O GLOBO - 07/06
A pulverização de legendas com voz no Congresso estimula a prática do fisiologismo e do patrimonialismo, presentes nos mensalões petista e tucano
À medida que o calendário eleitoral avança, os casos de infidelidade ficam mais evidentes. Desta vez, eles se multiplicam, porque, ao contrário de 2006, quando Lula tentava o segundo mandato consecutivo, Dilma busca o mesmo, mas sem uma certeza de vitória, embora continue favorita.
Como a política oscila em função da perspectiva de poder, uma candidatura de risco, e numa conjuntura de problemas econômicos sem possibilidade de alívio próximo, estimula a traição eleitoral. Neste sentido, o evento promovido na quinta-feira, no Rio, pelo presidente regional do PMDB, Jorge Picciani, de apoio à dobradinha “Aezão”, Aécio Neves (PSDB) para presidente da República e Luiz Fernando Pezão (PMDB) para governador fluminense, disse tudo.
Picciani conseguiu atrair para uma churrascaria na Zona Oeste 1.600 lideranças, com representantes de 17 partidos, vários da base parlamentar de Dilma. A começar pelo próprio PMDB, sinal estridente de infidelidade.
Entre a diversificada sopa de letras das siglas partidárias presentes, havia até o PCdoB, formalmente aliado, na disputa fluminense, à candidatura de Lindbergh Farias, do PT, adversário de Pezão em outubro.
O bailado político no Rio de Janeiro beira à desfaçatez: Sérgio Cabral e Pezão fazem juras de fidelidade a Dilma, enquanto o presidente regional do partido e outras lideranças aliadas, agastados pela tentativa do PT de passar um rolo compressor no candidato do PMDB ao Palácio Guanabara, trabalham às claras para o arquiadversário dos petistas, o tucano Aécio.
Não é uma exclusividade fluminense. Em São Paulo, Gilberto Kassab (PSD) ensaia mais uma de suas piruetas políticas ao namorar regionalmente a candidatura à reeleição do tucano Geraldo Alckmin enquanto alardeia o apoio a Dilma. Cópia da coreografia do PMDB fluminense.
Estas alianças exóticas em estados vêm de outras eleições. Na reeleição de Lula, por exemplo, em 2006, o PSDB mineiro, a fim de reeleger Aécio Neves governador, produziu nos laboratórios da campanha o voto “Lulécio”: Lula para o Planalto e Aécio para mais um mandato no Palácio da Liberdade. Os dois venceram.
Toda esta confusão não faz bem à democracia, para a qual são necessários partidos fortes e de fato representativos. Mas isto não acontecerá enquanto houver grande pulverização de legendas com assento no Congresso.
Este estilhaçamento partidário estimula, entre outros desvios, o fisiologismo e o patrimonialismo, presentes nos mensalões petista e tucano. Enquanto, por meio de cláusulas de barreira e/ou extinção das coligações em pleitos proporcionais — deputados, vereadores —, não for reduzido o número de partidos com voz ativa nas Casas legislativas, cenas como as que transcorrem nesta fase de aquecimento de campanha se repetirão. Em prejuízo da imagem do Congresso, dos políticos e da própria democracia.
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