O Estado de S.Paulo - 24/03
Na eleição presidencial de 2002, sempre que aparecia o registro de uma pesquisa na Justiça Eleitoral, instituições do mercado financeiro corriam a encomendar a sua. Como a lei manda que uma pesquisa que se pretenda divulgar precisa ser registrada com cinco dias úteis de antecedência, bancos e assemelhados tinham tempo para descobrir antes o que seria publicado - pois pesquisas feitas simultaneamente costumam ter resultados similares. Ganharam muito dinheiro com isso.
O fenômeno acontecia porque Luiz Inácio Lula da Silva era visto como uma ameaça econômica, e o mercado apostava contra ele. Se o petista subia, o real caía frente ao dólar - e vice-versa. Saber que isso iria acontecer um dia antes era uma grande vantagem.
Após dois pleitos - 2006 e 2010 - em que a perspectiva de um presidente petista não implicou oscilação automática do dólar ou da Bovespa, o efeito PT volta a se repetir em 2014. Na semana passada, não foi preciso nem encomendar uma pesquisa própria. Especuladores difundiram boatos falsos de que Dilma cairia no Ibope. Alavancaram assim as ações da Petrobrás e criaram uma oportunidade de lucro, comprando na baixa e vendendo na alta.
A estratégia pode funcionar algumas vezes - porque o mercado acredita que, se Dilma Rousseff perder, o preço da gasolina voltará a subir, e as ações da Petrobrás, a se valorizar. Mas há risco. Se ficar evidente que especuladores apostam contra a reeleição da presidente e ainda ganham dinheiro com isso, a petista pode posar de vítima e explorar isso na campanha.
Dilma paz e amor. Se prestar atenção às pesquisas e aos sinais crescentes de insatisfação, Dilma sinalizará com a possibilidade de promover mudanças em um eventual segundo mandato. Afora quem quer mudar tudo - e, por isso, não vota nela -, a maior parte do eleitorado (37%) gostaria que o próximo presidente mudasse muita coisa no governo. Desses, 38% dizem que querem mudanças mas com Dilma na Presidência.
Isso significa que 1 em cada 3 eleitores da presidente é um mudancista moderado. Não atender, mesmo que parcialmente, sua expectativa, é incentivá-lo a pular para o barco da oposição. A maneira mais rápida de fazer isso é assumir um discurso triunfalista, insistir que nada precisa ser mudado e que ninguém é capaz de fazer melhor do que ela.
Sem esse eleitor pró-mudança, Dilma ficaria restrita aos cerca de 30% de simpatizantes petistas e/ou governistas inabaláveis. Esse terço é o patamar mínimo de qualquer candidato do PT a presidente. É necessário, mas insuficiente. Leva ao segundo turno, mas não à vitória. Para se reeleger, Dilma precisa manter do eleitorado independente que já tem e ampliá-lo. Para isso, precisaria moderar o discurso. Tipo: "Paz e amor, meu querido".
Incompatibilidade eleitoral. Marina Silva perdeu mais do que ganhou quando resolveu se unir a Eduardo Campos para se vingar de Dilma. Seu capital político-eleitoral, de origem evangélica e ambientalista, está em queda permanente desde a absorção da Rede Sustentabilidade pelo PSB. Se a dupla fonte de eleitores da ex-presidenciável já era difícil de reconciliar, a junção abrupta aos campistas diluiu o que já era pouco consistente. Não deu liga.
Nos cenários do Ibope em outubro, novembro e março, a intenção de voto em Marina caiu de 21%, para 16%, para 12%. Seria esperado, se houvesse uma transferência de eleitores para o novo parceiro. Mas isso não ocorreu. No mesmo período, as taxas de Eduardo Campos foram de 10%, 7% e 7%. Marina se enfraqueceu sem reforçar o novo aliado.
O cenário pode complicar ainda mais. Pré-candidato a presidente pelo PSC, o pastor Everaldo já tem 8% de intenções de voto entre evangélicos - com chance de crescer. E o Partido Verde lançou a pré-candidatura de Eduardo Jorge, que pode cooptar eleitores ambientalistas que eram de Marina. Bom para Aécio Neves.
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