O ESTADO DE S.PAULO - 06/08
Compreende-se que, por enfado ou por ter mais do que fazer, muitos leitores, informados das linhas gerais de um escândalo exposto pela imprensa, se dispensem de ler também as revelações que se seguem à denúncia inicial e a corroboram. Mas há um ganho substantivo de conhecimento quando, apesar do odor que emana dessas armações, se chega a ter pelo menos um vislumbre de sua carpintaria. O argumento se aplica à mais nova baixaria divulgada do consórcio de interesses que une o governo do PT, os seus agentes no Congresso Nacional e a elite de companheiros que comandam a Petrobrás, a maior empresa brasileira com uma caixa-preta do tamanho de seus empreendimentos.
Desde o fim da semana, quando começou a circular a nova edição da revista Veja, o público ficou sabendo - a partir da transcrição de conversas registradas em um vídeo de 20 minutos entre o titular do escritório da Petrobrás em Brasília, José Eduardo Sobral Barrocas, e dois advogados - da montagem de um esquema escabroso de blindagem da cúpula da estatal. A "cena do crime" em preparo seria o recinto onde a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado tomaria os depoimentos de atuais e ex-altos figurões da empresa sobre o nefasto negócio da compra da Refinaria de Pasadena, iniciado em 2006. Segundo o Tribunal de Contas da União, a operação deixou um rombo de US$ 792 milhões - se não for ainda maior a perda.
Um servidor da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Paulo Argenta; o assessor da liderança do governo no Senado, Marco Rogério de Souza; e o seu colega da liderança do PT, Carlos Hetzel, elaboraram as perguntas que o relator da CPI, o também petista José Pimentel - por sinal líder do governo no Congresso -, deveria fazer à atual presidente da Petrobrás, Graça Foster, ao seu antecessor José Sérgio Gabrielli e ao ex-diretor Nelson Cerveró. Este último foi o autor do resumo "técnica e juridicamente falho", como viria a dizer a presidente Dilma Rousseff, ao se referir ao documento em que se baseou para aprovar a aventura de Pasadena, quando, ministra de Lula, chefiava o Conselho de Administração da petroleira.
Já seria um escárnio se a isso se limitasse o jogo de cartas marcadas que completaria a desmoralização da CPI de 13 membros, 10 dos quais governistas, e por esse motivo boicotada pela oposição (que tinha proposto o inquérito, afinal). Mas o suprassumo foi o repasse das perguntas aos perguntados e a escolha, de comum acordo, das respostas mais convenientes para a empresa, o PT e o Planalto. Ontem, o Estado descreveu o passo a passo da farsa. Barrocas, o homem da Petrobrás na capital, apanhava no gabinete da liderança petista do Senado o questionário. A "cola" era preparada na sala de reuniões anexa ao gabinete de Graça, na sede da Petrobrás em Brasília. Acertados os ponteiros, o material seguia para o comando da empresa, no Rio.
Tentando tapar o sol com peneira, a estatal diz que não antes, mas depois dos depoimentos se promoviam reuniões para desdobrá-los em novas perguntas para "subsidiar" oitivas futuras. Os novos depoentes, diz ainda a Petrobrás, participavam de "simulações de perguntas e respostas" para estar à altura do imaginário crivo dessa CPI de cartolina. A outra, integrada por deputados e senadores, que a oposição conseguiu criar para se contrapor ao inquérito açambarcado pela maioria governista do Senado, tampouco ficou imune à ação do PT para jogar areia nos olhos dos parlamentares. O PSDB descobriu que 15 perguntas feitas pelo senador Pimentel a Graça Foster, em 27 de maio, foram repetidas duas semanas depois, quando ela foi falar à Comissão Mista, pelo relator do colegiado, o companheiro Marco Maia.
Pimentel tem sido aconselhado a deixar a relatoria, até pelo comitê de campanha de Dilma, mas se nega. O certo também seria Graça se licenciar da Petrobrás, agora que, além de tudo, o TCU deverá acrescentar seu nome aos dos 11 executivos passíveis de serem responsabilizados pelo prejuízo de US$ 92,3 milhões à empresa, no curso do affair Pasadena.
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