Como reconheceu o próprio Banco Central (BC), os fracos resultados fiscais apresentados no 1.º semestre - os piores para este período do ano desde 2003 - tornaram difícil o cumprimento da meta de 1,9% do PIB de superávit primário estabelecida pelo governo para 2014. Nem mesmo as receitas extraordinárias previstas para o 2.º semestre, oriundas do leilão da telefonia 4G e do Refis, serão suficientes para reverter o quadro.
Diante de tal situação, o governo parece optar por expedientes procrastinatórios e cosméticos, indicando que não tenciona adotar as medidas de ajuste necessárias para obter um superávit primário minimamente suficiente em 2014. Esse é o caso das retenções de recursos devidos pelo Tesouro aos bancos federais, para melhorar a aparência dos resultados fiscais que foram decepcionantes nos últimos meses.
Segundo noticiou o Estado, o Tesouro Nacional está segurando pagamentos devidos ao Banco do Brasil (BB), tendo o montante dos atrasados atingido cerca de R$ 8 bilhões no final de junho passado. Esse valor se junta aos recursos retidos pelo Tesouro relativos aos pagamentos de benefícios previdenciários e assistenciais realizados pela rede bancária, atrasos que atingem principalmente a Caixa Econômica Federal (CEF).
Nesse contexto, muito provavelmente a equipe econômica apenas aguarda o término do período eleitoral para admitir publicamente que a meta será mais uma vez descumprida. Com essa postura, o governo só faz agravar o ambiente de pessimismo em relação às perspectivas da economia para o próximo ano. Assim, não é surpreendente que os mercados associem a hipótese de reeleição de Dilma a um cenário de deterioração macroeconômica.
A verdade é que a situação fiscal preocupa. Os últimos quatro anos presenciaram um desastre nas contas públicas. Não se tratou só da queda do superávit primário fiscal, cuja média no governo Dilma deve ficar em torno de metade do observado no primeiro mandato de Lula. O pior foi a perda da transparência, com a multiplicação do uso de artifícios contábeis, principalmente no relacionamento do Tesouro com suas empresas controladas.
Como exemplo, pode-se citar aumento das transferências de dividendos dos bancos federais para o Tesouro, compensado pela capitalização ou subscrição de dívida subordinada de emissão dessas instituições pelo Tesouro com o intuito de manter o seu capital regulatório mínimo. Vale mencionar que, no 1.º semestre de 2014, os dividendos de estatais foram responsáveis por cerca de 60% do resultado primário do período.
A opacidade da política fiscal suscita, entre os agentes econômicos, a suspeita de que possa estar havendo a geração de "esqueletos fiscais" que mais cedo ou mais tarde aparecerão para assustar o País. Tal percepção é reforçada pela política intervencionista adotada nos setores de petróleo e energia elétrica que tem prejudicado enormemente a Petrobrás e a Eletrobrás. A propósito, essas duas empresas deixaram de compor o "setor público" para efeito de cômputo das estatísticas fiscais, no pressuposto de que não mais dependeriam de recursos do Tesouro, hipótese que, para o futuro, está ameaçada.
Embora não existam riscos imediatos de insolvência fiscal, a permanência da trajetória de deterioração dos fundamentos das finanças públicas em 2015 traria graves consequências sobre a economia brasileira. O prêmio de risco do País se elevaria e provavelmente o Brasil perderia o grau de investimento em sua dívida soberana. As expectativas continuariam se deteriorando e as chances de recuperação da atividade econômica seriam nulas.
Desse modo, o ajuste fiscal se impõe como condição necessária e primeira para a recuperação da credibilidade da política macroeconômica, passo essencial para a retomada do crescimento. O problema é como acreditar que Dilma reeleita fará, em 2015, as correções de rumo necessárias quando, em 2014, seu governo apela para artifícios como a retenção de recursos devidos ao BB e à CEF para furtar-se ao ajuste genuíno das contas públicas.
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