foi a dois eventos e continuou calado.
Só na tarde de quarta-feira (4), a 72 horas do limite dado aos clientes para se cadastrarem sem multa, o senhor e a Receita fizeram o que deveriam ter feito na segunda. Não ouviram os clientes, mas ouviram a patroa e estenderam o prazo.
O senhor sabe como eu reagiria se, durante quatro dias, uma agência do Bradesco estivesse com uma máquina quebrada, uma enorme fila de clientes na sua porta e o gerente nada tivesse a dizer. Se a confusão do cadastro da criadagem tivesse acontecido no Bradesco, eu teria dispensado seus valiosos serviços.
Atenciosamente,
Amador Aguiar
HAJA CONTROLE
Em 2010, Alexandra Mendes Marcondes, mulher do secretário de Governo do município do Rio de Janeiro, Pedro Paulo Carvalho, foi a uma delegacia e apresentou queixa contra ele por tê-la espancado, quebrando-lhe um dente.
O doutor é o herdeiro presuntivo do prefeito Eduardo Paes para a eleição do ano que vem. Em cinco anos, a polícia não se deu ao trabalho de ouvi-lo. Num depoimento posterior, Alexandra disse que inventou a história e retirou a acusação, apesar de existir um laudo do Instituto Médico Legal.
Na semana passada, Pedro Paulo confirmou o episódio, que atribuiu a um "episódio de descontrole nosso". Ou usou o plural majestático, ou seria um caso em que mulher se descontrola e leva uma surra. Estranho descontrole o do doutor. Ele bateu na mulher porque ela havia encontrado fios de cabelos compridos num ralo do banheiro e um sutiã alheio na cozinha.
O descontrole pessoal de Pedro Paulo é apenas um aspecto individual do problema. Há outro, e nele entra mais gente. A denúncia de uma surra numa mulher fica cinco anos parada na polícia e o agressor, uma autoridade pública, passa todo esse tempo fugindo do assunto. Isso não é coisa de descontrolado. Ao contrário, é coisa de quem tem muito controle e sabe exercê-lo, inclusive sobre os outros.
Ao reconhecer o espancamento, o doutor disse: "Aprendi muito com isso". Aprendeu a dizer a verdade depois de cinco anos.
A candidatura de Pedro Paulo à Prefeitura do Rio está a caminho do ralo, mas ele continua como secretário de Governo do doutor Eduardo Paes, que talvez não soubesse de nada.
TROPA DE CHOQUE
O Bope do deputado Eduardo Cunha mostrou ao plenário da Câmara que tem um banco de dados onde estão dissecadas as doações recebidas por deputados e, sobretudo, a contabilidade dos seus gastos com dinheiro público.
Cada deputado tem direito a até R$ 45 mil mensais livres de impostos para gastos com passagens, moradia, gasolina, aluguel de carros e de escritórios ou mesmo almoços e jantares. Já houve caso de cobrança de despesa com um regabofe em motel.
A PETROMÃE
Coisas da Petrobras: Em 1996, Ishikawajima resolveu sair do Brasil e passou adiante seu estaleiro do Rio por uma quantia simbólica. Nele, estava o maior dique seco do país.
Anos depois, ele foi vendido por algo em torno de R$ 200 milhões, para serem pagos em 12 anos, com prestações pouco superiores a R$ 1 milhão mensais. Em 2006, parte do estaleiro foi arrendado pela Petrobras, que passou a pagar R$ 4 milhões mensais por vinte anos.
Em 2012, a Petrobras licitou a construção, no estaleiro, de quatro unidades marítimas para produzir petróleo, e a encomenda foi para um consórcio das empreiteiras Odebrecht, OAS e UTC. Um contrato de US$ 2,7 bilhões. Três unidades foram para a China.
A quarta deveria ser entregue em 2014. Se tudo der certo, fica pronta em maio de 2016.
A PAZ DE WAGNER
O chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, está costurando em silêncio um processo de pacificação interna, dentro do governo, e externa, conversando com um pedaço da oposição.
Melhoraram as coisas, porque há pouco tempo um ministro do Planalto procurou Fernando Henrique Cardoso e disse que era preciso conversar.
Com quem?
Com o senador Humberto Costa, respondeu o ministro.
MORO PODERIA ACALMAR AS BRIGAS DA ZELOTES
Eremildo é um idiota e surpreendeu-se com as encrencas surgidas no Judiciário em torno da Operação Zelotes.
Ricardo Leite, o primeiro juiz que cuidou do caso, foi afastado em julho. Ele substituía o titular, lotado num gabinete do Superior Tribunal de Justiça, e seu trabalho foi criticado pelo Ministério Público. Ofendido, apresentou uma queixa-crime contra um procurador. No troco, dois procuradores entraram com um pedido para que Leite seja mantido longe da Operação.
Em setembro, a Zelotes foi para a mesa da juíza Célia Bernardes, que chegou com a faca nos dentes, botou dois grão-senhores na cadeia e autorizou uma diligência de busca e apreensão no escritório do filho de Lula.
O desencontro entre o magistrado e os procuradores começou em abril. Durante todo esse tempo (seis meses), o titular da Vara, doutor Vallisney de Souza Oliveira, continuou no STJ. Na semana passada, ele decidiu reassumir seu gabinete, e Célia Bernardes foi afastada.
Como Eremildo acompanha os trabalhos da Lava Jato e viu que em Curitiba trabalha-se em relativa harmonia, pensou em pedir ao juiz Sergio Moro uma avaliação do que está acontecendo em Brasília.
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