O GLOBO - 17/02
Contam que Hugo Chávez, com os preços do petróleo a US$ 20, após anos bem desvalorizados, prometia ser “o rei da América Latina” quando a cotação do barril chegasse a US$ 40. Ele quase conseguiu, porque sua companhia petrolífera estatal era uma máquina de obter dólares para o governo, quando o preço do petróleo chegou a quase US$ 150. Chávez faleceu e seu país desmorona devido a inúmeros equívocos acumulados. Do topo, o preço do petróleo cai. E nem mesmo o sistema de múltiplas taxas de câmbio, que permite qualquer tipo de manobras corruptas, incluindo os funcionários, é claro, suporta a pressão.
Agora, uma parte da cotação do câmbio estará liberada ao valor de mercado, esse mesmo mercado que o chavismo e todos seus adeptos venezuelanos e estrangeiros tanto odiaram. Em todo caso, o Estado venezuelano poderá obter mais moeda local por dólares que serão vendidos em leilões.
Para evitar uma explosão de preços e uma queda dramática da renda dos trabalhadores, manteve-se uma taxa de câmbio oficial mais que artificial, cotado a pouco mais de oito bolívares, que é acessível apenas a importadores de bens considerados como imprescindíveis. A Venezuela importa quase tudo. É outro fracasso brutal do chavismo, que estatizou a ferro e fogo inúmeras empresas, que hoje não conseguem abastecer a demanda interna.
Um segundo dólar será para o turismo, com quantidades mais que limitadas. Com um teto de US$ 3 mil por ano pode-se dizer que os venezuelanos estão tacitamente proibidos de ir ao exterior, a não ser que o façam como mochileiros.
A solução é de um mercado livre que presumivelmente continuará orbitando próximo aos preços do paralelo ou “ilegal”, e que na Venezuela não se pode nem mencionar na imprensa sem ser por meio de eufemismos. Mas não será um mercado totalmente livre porque haverá limitação de quantidades.
O que pensaria o falecido comandante se pudesse ver seus herdeiros aplicando receitas parecidas às que, na Argentina, são aconselhadas por Domingo Cavallo (ex-ministro de Economia de Carlos Menem e autor do plano de conversibilidade argentino) para sair do buraco? O ex-ministro argentino sugere uma transição em que haja um dólar comercial, mas igualmente um câmbio livre, cuja cotação venha do resultado da oferta e da demanda públicas e cujo preço, seria razoável especular, se pareceria inicialmente ao do dólar paralelo.
O auge dos preços das matérias-primas, que permitiu a heterodoxia dos que se imaginaram “líderes da Pátria Grande”, está chegando ao fim; e alguns acreditam que por causa do discurso, o relato, os caprichos, o populismo e os sonhos de reinados regionais perderam inúmeras oportunidades.
O equatoriano Rafael Correa não pode desvalorizar porque seu país tem o dólar como moeda.
O petróleo se desvaloriza e o dólar se valoriza frente às moedas dos países vizinhos. Trata-se de uma grande oportunidade para que Peru e Colômbia, após desvalorizarem suas moedas, exportem para o Equador. Aos governados por Correa comprar no exterior sai mais barato. Então, quem inventou o ato de rasgar jornais que publicam notícias que lhes desagradam, gesto logo imitado por Jorge Capitanich (chefe de Gabinete da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, que rasgou uma edição do jornal “Clarín”), impôs taxações às importações, o que é proibido pela Comunidade Andina de Nações. Já foi exigido a Quito que retire as medidas e indenize os afetados. Correa, discípulo de Chávez, não cumpriu. Por enquanto ainda não rasgou nada.
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